006 :: Dois Lados da Moeda

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A grande maioria das coisas feitas por Anya levam muito tempo até a conclusão definitiva, por isso a Máquina do Tempo não demorou tanto quanto deveria para ficar pronta, uma vez que os principais desenvolvedores foram Franky e Yuri.

Por isso, é certo dizer que suas notas eram abaixo da média pois demorava muito para finalmente conseguir entender todo o conteúdo complicado ensinado pelos renomados professores do prestigiado Colégio Éden.

Por isso, também, Anya levou uma considerável quantidade de tempo – alguns anos – até compreender completamente a complexidade de seu poder e como utilizá-lo com maestria. Claro, certas coisas ainda são difíceis, como suportar inúmeros pensamentos de uma vez, quando está em locais extremamente cheios.

Infelizmente, em situações como essa, tudo tem um limite, porém, a escola nunca foi um lugar onde essa fronteira era ultrapassada, então não entendia como poderia estar nessa situação e nem mesmo como chegou até ali.

Encarou, pela fresta dos olhos semicerrados, Damian sentado na cadeira a sua frente, de tronco inclinado e cotovelos apoiados nas coxas. Parecia estar fitando-a com atenção, mas ela não conseguia distinguir. Sua cabeça doía tanto que mal mantinha os olhos lacrimejando abertos, quem dirá ler seus pensamentos. O eco insuportável que rondava dentro de si era detestável, como a sensação de presenciar alguém riscando um prato com um talher.

Era agonizante.

Damian se sentou ao lado de Anya e jogou todos os fios rosados para o ombro contrário ao lado em que ele estava, liberado o caminho que sua mão fez para se fechar na nuca dela. O rapaz utilizou um pouco de força para fazê-la inclinar a cabeça em direção ao chão e pressionou o nariz dela com os dedos em formato de pinça, com o auxílio do lenço que encontrou no bolso da mesma. Sem outra maneira de reagir, Anya passou a respirar pela boca e apertou fortemente a bainha de seu uniforme, como forma de lidar com a dor aterradora.

— Respira pela boca. Vai ter que ficar assim por uns quinze minutos. — explicou e Anya se esforçou para assentir.

Embora tenha deixado de ter sangramentos nasais com tanta frequência, desde pequena nunca soube o que fazer. A dor de cabeça que a acompanhava a deixava incapaz de ter qualquer tipo de reação, por sorte, na maioria das vezes os sintomas passavam quando a afastavam da multidão, contudo, essa parecia ser uma ocasião fora do comum. Estavam apenas os dois sozinhos no dormitório de Damian e a dor que sentiu foi dez vezes mais forte que o habitual, assim como o sangramento que parecia não passar.

Teve sorte de tê-lo ao seu lado nesse momento. O Desmond possuía conhecimento o suficiente para saber o que fazer quando o nariz de alguém sangrava, teve de lidar muito com isso devido às suas sessões de estudos intensivas que fazia por conta própria a contar da infância. Ele deveria ser o melhor para orgulhar o pai e alcançar o irmão.

Olhou melancólico para o retrato de Donovan sozinho na escrivaninha. Mesmo que passasse por essas coisas ainda quando criança, ainda que recebesse a maior nota da turma, nunca conseguiu alcançar seu objetivo. Seu pai nem mesmo o notava e Demetrius estava sempre a sua frente. Era inútil batalhar por isso e até mesmo fútil, ele diria, mas não conseguia se livrar desses velhos hábitos e dos antigos sentimentos de querer ser reconhecido pela própria família.

Enquanto Anya permanecia imersa em dor e Damian perdido na própria mente, nenhum dos dois preveram o que aconteceria até ouvir o baque da porta abrindo com força e uma criança loira e dentuça parando de correr abruptamente na metade do caminho até eles.

Um arrepio percorreu por todo o corpo de Damian e ele pensou nas piores hipóteses do que poderiam acontecer agora que haviam sido pegos ali. Anya mal conseguia se mover, sair daquela situação era impossível. Lentamente virou o rosto para trás, a criança estava silenciosa e parecia tão assustada quanto ele. Se encaravam de olhos arregalados, sem mais o que fazer.

Lapso | DamianyaOnde histórias criam vida. Descubra agora