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24 de fevereiro

Hoje não fui à escola, estava cansado demais. E além do mais, hoje à noite tem a estreia do espetáculo, estou justificado. Por volta da hora do almoço, recebi uma mensagem de Mian dizendo que às 9 horas em ponto ela estaria lá me assistindo.

Claro, Mian... ontem eu tinha me esquecido dela. Mas como se faz para reunir a perfeição com a perfeição? Ontem eu tinha He Peng e me bastava; hoje estou sozinho e não me basto (por que não me basto mais sozinho?), quero ela.

PS: Aquele cretino do Zixun! Meteu na cabeça que queria vir me ver com a mulher! Ainda bem que não é tão louco assim, no final consegui convencê-lo a ficarem casa.

1h50

Esta noite não fiquei especialmente agitado, sentia-me dominado, aliás, pela apatia, não via a hora de tudo acabar. Todos os outros saltitavam, uns de medo, outros de contentamento, mas eu fiquei atrás da cortina espiando as pessoas que chegavam, verificando atento se Mian já tinha chegado. Não a vi, e Huaisang, o cenógrafo, chamou dizendo que era hora de começar. Então apagaram-se as luzes da plateia e acenderam-se as do palco. Entrei em cena como uma flecha lançada pelo arco, irrompi em cena exatamente como o diretor tinha me pedido para fazer nos ensaios e eu nunca conseguia. Xie Yun surpreendeu a todos, até a mim: mostrou-se com uma naturalidade de gestos e de expressão absolutamente nova, fiquei entusiasmado. Do palco, tentava encontrar Mian sem conseguir. Esperei então o espetáculo acabar, os cumprimentos, os aplausos, e atrás das cortinas já fechadas examinei os espectadores para encontrar seu rosto.

Lá estavam os meus pais, nas galerias, aplaudindo com força, e Wen Qing, que eu não via há meses. Por sorte, nem sombra de Zixun.

Então a vi, seu rosto estava iluminado e alegre, batia palmas como uma condenada; gosto disso também, porque ela é espontânea, alegre, coloca nas coisas uma alegria de viver extrema, olhar seu rosto significa intensificar o próprio contentamento.

Huaisang puxou-me pelo braço exclamando:

- Parabéns! Muito bem, tesouro! Anda, anda logo, vai mudar de roupa que vamos comemorar todos juntos.

Ele tinha uma expressão doida e esquisita, comecei a rir alto.

Eu disse que não podia, que ia encontrar uma pessoa. Nesse mesmo momento, Mian chegou com seu rostinho sorridente. Quando percebeu Huaisang, sua expressão mudou, seu sorriso desapareceu, e os olhos encheram-se de nuvens. Olhei para Huaisang e vi a mesma expressão séria tomar conta de seu rosto agora pálido. Fiquei girando a cabeça que nem um doido, olhando de um para o outro, e depois perguntei:

- O que houve? O que deu em vocês?

Eles ficaram em silêncio, olhando um para o outro com olhos duros, quase ameaçadores.

Huaisang falou primeiro:

- Não é nada não, podem ir. Eu digo aos outros que você não pode vir. Tchau, Cherry! - Beijou-me na testa.

Confuso, olhei-o enquanto se afastava, virei-me para Mian e perguntei:

- Posso saber o que está acontecendo? Vocês se conhecem?

Ela estava mais tranquila, titubeou um instantinho, tentando fugir dos meus olhos. Abaixou o rosto, cobrindo-o com as mãos longas e afiladas.

Depois me olhou direto nos olhos e disse:

- Acho que você sabe que o Huaisang é homossexual.

Todos nós sabemos, na escola, ele agora fala disso abertamente, portanto, respondi que sim.

- Mas e daí?

- Daí que faz algum tempo eu fiquei com um menino, depois... bom, depois a gente se conheceu, eu e o menino, quero dizer... O Huaisang já suspeitava de alguma coisa - suas palavras eram lentas e fragmentadas.

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