1954, 5 de Março. Massachusetts - EUA. Elizabeth Grant.
Descobri que eu estava muito ferrada depois que aquele caos passou. Meus pais vieram me buscar na Saint Rose, escola na qual eu estudo, preocupados pela notícia que receberam pelo rádio.
O ataque dos rebeldes da West Virginia comoveu o país inteiro, tendo mais de 35 mortes, 8 estupros e 23 feridos, todos eles envolvendo alunos das 7 escolas que estavam fazendo excursão no museu. Eram mais de 700 alunos e o lugar ficou destruído. 25 guardas estão feridos, mas nenhum deles foram mortos.
Mas voltando aos meus pais. Mesmo depois de um ataque gravíssimo, as pessoas ainda não perderam a chance de reclamar sobre mim para eles. Descobri, também, que a fiel com quem eu discuti no jardim, era a Madre Superior da Dulce DiAngello. Eu estou muito ferrada. A diretora do meu colégio estava ouvindo as reclamações, junto aos meus pais.
Eu estudo em um colégio normal religioso, assim como todos da minha família já fizeram. O que foi uma farsa, pois só os homens se formam de verdade. Eu acho um absurdo que as mulheres sejam consideradas incapazes de ocupar cargos no país. Algumas abaixam a cabeça, mas eu odeio o fato de sermos criadas para os nossos futuros maridos. Eu não quero ser assim.
Todos na minha família são religiosos e têm uma devoção doente por tudo que consideram sagrado. Meus irmãos são exemplares e isso me dá muita raiva. Nunca que eu abaixaria a cabeça para um bando de fiéis segregacionistas. Amo quando me chamam de perdida, porque os perdidos para eles, são as pessoas que conseguem pensar com a própria cabeça, ao invés de ser um seguidor bobo como eles, incapazes de terem suas próprias opiniões e vontades.
- Temos muito o que conversar quando chegarmos em casa, Elizabeth. - Minha mãe alertou, enquanto entramos no carro.
- Não tem conversa, Mariah! - Meu pai se intrometeu - Vai ser só mais uma que vai entrar por um ouvido e sair pelo outro. Eu estou farto da sua filha, ela precisa de medidas rígidas imediatamente.
Minha mãe abaixou a cabeça, sem contestar. Aquilo me deu muita, mas muita raiva. Era sempre assim.
- E que tipo de medidas você se refere? Não fale assim com a minha mãe! - Ele começou a deslocar-se para nossa casa.
- Eu não quero intromissões suas, Elizabeth. E tenha cuidado com o tom de voz, eu não sou tão tolerante.
- Lizzy, me desculpe... - A minha mãe começou a chorar e eu não entendi.
- Nada de desculpas, pare de passar a mão na cabeça da sua filha! É por isso que ela é o que é, hoje! Você não serviu para ser mãe, Mariah! Você fracassou! - Não lembro de ter visto o meu pai tão nervoso antes, ele parecia ter se esgotado.
- Você poderia, por favor, parar de insultá-la? Eu acabei de sofrer um ataque rebelde, você deveria estar preocupado! - Tentei o drama.
- Você está acostumada com rebeldia, já que também estourou bombas e desrespeitou a madre!
- Harold, por favor, não faça isso!
- Fazer o que, afinal? - Até eu já estava nervosa com o sofrimento repentino de minha mãe.
- Eu pensei bem e você precisa de uma colégio mais rígido, que te impunha regras rigorosíssimas!
- O que?
- E é exatamente para lá que estamos indo, você vai para o DiAngello! - Arregalei os olhos.
- Mãe, se você deixar com que ele faça isso, eu vou te odiar para sempre! - Ameacei. Ela só sabia chorar.
- Não tem conversa, Elizabeth! - Meu pai estacionou em frente ao colégio - Aqui será a sua nova casa!
- Mãe! - Segurei as lágrimas, olhando para ela e esperando que ela agisse.
Meu pai desceu do carro e veio até a minha porta, abrindo e tirando-me de dentro. Eu estava imóvel, chorando e olhando minha mãe chorar.
- Mãe, não deixa! - Ela saiu do carro também, vindo me abraçar.
- Desculpa, meu...
- Sai! Você me enganou! - Minha visão estava embaçada pelas lágrimas - Você mentiu para mim, falou que íamos para casa! - Empurrei-la e ela chorava mais ainda.
- Está na hora, vamos! - Meu pai segurou o meu braço e tentou me arrastar.
- Me solta, eu não vou! - Me debati, chorando e não acreditando que aquilo estava acontecendo.
- Você não tem escolha, garota! Somos os seus pais e você só tem 16! - Ele tentou me parar e eu sabia que não teria jeito.
Caí em pranto e o segui para dentro daquele projeto de convento, que mais parecia um castelo medieval, de tão grande e frio. Me sentia derrotada, humilhada. Fui jogada em um internato de freiras e padres, como se não fosse nada. Como se não tivesse ninguém.