Descenso

Descenso: Ruptura (Parte 1)

A suíte era grande para ser apenas de hóspedes, e possuía até mesmo um closet. Por conta do aquecedor o ambiente já estava quente o suficiente para que Xiao não reclamasse internamente do frio que estava fazendo na cidade.

Em cima da cama havia duas toalhas que Xiao Zhan pegou, indo em direção ao banheiro.

O banheiro era realmente grande, com uma banheira redonda e uma parte reservada para o chuveiro. O ator ponderou o que fazer por um tempo, mas decidiu pelo banho de chuveiro mesmo, já que seria mais rápido. Na grande bancada de mármore da pia havia algumas essências corporais e sabonetes – parecia que o mais novo pensava em tudo para que a casa ficasse perfeita, já que quase não recebia visitas e mesmo assim tinha um canto especial caso elas acontecessem. Xiao Zhan pegou algumas coisas e depois tomou o banho.

Quando terminou, se vestiu com as roupas largas de Yibo – que até mesmo ficaram um pouco grandes - e foi para a cozinha, onde o mais novo já terminava de arrumar as coisas, deixando tudo completamente impecável, como se ninguém nunca tivesse usado a cozinha.

As pontas do cabelo de Xiao ainda estavam molhadas. Mesmo que o ator tivesse tentado secar com a toalha, por causa da umidade do ar não havia funcionado, o que fazia com que a franja caísse sobre os seus olhos, e ele parecesse mais cansado do que já estava.

- Zhan-Ge, eu fiz o seu chá para que não fique com frio. - Yibo disse enquanto deslizava delicadamente a xícara sobre a bancada da cozinha.

- Você não vai tomar um também? - O mais velho questionou.

- Eu não gosto muito de chá. - O escritor respondeu bebendo um gole de água.

O estômago do mais novo embrulhava um pouco, e ele tentava disfarçar enquanto pressionava a mão sobre o abdômen. Era realmente frustrante para ele, já que toda vez que tomava a medicação noturna o incômodo - que era continuo – piorava.

Xiao Zhan bebeu alguns goles do chá, e sentia como a bebida esquentava o seu interior, sendo até mesmo um pouco doloroso, já que estava tomando com pressa.

- Zhan-Ge, no que está pensando?

- ...

- O chá não está bom? Você quer um pouco de açúcar?

- Não é isso..., estou pensando nos roteiros que estava analisando. Como terminei de gravar o drama, preciso embarcar em um novo personagem, mas é difícil me desprender do antigo.

- Eu imagino, afinal, você foi aquele personagem por quase um ano e, para atuar você precisa afundar em uma personalidade, às vezes chegando a se confundir sobre a ficção e realidade.

- Eu não atuo, mas escrevo, se eu for comparar posso dizer que muitas vezes isso me acontece. Quando crio uma personalidade para minhas histórias, muitos aspectos meus estão nela, como também muitas coisas que eu não gosto. Quando crio um personagem dito ruim eu me pergunto se não sou igual, e assim com qualquer coisa que eu crie. Acho que quando você atua deve ser o mesmo, acho que muitas vezes sua visão fique turva sobre o verdadeiro e falso, e você não consiga separar o personagem de você.

Xiao Zhan olhava para o escritor sem desprender os olhos. O que o outro falava era realmente um pouco sobre ele.

Em muitos dramas ele sofreu para se separar do personagem porque precisou assumir aquela personalidade, depois de um tempo ele se questionava se estava mesmo atuando ou se era real, principalmente quando o roteiro parecia a sua vida, e ele já não conseguia mais separar a ficção da realidade.

- Mas cada um se desprende do personagem da sua forma. Você pode se dar um tempo, ou se afundar em outro. Porém, você pode ficar confuso se fugir, e sair atuando em muitos dramas praticamente ao mesmo tempo. Se dê uma pausa e analise com calma os roteiros, depois você pode pensar um pouco mais, e daí sim se decidir.

- Acho que vou fazer isso mesmo.

- Você é muito bom aconselhando. - O ator disse bebendo o chá com mais calma.

- Até parece. 

[]

Depois de alguns minutos tomando o chá, Xiao Zhan terminou a bebida, e Yibo lavou a sua xícara, secando e guardando no móvel feito por medida da cozinha.

Como se passava dás 22h, Zhan já dava indícios de estar com sono, coçando os olhos e bocejando muito. Mas também não tinha coragem de falar diretamente para Yibo que iria dormir antes dele.

Como o esperado, a chuva não diminuía, e Xiao Zhan se sentia nervoso já que normalmente nesses casos ele saia pelas ruas para acalmar a ansiedade, mas hoje era impossível. Parecia que havia aberto um rasgo nos céus e um dilúvio estava perto de acontecer.

O ator estava sozinho sentado no sofá, enrolado na coberta e assistindo alguma coisa aleatória na televisão. Yibo tinha ido buscar algo no quarto, mas não lhe disse o que era, então tentou não pensar nisso.

- Zhan-Ge, deixe eu secar o seu cabelo para que possa ir dormir. - Wang Yibo falou desenrolando o fio do secador de cabelo, se aproximando de Xiao Zhan

- Hã? Não, não precisa... - O mais velho falou balançando as mãos e a cabeça em completa negação.

- Claro que precisa, mesmo que a casa tenha isolamento térmico com essa chuva seu cabelo vai demorar para secar, e você está com sono, se dormir assim vai ficar gripado.

- Você se preocupa demais. - Ele sussurrou formando um bico nos lábios.

Xiao Zhan se sentou no tapete com as pernas cruzadas, enquanto Yibo se sentou no sofá com o secador nas mãos. Aos poucos o escritor secava os cabelos do ator, passando a mão suavemente entre os fios, e após alguns instantes o cabelo do outro estava totalmente seco.

- Pronto, agora você pode dormir.

- ... Obrigada.

- Magina, Zhan-Ge.

Os dois se separaram, e Xiao Zhan foi para o quarto de hóspedes com o intuito de voltar a descansar. Por mais que tenha dormido antes de jantar ele ainda se sentia sonolento, então tirou o moletom, e se deitou nas cobertas quentinhas da cama. Não demorou muito para que o ator entrasse em um sono profundo.

Yibo por sua vez voltou a cozinha, e abriu a gaveta dos medicamentos, pegando um para dor de estômago e tomando com água. Ele se concentrou em respirar e relaxar os ombros para não entrar em um colapso de tanta dor.

Depois foi para o quarto, tomou banho, e se trocou. Como estava com dificuldades para respirar ele precisou abrir uma fresta no janelão do ambiente, deixando o frio entrar de imediato. Ele não gostava de frio, mas acostumado com essas situações sabia que ajudaria um pouco. Logo após abrir a janela ele se deitou subindo a coberta até o pescoço tentando ficar com menos frio possível.

Ele passou minutos interruptos encarando as gotas de chuva caírem sobre a claraboia, e depois fechou os olhos tentando dormir. Ele se concentrou, e após 20 minutos dormiu, com a luz do abajur, e a televisão ligados, como sempre. Ao longo da noite ele puxou o lençol e tampou os olhos, respirando profundamente pelo nariz e a boca, e sentindo o peito apertar mesmo durante o sono.