Perdidas

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1954, 10 de Março. Massachusetts - EUA. Lotus Munroe.

- Eu não entendo, irmã!

- E o que você não entende, Lotus? Eu posso explicar novamente!

- Não é disso que estou falando. - Nesse momento eu estou na sala de aula - Estou falando dessa mania chata que a sociedade tem de achar que não podemos ocupar cargos importantes. - Ouvi murmúrios das meninas e, com certeza, elas estão achando que estou louca.

- Não comece com isso novamente, Senhorita Munroe. Você acha que a sua mãe não ocupa um cargo importante? - Ela apoiou-se em sua mesa, me encarando.

- Nada que um homem também não possa fazer, irmã Margaret.

- A função dos homens são trazer o sustento da casa. Sempre foi. Esse é o certo, a família padrão.

- E a mulher tem que servir de escrava dele. Lavando, passando, cozinhando, educando os filhos, limpando, entre outras mil coisas... - Ouvi uma voz vinda do fundo e olhei em direção, assim como todos - Ah! - Ela levantou os olhos para a classe inteira, fazendo cara de paisagem - E ainda têm que servir como objeto sexual.

Sorri para ela, concordando com seu comentário. Elizabeth e eu estamos dividindo o mesmo quarto, mas nunca paramos para conversar. Ela passa a maioria do tempo em que está no quarto, dormindo.

- Não fale assim, menina! Você fala e parece uma coisa ruim!

- Mas é! - Falei - Não seria melhor se todas pudéssemos escolher aquilo que queiramos ser? Por que eu não possi ir para a faculdade?

- E ser chamada de perdida? Me poupe, Lotus. Isso é uma afronta à moral e os costumes da sociedade!

- A sociedade é uma merda! - Elizabeth se levantou, chamando mais ainda a atenção de todos por ter dito palavra vulgar na sala - Uma família padrão, para mim, é aquela que há amor acima de qualquer coisa. Na qual o homem respeite as escolhas da esposa e a considere uma parceira, não empregada. E que os dois se encarreguem da educação, relação e conscientização dos filhos, juntos, como um casal. Na qual ele a ajude com algumas coisas em casa, ao invés de chegar e bagunçar mais. Na qual, ao invés de chegar e ir procurar falhas, ele chegue e a der um pouco de mimo, carinho, que a faça se sentir especial para ele.

- Somos mulheres, não máquinas que só servem para servir. Queremos ser ouvidas, queremos ser servidas, também! - Tomei coragem e levantei também, coisa que nunca tinha feito na aula - Eu convivi com o meu pai nos falando sobre Deus ser um ser iluminado, que ama a todos igualmente, sem restrições. Mas por que, então, as pessoas não usam isso para si? O meu pai me pregava uma coisa, mas fazia outra.

- O meu pai falou que o amor deve estar sempre presente em locais sagrados, como nossa própria casa. Então por que eu só consigo enxergar a minha família como uma empresa em que os meus pais sejam socios e sua relação não passe do profissionalismo? - Elizabeth começou a andar até a minha mesa, parando ao meu lado.

- O meu pai falou que a família simboliza o amor! - Saí da minha banca e parei ao lado de Elizabeth - Então por que suas mulheres não recebem o tratamento que merece para ser amada? Por que os homens estão sempre inferiorizando as mulheres, se somos todos filhos de Deus?

A irmã nos olhava com a cara nada boa, a expressão dura e os punhos cerrados na mesa. As meninas, o que só tem nessa sala, estavam agitadas e eu não entendia muita coisa do que elas falavam.

- Primeiro... - A irmã falou um pouco alto e todas se calaram - Não quero que voltem a fujir da padronização da minha aula. - Engoli em seco - Segundo, eu não admito esse tipo de vocabulário em minha sala, senhoria Grant. Terceiro, espero não ter outra interrupção dessa. - Voltei a sentar, diferente de Elizabeth - E último, cuidado com o tom de suas vozes.

Lizzy E LotusOnde histórias criam vida. Descubra agora