III

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O ritual do seu acordar foi o mesmo de sempre, só que desta vez, Tayin acabou por se levantar muito mais cedo que o normal. O relógio marcava 8 horas em ponto quando saiu da cama. Se vestiu rapidamente, prendendo o cabelo de modo meio desleixado e desceu até a loja de conveniência mais próxima, indo comprar o chá mencionado no dia anterior, junto com diversos tipos de bolacha entre outros snacks.
Em breve se deparava em frente da florista onde trabalhava, embora o assunto hoje fosse algo muito diferente do normal. Bateu levemente na porta e logo depois rodou a maçaneta. Como esperado, a porta estava aberta e Tayin entrou lentamente, como se não quisesse perturbar ou acordar o que quer que fosse que estava ali.

- Tayin, querida, você veio! - A voz familiar e alegre da mais velha fez Tayin sentir um arrepio pelas costas acima. Ela se encontrava no pequeno armazém da loja, para onde Tayin se encaminhou imediatamente.

-Oh, bom dia, dona Andrea. Só fui pegar umas bolachas ali na loja, para acompanhar o chá. Espero que não tenha chegado atrasada...

- Ai, não, de todo! Estava esperando você vir por esta hora mesmo, vou pôr a água a ferver. Pode se sentar. - Andrea foi para um canto onde havia alguns utensílios de cozinha para os empregados, e ela, usarem durante o dia. Era possível ver um microondas, um pequeno frigorífico, uma máquina de café e um fervedor de água, que já estava trabalhando. Tayin se sentou em um dos pequenos sofás. Eles pareciam ser velhos e já estar ali há anos. Tayin conseguiu logo sentir o pó se levantando assim que ela se sentou. O espaço em si era pequeno, com várias caixas de papelão encostadas em um canto, e a luz da lâmpada era bem fraca, claramente não foi um espaço feito para permanecer ali dentro muito tempo.

-Então... - Começou a mais velha, se sentando no outro sofá, oposto de onde se encontrava Tayin. - Obrigado por me fazer companhia esta manhã também. Normalmente fico sozinha durante as manhãs, por isso é que ainda venho trabalhar por aqui de vez em quando. - Ela se deixou sentar confortável no sofá, com um sorriso no rosto. - O que eu vou falar é meio...bizarro eu acho, uma curiosidade que pouca gente persegue. - Ela pegou o caderno do dia anterior e colocou ele em cima do sofá, do lado dela. - A verdade é que sempre tive uma fascinação com as ideias do oculto... - Ela riu de si mesma. Falar aquelas palavras por alto parecia algo tão ridículo de repente. - Bom, foi sempre um lado de mim, um passatempo. Mas me foquei tanto nisso que acabou virando um traço de personalidade meu, no aspeto que a gente ao meu redor começou a falar que eu me metia com demônios e outras entidades para conseguir suceder nos meus negócios. - Ela contava, de olhos fechados, como se aquilo fosse apenas uma boa e distante memória. - Claro que eu nunca confirmei ou neguei tais rumores, isso foi uma coisa boa! Deixava o povo curioso, querendo saber se era verdade ou não, e fazia eu ganhar uns clientes, tentando arrancar informação de mim.

- Negócios...? Plural? Para além disto? - Tayin interrompeu assim que Andrea se calou. Era difícil imaginar aquela senhorinha com mais de uma loja, e para além disso, com sucesso, se fosse baseado na loja onde ela mesmo trabalhava.

- Sim, sim. Sempre tive várias paixões, e felizmente tive como lucrar com isso... Flores, música, decoração de interiores, mobília, animais, olaria, pastelaria... - Ela sorri carinhosamente, parecia falar com orgulho. - Mas ao longo dos anos, acabei vendendo a maioria, com a minha idade, a minha energia acabou diminuindo... Fiquei apenas com esta loja de flores, sei que não é algo rebentando com clientela mas, para mim chega. Quando se fica mais velho, aprende-se a agradecer pelos locais silenciosos e quietos. - Ela fez uma pausa, e encarou Tayin. - Pelo que sei de você, acho que até agora você sabe apreciar isso.

Andrea se levantou e foi preparar o chá, notando que a água já estava borbulhando. Tayin se viu pensando naquele assunto todo. Demónios, bruxas, com certeza era um tópico que ela gostava... quando se tratava de ficção. Não se deixava levar pelas superstições e crenças daquele tipo, embora fosse comum ouvir falar da existências dessas criaturas, até em estações de rádio ou na TV, em que eles supostamente existiam, mas nunca houve prova concreta, era quase como se eles vivessem em um mundo paralelo, ou então escondidos entre os humanos. Mas nunca se deu tempo para pensar no que acreditava de verdade.

Lonely Summon (Staying)Onde histórias criam vida. Descubra agora