cap 27

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O tictac do relógio.

Algo insignificante, mas também,algo que eu desprezo. Bom, talvez ele me despreze. Cada "tic tac" é um lembrete de que as horas estão passando, os dias estão passando. A vida, está passando.

Sentada na cama, bem ao escuro, as 4AM, imaginando o quão enorme o mundo é. Acho que deve ser algo quando se está a beira da morte. Você começa a se dar conta de que não conhece absolutamente nada do mundo lá fora. E, o quão pequeno e insignificante nós somos.

Eu tenho segredos, obscuros demais. Um pior que o outro. As cicatrizes estão aqui, para me lembrar do que eu faço, sempre.

Tudo estava uma caos, é como se eu não tivesse mais nenhum controle sobre a minha vida. Meus pais voltaram dos mortos, e Jajá eu iria de arrasta pra cima no lugar deles. Talvez essa foi a forma da natureza achar um equilíbrio.

Afundo um pouco a lâmina pela minha coxa, perto da virilha. Faço um corte de 5cm. Não tão fundo, mas não tão raso. O suficiente para me causar dor.

Eu costumava me auto sabotar quando criança, fazia com qualquer coisa pontuda que via. Mas eu parei.

Agora isso voltou, a sensação de querer uma escapatória para dor emocional, ocasionando dor física. Sempre faço em lugares que consigo esconder, pernas ou coxas.

Nem mesmo Brady sabe disso, é algo que eu sinto vergonha de mim mesma. Um movimento do lado de fora no corredor chama minha atenção. Jogo o canivete para o outro lado da cama e me cubro com o lençol

Miguel está parado bem no batente da porta, seus olham me fulminam. Bem mais afiados que minhas lâminas.

Ele avança em minha direção, por segundos eu penso que ele vem para me repreender. Mas Miguel apenas se deita no outro lado do cama.

O colchão afunda do outro lado indicando sua presença, passo a mão por baixo e desço o short para tentar cobrir. Mas é impossível, ele viu.

Miguel puxa o cobertor e se cobre, seus cabelos soltos se espalham pelo travesseiro, exalando um perfume único.

─ Não conseguindo dormir? ─ ele sussurra quase inaudível

Minhas coxas ardem como nunca pelos recentes cortes, mas consigo me abaixar para deitar. Que merda ele tá fazendo?

─ Não...

Suas mãos vão até meus fios de cabelo e ele se vira em minha direção, acariciando gentilmente. Quase abro um sorriso mas mordo os cantos da boca me impedindo.

É incrível isso. Como podemos ficar confusos com nossa própria mente. Eu amei Miguel mais do quê qualquer pessoa, confiei nele. E por meses achei que ele faria aquilo comigo.

Eu já nem sei se estou brava ou magoada com sua atitude. Mas, tudo em mim grita para que eu parasse com isso, e apenas o abraçasse. Que se dane.

Chego perto de Miguel e me aninho em seu peito, ele me envolve em um abraço quente e caloroso. Seu perfume doce invade minhas narinas. Oque eu mais amo nele é isso, ele é meu lar.

Lar não é um lugar, é um sentimento.

Seus dedos acariciam o topo da minha cabeça, eu quero contar tudo a ele. Tudo oque ele perdeu enquanto não esteve aqui.

─ Sabe ─ ele conta baixinho. Seu hálito aquece minha tempora ─ Uma vez eu li, que muito antigamente, os índios se juntaram para caçarem jacarés. ─ a voz abafada por eu estar perto de seu peito ─ Sabe o que eles faziam quando matavam um? ─ balanço a cabeça em negativo ─ Eles arrancavam o dente do animal,o mais afiado, e faziam cortes em seus corpos. Para dizerem que eram guerreiros.

//𝒔𝒐𝒎𝒐𝒔 𝒑𝒆𝒔𝒔𝒐𝒂𝒔 𝒄𝒓𝒐𝒏𝒊𝒄𝒂𝒔,𝒎𝒊𝒈𝒖𝒆𝒍//~Miguel CazarezOnde histórias criam vida. Descubra agora