11 de Alfradia
Peço desculpas pela demora em lhe escrever, meu amado Æts.Minha cabeça arde como óleo fervente, mas ainda consigo segurar a caneta. Peço desculpas, não lhe contei que entrei de fato na floresta de Aseel. Foi no dia seguinte em que lhe escrevi.
Encontrei uma floresta úmida, fria e soturna. É uma selva como qualquer outra, porém, seu horizonte é ofuscado por uma neblina branca palpável. Aqui não se ouve o zumbido de mosquitos, cantos de pássaros ou quaisquer animais selvagens, tudo é tão silencioso que perturba minha alma.
Duas horas de caminhada e já fiquei entediado. Minha mente desligou-se e meu corpo não me obedecia mais. Árvores, árvores e mais árvores, era tudo o que eu encontrava. Fiquei claustrofóbico de ter que me espremer entre os troncos. Mas então, ao fundo, de maneira singela, despretensiosa, escutei uma melodia. Era um som vocal que seguia um ritmo harmônico. Não demorou e uma cantoria veio. Meu espírito, que antes estava aflito, aliviou-se. Nunca escutei um som tão apaziguador quanto aquele. Uma plenitude incomensurável invadiu meu coração, como daqueles momentos que dizem de quase morte.
Eu conhecia a música.
Era a cantiga que meu pai costumava cantar a meus irmãos e a mim na alvorada de nossas vidas. Começava em Sol menor e cantarolava-se numa poesia. A letra saiu de minha cabeça e chegou até a língua. Comecei a cantar. Veja bem, meu tão estimado Æts, eu ainda me lembrava das duas regras que a pedra falante havia-me alertado a seguir. Sim, provavelmente essa era a música das árvores. Mas se estivesse no meu lugar, tenho certeza que teria cantado também. Era uma melodia tão hipnotizante que meus lábios se mexeram sozinhos.
Sim, hipnotizante, de fato.
Minha visão ficou turva, comecei a caminhar como um bêbado. Caí no chão uma ou duas vezes. Por fim, caí uma última vez. Agora, finalmente acordei. Vejo pelo meu relógio que dormi por 5 dias. Me encontro num lugar escuro, cavernoso. As paredes parecem feitas de barro e não há nada além de um longo espaço vazio. Ao menos minha mochila continua em minhas costas, graças a isso posso lhe escrever. Pelo menos assim consigo registrar o que aconteceu comigo e, caso venha a me ocorrer alguma coisa, as pessoas terão a chance de descobrir por onde estive e porque sumi.
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22 de Alfradia
Amado amigo, não foi ali naquele porão cavernoso que encontrei meu destino. – penso que infelizmente, no fundo de minha consciência. Em vez disso, tudo o que meus olhos encontraram foi com um rapazinho espantado ao me ver acordado.Primeiro ele se aproximou de mim com cautela, mas não disse nada. Se não fosse por mim, sabe-se lá quanto tempo mais aquele silêncio constrangedor tomaria conta do ambiente.
— Você quem me salvou? — indaguei com serenidade, para não o assustar mais.
Vi sua garganta se mexer, engolia saliva.
— Sim. Quando eu te encontrei você estava sendo devorado pelas árvores.
— Devorado pelas árvores?! — aquilo certamente me espantou, ele percebeu.
— Bem, você respondeu ao canto das árvores. Elas utilizam este truque de hipnose para fazer quem o escuta adormecer para elas poderem devorá-los. — ele percebeu que eu ainda estava confuso. — O sol não bate muito nesta floresta, então as árvores precisam se alimentar de quem passa.
— Neste caso, obrigado. — olhei fundo em seus olhos e sorri. Seu rosto estava rígido e nem por isso ele mudou a expressão.
— Não agradeça, não quero sua gratidão. Apenas retorne para seu país, forasteiro.
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Uma Sorte Para Aseel
Fantasi🥇#1° Lugar no Concurso23 "Carta de Um Mundo Novo" do perfil @WattpadFantasiaLP -----||----- Um lugar onde as pedras falam e as árvores cantam, sim, todos em Baldória conhecem as lendas místicas que envolvem a região de Aseel. Ainda assim, em meio a...