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No corredor, fora da sala de Fernando fui surpreendida por mãos agarrando meu braço, e me puxando com brusquidão.

- Está louca? - Perguntei, com o coração em disparada, massageando a parte do braço onde ficou dolorida pelo impacto do puxão.

- Desculpa. Não foi minha intenção te machucar. - Luisa parecia estar dizendo a verdade. Ignorei a dor e busquei mais o espaço de sua sala.

- O que foi? O que você quer? - Ela retirou os óculos e chegou mais perto, respirou antes de indagar.

- O que vamos fazer agora?

– Acha mesmo que eu tenho uma resposta? - Aproximou-se um pouco mais. Percebi que me beijaria e não hesitei em recuar no mesmo instante.  - Não é o momento, Luisa. Por favor - Demonstrou irritação diante da minha recusa, afastando o cabelo impecavelmente liso para trás, mas depois acabou concordando.

- Está certo. Está certo. - Afastou-se. - Mas olha, meu amor, não quero deixar de ficar com você. Estamos tão bem! - Parecia uma garotinha melindrada, assustada.

- Daremos um jeito. Não é uma guarda-costas que vai atrapalhar nossas vidas.

Luisa pôs os óculos que estavam no bolso frontal do terno e se aplumou, tomando uma postura mais firme. Porém, depois, se comportou covardemente outra vez.

- É melhor você ir. Vai que essa tal guarda-costas apareça de repente. - Concordei, em absoluto, sem dizer mais nada.

Não que estivesse com medo da minha pedra no sapato, mas porque, por algum motivo, não queria ter que olhar para Luisa por muito mais tempo. Seus medos e covardia me deixaram impaciente e decepcionada. Ao voltar para a recepção, vi Fernando surgir logo atrás de mim,deixando-me em alerta.

- Ainda está aqui? - Sondou, desviando para o balcão das secretárias. - Onde estava?

- Onde mais? No banheiro. - Respondi, sem nenhuma dor na consciência.

- Esqueci de deixar um cartão com você. Quer usar algum?

- Não. Prefiro em espécie, como sempre.

- Vem até a minha sala. Darei o que precisa.

Ela sempre fazia assim. Nunca deixava um cartão comigo. Controlava tudo o que eu comprava, todos os meus gastos. Tudo! Era uma muquirana! Depois de um ano de casamento, passei a pegar quantias apenas em dinheiro, porque nutria a esperança de algum dia pôr em prática meu plano. Fernando dobrou as costas, me deixando para trás. Parecia que ia fazer algo muito importante e urgente antes de eu surgir novamente, a surpreendendo. Estava com um semblante atipico, que beirava a alegria, alguma opaca felicidade. Expressão muito rara demonstrada por ele. Dei uma última relanceada para o balcão na minha frente, a resposta
para a minha suspeita estava ali, no brilho insatisfeito dos olhos negros de Fernanda. Tentou forçar um olhar gentil, mas definitivamente era uma péssima atriz. Ou simplesmente quis agir assim Ignorei-a.

Fui e voltei da sala de Fernando, e passei direto pelas duas secretárias. Não olhei para nenhuma das duas, não parei, passei direto tomando o rumo do elevador. Já tinha pegado meu fio de esperança. Mais um. Nesse momento só desejei uma coisa: distância de meu esposo pelas próximas horas. Senti passos ligeiros atrás de mim, mas não tive necessidade de olhar. Sabia bem quem era. As portas de aços se abriram e entrei. Quem vinha no meu encalço também fez o mnesmo.

Quando as portas se uniramea caixa metálica começou a subir, fui

jogada contra a parede de alumínio e beijada de forma desajeitada e primitiva. Para esquecer o mal momento que tinha acabado de passar, acabei me entregando aos beijos de Luisa , mesmo tendo consciência, e uma pontada de decepção, que suas mãos e boca não iriam me satisfazer. Nunca me satisfaziam. Beijamos, como sempre fizemos desde que nos permitimos viver esse crime imoral. Aproveitamos o momento, ela bem mais do que eu. Mas consegui me entregar o suficiente para sentir um pouco que fosse de prazer. Foi como das outras vezes. Morno, sem lasciva, sem aquele tesão que vai rasgando, dissolvendo tudo entre os amantes.

- Está chegando. - Tentei afastá-la, me referindo ao elevador

- Ninguém vai estar esperando, meu amor, como sempre.

Era verdade. Por isso eu não abria mão de pegar o elevador alternativo. Nunca aconteceu de alguém estar esperando. Então relaxei e me doei um pouco mais.

Busquei os lábios finos de Luisa, sua língua, e deixei que a loucura completa tomasse de conta. Foi uma busca quase frustrada por algo diferente. De lábios, lingua e sabor. Era sempre a mesma coisa, não inovava, não tỉnha química, apenas a vontade de querer que fosse algo mais. Com o barulho da chegada do elevador, a empurrei ao mesmo tempo em que as duas portas se abriram correndo para os lados.

A figura séria, de uma mulher trajada de preto, usando óculos escuros e capuz na cabeça, estava estagnada, certa na gente. Tudo ficou paralisado, imóvel. Por um lapso de instantes, a dona me pareceu muito familiar, mas não tinha certeza se já a tinha visto em algum momento da minha vida infeliz. Ajeitei a alça do sutiã e depois a blusa. Luisa fez o mesmo com seu terno e gravata. Saímos do elevadore a mulher estranha entrou, sem dizer uma só palavra. Nem um cumprimento, nem um "olá", nada. Foi então que percebi, assim como Luisa , que a desconhecida suspeitou ou viu, claramente, alguma coisa.  Praguejei nossa má sorte em pensamento; senti que era momento de se preocupar!

POV MARÍLIA

Deixei o elevador e retirei os óculos e o casaco. Fechei mais um botão do terno, enquanto seguia caminhando. Há muito tempo não usava roupas tão formais.

A última Vip para quem prestei serviços, me deixava à vontade para usar ou não ternos, ficava a meu critério. Meu estilo sempre toi roupagem mais grossa, cores escurase de preferência de couro.

Fiquei satisfeita que, pelo menos, a cor não se tornou uma exigência da minha nova chefe. Dei uma arrumada no cabelo, a sensação era de que o perfume da linda mulher no elevador, ficou entranhado no casaco, nos meus cabelos. Ou fui eu quem ficou impressionada demais? Era um tipo muito bonita. Linda! Olhar marcante, ainda que tristes, cheios de melancolia. Os cabelos eram os mais lindos que já vi. Não lembro de algum dia ter visto olhos tão belos e impactantes. Graúdos. Madeixas compridas e onduladas, encostando no queixo. Não foi preciso usar minha experiência de anos como guarda-costas para perceber que eu estava flagrando um adultério dentro do elevador. Bem clássico, clichê.  Uma das duas era casada. Ou ambas.
A dona de cabelos loiros e terno parecia uma amante pouco suficiente, pois percebi a insatisfação na reação da ruiva belíissima. Foi susto misturado com desilusão. Aprendi, com os anos de experiências, a olhar não só a expressão das pessoas, mas também o que reflete por dentro, a alma. E a alma da linda ruiva parecia calejada.

– Bom dia. - As duas secretárias levantaram no mesmo instante, ao me notarem parada à pouca distância do balcão. Pareciam tão distraída que não perceberam minha chegada.

- Bom dia, senhora. - Uma delas respondeu, ajeitando os óculos e a postura, mostrando-se mais atraente e sedutora. Bem atirada, na verdade. A outra se limitou apenas a uma saudação e uma pequena mesura:

- Em que podemos ajudá-la?

- Poderiam, por gentileza, me anunciarem para Fernando Zor? Digam que é Marilia Mendonça.

Vi a subserviência de uma e os olhares insinuantes da outra, que não fez questão de esconder suas intenções maledicentes. Acostumada com esse tipo de situação, ignorei a loira, completamente, e me mantive focada na resposta de Fernanda. Era esse o nome escrito no seu crachá.

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guarda costa | Mailila adaptaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora