Dezembro de 2013, café com canela.

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Conforme os dias passavam, o estado de saúde dele piorava, eu me culpava todos os dias por não conseguir convencê-lo a retomar o tratamento.
Por um mês inteiro, todas as manhãs lhe mostrava as coisas boas que a vida iria nos proporcionar, e sempre ouvia a mesma resposta.
-a melhor coisa já aconteceu, eu conheci você pequena.
-e não quer continuar comigo por mais tempo?
-Jully, vamos ser sinceros, esse tratamento só vai me garantir mais alguns meses de diferença, e talvez um pouco mais de sofrimento.
-é difícil pra mim, eu não consigo entender como uma pessoa desperdiça a chance de viver, não luta pela vida que tem.
-eu não estou desistindo, a vida que desistiu de mim.
-mas eu não quero desistir, não me pede pra desistir de nós assim, eu não suporto isso.
Ele havia dormido, passava pouco tempo acordado ultimamente.
Mas eu estava disposta a mostrar à ele o quanto ainda tem pra ser vivido, as coisas boas e coloridas que eu queria viver ao lado dele.
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rio.
-Luke, acorda dorminhoco.
-Que horas são?
-Deixa de ser preguiçoso, tá um dia lindo, vem ver.
Ele resmunga alguma coisa e levanta da cama.
-cada dia que passa fica mais louca.
-hahha anda, vem comigo.
Duas horas e meia de viagem, o sol ardia, o dia mais quente do ano, finalmente cheguei ao sítio dos meus pais, o ar da natureza faria bem ao Luke, eu tinha certeza que sim.
-quem mora aqui?
-esse sítio só é usado em alguns finais de semana pela minha família.
-tem cachoeira?
-tem, mas acho que não..
antes de eu dizer que não seria uma boa idéia, ele já havia se jogado pra dentro do rio.
-pula Jully.
-eu não posso.
O medo de água, nadar, me afogar, tudo isso me destruía ainda por dentro.
-não foi você que me disse que temos que vencer nosso medos? eu pulo contigo.
-você não entende Luke, eu não consigo, o medo é mais forte que eu. A lembrança de que eu poderia ter feito algo pra salvar uma das pessoas mais importantes pra mim, isso me faz querer nunca mais entrar em nada que envolva profundidade.
Luke saiu do rio, e sentou do meu lado.
-é exatamente isso, minha mãe também fez isso comigo, eu não quero fazer isso com mais ninguém.
- tá falando sobre o que?
- minha mãe teve a mesma doença que eu, ao contrário de mim, ela aceitou o tratamento, foram meses de vitória, de melhoras, eu com dez anos de idade já acreditava que ela estava totalmente curada. Mas e quando a doença ultrapassa os limites? muitas vezes eu vi minha mãe sofrendo em uma cama, e quando o tratamento acabou, os médicos disseram que ela havia se recuperado.
- e ela se recuperou?
-ela faleceu um mês depois Jully, e o que mais doeu em mim, foi a ilusão, eu acreditei tanto na melhora que eu não consegui me despedir dela. Foi tudo muito rápido.
- eu sinto muito, mas..
-não tem mas meu bem, eu não quero que você passe dias acreditando na minha melhora, pra depois me ver partir. Vamos encarar os fatos, como eles são. Por mim, por favor. Vamos viver o que temos pra viver, e quando eu estiver no meu limite, tudo vai acontecer naturalmente. Sem falsas ilusões. Você faria isso por mim?
Foi muito difícil aceitar aquele pedido, mas quando se ama alguém, as palavras "por mim" se transformam em "por nós." Quando dois se tornam um só, o desejo de um torna-se o desejo do outro também. Engoli o choro, e decidi engolir todo o resto também.
- Teu pedido é uma ordem senhor.

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