A tarde se passou calma. Silenciosa.
Felizmente, a dona da loja tinha um cômodo por trás do balcão, basicamente uma mistura de um pequeno armazém e um local de descanso. Tayin raramente o usava, mas sempre ficava fascinada com a pequena prateleira de livros que estava lá, e usufruía deles para passar o tempo enquanto esperava algum cliente entrar.
Pegou em um dos livros ao acaso, que parecia ter um tipo de capa protetora preta, com detalhes impressos a verniz. Não havia título, nem sinopse, nem nenhum tipo de texto, quase que parecia um caderno de escrita pessoal. Tayin estranhou, porém se dirigiu novamente ao balcão e começou a folhear por entre as páginas. Parecia apenas uma série de rabiscos e anotações umas atrás das outras, receitas, instruções, partes que pareciam tiradas de algum diário aleatório, tudo misturado em um. Apesar de não fazer sentido, Tayin ficou quase que hipnotizada pelo seu conteúdo, com a ideia de que se continuasse a ler, mais cedo ou mais tarde, ela iria compreender toda aquela confusão.A tarde prosseguiu como de esperado. Clientes vieram e foram, sem sucesso de manter uma conversa decente. O dia de trabalho estava quase terminando, quando a dona da florista, senhora Andrea, entrou na loja, com um sorriso no rosto. Devia ter entre 65 e 70 anos apesar de aparentar ser mais jovem de espírito. O seu cabelo era curto e grisalho, e andava um pouco encolhida, por causa da idade. O seu sorriso era convidativo e caloroso, como uma avó que tem o lanche preparado para os seus adorados netos, e seus olhos verdes transmitiam amicabilidade, a verdadeira definição de uma avó, apesar da mesma não os ter, nem mesmo filhos.
No entanto, sempre se vestia formalmente, uma característica pela qual era conhecida. Sempre trabalhou como florista sozinha, mas foi só recentemente que decidiu abrir o cargo para outra pessoa. Ela agora passava a maior parte do dia em casa com o marido, trabalhando algumas manhãs durante a semana, e vindo checar as coisas no fim do dia.-Ah, Tayin! Você ainda está aí? Pensei que a esta hora já estava se preparando para fechar. Que bom que você ainda está aqui! – A voz dela era genuína e contente de ver a mais nova ainda em frente ao balcão.
- Sim, dona Andrea. Estava me preparando para fechar daqui a uns 10 minutos, mas se quiser eu posso adiantar isso? – Ela parecia hesitante, não tendo a certeza do que fazer no momento. Não é como se ela estivesse ocupada ou tivesse planos depois do trabalho. – Eu estava só...vendo os seus livros. – Ela ergueu o estranho caderno. – Mas acho que peguei algo que não devia estar ali? Eu não entendi muito bem, vou voltar a colocar.
-Oh, não se preocupe Tayin. – Ela deu uma risada, se aproximando do balcão. – Esse era só um caderno bem antigo e bobo... por uns anos estive com uma fixação nessas coisas de bruxaria e invocação... você sabe. - Respondeu Sra. Andrea de modo calmo, como se fosse um tópico banal. - Sempre achei esse mundo muito fascinante, mas meio que deixei para trás depois, coisas de quando eu tinha a sua idade. Por isso... - Ela pausou, como se tivesse se lembrado de algo. – Ah, mas minha querida Tayin, você não quer ouvir sobre essas coisas de uma velha tonta! Estou te incomodando com isso. Se quiser pode deixar o livrinho aí, eu arrumo depois.
Tayin permaneceu uns segundos olhando a senhora na sua frente, agora se dirigindo para o cômodo de trás. -Oh, não! Você não estava me incomodando, foi até interessante ouvir isso... – Ela engoliu em seco, como se tivesse vergonha do que iria falar de seguida. – Eu...meio que não tenho amigos nem ninguém me esperando em casa...Nem planos! Eu não tenho nada que fazer aqui depois disto...! – Ela deu de ombros, soltando uma risada forçada e quase patética. Tudo o que Andrea fez foi apenas olhar para ela.
-Quer dizer... - A mais nova clareou a garganta, não olhando a mulher. – Se você quiser falar sobre isso, claro! Eu, eu...eu acho que me faria bem ter uma companhia como a senhora. – A palavras saíram abafadas e tristes.
- Claro, minha querida. Só não esperei você achar interesse nesses assuntos, e não depois de um dia de trabalho. – Ela riu levemente de novo, pegando no livro que Tayin tinha na mão. – A gente pode falar disso sim... mas que tal amanhã? Já está ficando tarde. Eu posso fechar a loja por um dia, não é problema para mim. Nós podemos falar aqui mesmo. – Ela olhou Tayin nos olhos, tendo que levantar a cabeça devido a sua baixa estatura. – Só traga um chá ou algo do seu gosto quando vier de manhã...posso não ter algo que você goste.
Os olhos da garota pareceram brilhar por baixo da franja que os cobria. Pela primeira vez em um tempo, tinha ficado genuinamente entusiasmada pelo dia seguinte. Podia não ser o que esperava no início do dia, mas já considerava uma pequena vitória.-Sim, sim com certeza! Muito obrigada, senhora Andrea. A gente se vê amanhã então! – Respondeu, com um tremor de nervosismo e entusiasmo na voz. Tayin começou a se dirigir à porta de saída acenando, vendo a dona Andrea acenando de volta.
-Tenha cuidado no caminho de volta!
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Lonely Summon (Staying)
ParanormalPor razões fora do seu controle, Tayin agora começa uma nova etapa em uma cidade nova, longe de tudo o que conhecia. Porém, esta nova página da sua vida parece ser mais vazia e sozinha do que esperava. Meses após esta brusca mudança, criar laços nov...