Descenso: Ruptura (Parte 3)

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A mente do ator estagnou.

Por mais que tivesse conhecido Yibo a menos de dois meses, Xiao Zhan pensava que sabia muito sobre o outro. Escutar o que escutou foi para si assustador.


- O que você quer dizer com isso? - Zhan perguntou colocando as coisas de lado sentando-se na cama.


Yibo balançou a cabeça, e pressionou os lábios, parecendo até mesmo uma criança irritada.


- Eu não me importaria em morrer, mas não posso. É apenas isso.


- Para você é tão simples assim? Se morrer tudo bem? E como ficariam as pessoas que pensam em você?


- É exatamente por isso...

- Não é preciso me lembrar do motivo para eu estar vivo.


- Hã? Pare de brincar com isso!


- Eu pareço estar brincando? Estou dizendo que preciso cuidar dos meus sobrinhos, por isso estou vivo, mas não é como se eu estivesse vivo porquê estou apegado à minha vida.


- ... Bo-Di, não fale mais assim. Tudo bem cuidar dos seus sobrinhos, mas você também tem seus irmãos, pense neles e em você mesmo.


- Eu não tenho mais uma irmã. Eu cuido dos meus sobrinhos porque minha irmã não pôde cuidar deles. - Yibo falou cerrando os olhos e pressionando a têmpora direita.


- ...


- Zhan-Ge, eu vou dormir um pouco mais, okay? Depois me levantarei, e verei a neve. Poderemos comer e assistir TV como sempre fazemos. Mas, por favor, não me faça tocar neste assunto agora.


Xiao Zhan destacou um antitérmico da cartela de remédios, e entregou-o para Yibo com um copo de água, deixando depois o escritor sozinho no quarto. 


[]


O ator não sabia como converter a situação. O que era apenas uma preocupação com o outro se tornou um pavor. Pavor que Wang Yibo cansasse de viver pelos outros, e se rendesse aos próprios sentimentos.

Tentando não pensar no que não tinha acontecido, Xiao Zhan decidiu se apossar da cozinha alheia para preparar algo saudável para Yibo comer, já que o café preto estava fora de cogitação por causa da dor de estômago.


[]


Yibo entretanto, por mais que tivesse falado que iria dormir mais um pouco não conseguia desligar a mente. Ele odiava comentar sobre aquele assunto, mas também sentia que havia sido ríspido demais com Xiao Zhan, quando o outro só estava se preocupando com ele. Esse era o seu medo, deixar o ator preocupado. Wang Yibo nunca quis isso. 


[]


Falar sobre sua irmã não era o problema. Sim, lhe doía demais, afinal, Wang Liying além de irmã foi como uma mãe para Yibo, mas ele ainda era criança quando ela faleceu por conta de complicações no parto. As poucas lembranças que tinham eram preciosas, e gostava de lembrar com carinho, tentando deixar a dor da perda de lado. Foi assim que criou os sobrinhos, sendo uma criança que via eles como pequenos irmãozinhos, e que depois se viu na metade da adolescência sendo tratado como pai por eles, mesmo com uma diferença não tão grande de idade – e tendo um irmão mais velho para que as crianças pudessem ver como imagem paterna – no final eles se apegaram demais ao escritor.

No momento o que ele não gostava de comentar era sobre as próprias dores. Não queria explicar para Xiao Zhan que o maior desafio da sua vida era ter que lutar contra os próprios pensamentos todos os dias. Lutar para se manter vivo era realmente exaustivo, e ninguém mais precisava saber disso.


[]


Depois de tanto pensar, Yibo levantou com calma, já que a dor no estômago fazia com que suas costas ficassem tensas de dor a ponto de quase não conseguir caminhar. Com o chinelo de pano nos pés ele caminhou lentamente para o closet, vestiu uma jaqueta, e pegou outra, levando-a no braço para a sala.

Com passos lentos o escritor foi para o cômodo principal da casa, mas encontrou ele vazio.

Olhando para a extensão de vidro a sua frente ele pôde ver a primeira neve do ano. Todo o seu jardim estava branco, e era realmente bonito, mas solitário. Seu coração tensionou com a possibilidade de Xiao Zhan ter ido para casa com o tempo tão feio porque ele o havia magoado.

No momento que abaixou a cabeça para tentar controlar a respiração ele escutou a voz do mais velho.


- Bo-Di... eu pensei que iria dormir.


Wang Yibo estava com vergonha. Vergonha do próprio comportamento, tão pouco conseguia olhar para Xiao Zhan, então manteu a cabeça baixa, e desviou ao máximo o olhar.

Depois de um tempo ele se aproximou do ator, e colocou a jaqueta sobre os ombros de Xiao, ainda sem levantar a cabeça para o olhar.


- ...


- Zhan-Ge, está frio. Como estou doente, não quero que fique também.


Xiao Zhan deu um pequeno sorriso que Yibo não viu.

Era difícil saber qual dos dois se importava mais um com o outro.


- Sim, está frio. Eu fiz o almoço, vamos comer.


Com calma, Yibo foi a cozinha com Xiao Zhan para que pudessem ter a refeição. Depois de comer, Yibo ficou sentado observando o ator limpar tudo, o que foi para ele muito importante, já que não estava em condições de arrumar, mas também não conseguiria deixar tudo bagunçado.

Yibo implorou por um café depois do almoço, que foi negado para ele diversas vezes. Xiao Zhan ainda surtaria por ter que aguentar uma crise de dor de estômago em um viciado em café.

O clima entre eles havia voltado ao normal. Por conta da doença, Yibo estava um pouco mais quieto do que o habitual de quando está com Xiao Zhan, mas mesmo assim as brincadeiras, e provocações a todos os momentos se faziam presentes. 

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