Um possível passeio

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Os dias após aquele se passaram de forma lenta, quase como se o próprio tempo estivesse atrás de Lis. A sensação de seu abraço ainda estava preso ao meu corpo e minha mente, e eu me perguntava constantemente como era possível ter sentimentos tão fortes sendo que a vi uma única vez. Desde então, o brinco passou a ser meu único consolo de que aquele dia realmente existiu, que nada foi inventado por minha cabeça irracional ou que eu estivesse presa sob algum feitiço.

Quer dizer, talvez eu estivesse mesmo presa em um feitiço.

Voltei algumas vezes ao mercado sem ter intenção de comprar algo, às vezes dava umas olhadas pela praça ou às vezes olhava esperançosamente para a vitrine da cafeteria. Nada. Sem sinal. Era meio humilhante toda a situação, mas eu não conseguia ficar em casa de braços cruzados enquanto uma gatinha andava sorrindo gengival por aí.

Eu também estava indignada comigo mesma. Qual é, eu odiava socializar. Mas agora sinto uma espécie de necessidade caótica, um êmbolo na garganta e um fraquejar nas pernas quando penso em suas mãos rechonchudas. Certamente eu estava sendo estúpida por agir tão antecipadamente, sendo prisioneira do meu próprio conto de fadas. Eu precisava encarar as coisas do jeito que elas deveriam ser: esquecer a possibilidade de vê-la e voltar para o dia antes daquele encontro.

- O que faz aqui? - Ouço uma voz ao longe e me viro para sua direção. Era o garoto marrentinho, tragando um cigarro e com o olhar morto, seguido de olheiras tão grandes que talvez pudesse ser um panda.

- Pensando...

- Quer um? - Ele me ofereceu um de suas coisas fedorentas e eu neguei rapidamente. Se minha mãe ao menos sonhasse que eu tinha tocado em um cigarro, minha vida seria um verdadeiro inferno. Imagine uma abelha lhe seguindo para todo canto, com um zumbido ruidoso ao pé do ouvido e um grande ferrão. Era assim, ela ia me seguir para todos os cantos, ia reclamar sobre toda e qualquer hipótese e teria um grande cinto pronta para rodar a baiana. - Sabe, eu sempre reparo em você lá no mercado, parece ser gente fina.

Que papo era aquele?

- É, em todas as vezes você fica me analisando como se eu fosse uma ladra. É isso o que pensa? - Me sobressaltei, mas não fiquei arrependida. Eu conheço esse tipo de garoto, graças às séries que assisto. O próximo passo é tentar me agradar com elogios baratos, quem sabe não comente sobre meus brincos.

- Não mesmo, não quis passar essa impressão - Ele arrisca uma piscadela, sorrindo de canto como um pervertido. - Seus brincos são uma graça, nunca te vi com eles antes. São novos?

- Eu preciso ir, tenho que esperar uma visita. Até outro dia, anfitrião do mercado.

- Espera... não vai embora, eu preciso te contar algo... - Ele agarrou minha mão sem nenhuma força, mas me deixando imóvel no lugar. Minhas sobrancelhas se ergueram e eu estava prestes a ter um colapso, enquanto ele parecia tranquilo e sereno com o olhar morto.

- Olha, eu não quero nada com você. Não quero-

- Tá maluca? Eu só vim falar contigo porque uma garota me pediu pra te entregar isso aqui - Ele tirou um papel rosa do bolso, estava um pouco amassado mas eu vi o nome do remetente. Meu estômago pareceu revirar de felicidade e todo o mau entendido me fez corar como uma idiota.

- Então por que perguntou sobre meu brinco? Por que não foi direto ao ponto?

- Eu só estava querendo ser legal. Não sabia que era amiga de Lis, senão já teria falado contigo antes - Ele jogou o cigarro no chão e pisou em cima dele, logo voltando sua atenção para mim - Não importa, fique com isso. - Ele me entregou o papel e tive quase certeza de sentir um choque, fazendo tremer a palma da minha mão. Eu, definitivamente, estava eufórica. Agradeci a sei lá quem estivesse ao nosso favor e amassei-o sem querer por conta disso.

Balinhas de Goma & aqueles fodidos brincos!Onde histórias criam vida. Descubra agora