1985

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— Dezesseis anos na cara e ainda não experimentou nenhum tipo de droga? Qual é, Hope? Maconha não vai te matar.

— Você é uma péssima influência, Gasparzinho.

— Aí, meu tom de pele é normal! Isso é sacanagem.

— Beleza, eu tenho que ir. Papai está apagado em casa por causa da bebedeira, então eu preciso fazer o jantar.

— São 18h15 ainda, duvido muito que mais alguns minutinhos te causarão problemas.

— Eu não deveria arriscar...

— Hope, seu pai não é aquele cara legal da tua festa de onze anos?

— Ele era, até minha mãe morrer naquele acidente.

— Ter visto ela daquele jeito deve ter sido traumatizante, não é?

— Ainda tenho pesadelos onde vejo ela despedaçada no chão, gritando meu nome.

— Que bizarro, cara. Você está de boa? Tipo... deveria pensar em fazer terapia. Não faz tanto tempo que aconteceu, não é?

— Foi há quatro anos.

— É, então a terapia é uma boa ideia. Talvez te ajude a superar esses pesadelos.

— Vou pensar no assunto.


Entrou em casa. Estava silencioso e bagunçado como sempre, o cheiro forte de licor, vodka e cerveja impregnado por quase todo o corredor.

Papai está dormindo. — Pensou.

O humor dele havia mudado. Havia se tornado um homem agressivo e perigoso. Não conseguia se lembrar de todas as vezes que seu pai o agrediu, porém ainda haviam em sua pele, escondidos por mangas longas e calças, hematomas que estavam clareando e alguns recentes.

Subiu as escadas na ponta dos pés, fazendo o menor barulho possível. O piso de madeira um tanto velho rangia vez ou outra, mas não de maneira que conseguisse acordar alguém desmaiado por causa da bebida.

Olhou dentro do quarto e lá estava ele... ou pelo menos deveria estar.

Seu corpo congelou, as mãos ficaram trêmulas e o sangue pulsava em suas orelhas.

Ele acordou! — Pensou, amedrontado. — Ele sabe que eu me atrasei!

— Hoseok... — A voz embriagada e assustadora vinha de dentro do cômodo.

Ele estava esperando. Esperando ele chegar...

Com passos hesitantes, entrou no quarto. Viu a porta do banheiro aberta, mas a luz estava apagada.

— Sim, papai? — Perguntou, o medo rastejando pelas entranhas.

— Por que chegou tão tarde? Eu levantei e você não estava em casa.

— Papai, eu sinto muito! Isso nunca mais vai acontecer.

— Com quem você estava?

— Com um amigo.

— Que amigo, Hoseok?

— Com... com o Todd...

— Eu sabia! — Bradou, saindo do banheiro. Ele segurava uma cinta, a expressão era de ódio.

Hoseok às vezes pensava que seu pai o culpava pela morte da mãe. Ele estava no carro junto dela quando aconteceu, porém tinha apenas doze anos, não sabia ao certo se chorava ou se gritava em desespero. Até porque, chamar uma ambulância não adiantava, ela estava totalmente mutilada sobre a rua.

— Papai, por favor, fique calmo! — Pediu, se afastando, dando passos vacilantes para trás.

— Eu já falei que não te quero andando com aquele drogado!

— M-Mas ele não é um drogado.

Cobriu sua cabeça com os braços, se inclinando até estar no chão, sentindo as cintadas que lhe acertavam o tronco e as pernas.

A única coisa que ele fazia nesses momentos, era fechar os olhos e pensar em sua mãe. Ela o chamava de sunshine, dizia que ele emanava luz e irradiava brilho. Definitivamente, Hoseok continuava a sorrir, sempre e sempre. Seu humor nunca abaixava ou tentava desaparecer. Ele era um garoto feliz, nasceu assim e cresceu continuando a sorrir. Desde os momentos que se divertia sozinho, correndo pelo campo de flores, até os momentos em que era espancado pelo próprio pai.

Quando finalmente parou de ser acertado pela cinta, abaixou os braços, vendo se poderia deixar sua cabeça sem proteção novamente, porém se precipitou.

Os cabelos castanhos foram agarrados pela destra de seu pai, que logo levou a cabeça do garoto ao chão. Se afastou, deixando-o jogado ali.

Hoseok sabia que se continuasse no chão, seu pai o chamaria de fraco e voltaria para agredi-lo novamente. Levantou e, mancando foi até o banheiro. O espelho estava quebrado, fazendo-o lembrar do dia em que fora arremessado contra ele. Lembrava como se fosse ontem.

O pai forçou ele a se apoiar na pia envelhecida, antes de bater a cabeça do jovem contra o espelho até que esse por fim quebrasse.

Mesmo quebrado e escurecido, conseguia ver que estava sangrando pelo nariz e pela boca.

Papai faz isso para o seu bem. — Era o que ele repetia para si mesmo, já que não queria acreditar que seu pai não passava de um sádico abusador.

The End of SunshineOnde histórias criam vida. Descubra agora