um hétero estranho
era aniversário de uma amiga, e a escolha de onde comemoraríamos foi a pior possível: um bar (zinho? hum), com estilo bem "rústico", com música rock, uma mesas de madeira maciça, e um salão para praticar arco e flecha, tudo isso escondidos em cima de uma escada enorme e uma porta enorme de madeira e metal numa calçada que SÓ tinha isso.
uma das vantagens de ser jovem e estúpido: se topa qualquer coisa. e lá fomos, tínhamos já um grupo recorrente de amigos e naquele dia o grupo estava extendido com alguns colegas da escola eu acho.
apesar das críticas iniciais, a noite foi muito boa. demos várias risadas, falamos muita besteira, e bebemos como se não estivéssemos no ensino médio. pensando aqui como ninguém do bar veio pedir nossos documentos ???
vale dizer que não tenho muita certeza da minha descrição desse bar, mas era a energia que me passou.
lá pelas tantas, chegou um dos nossos amigos, que era muito mais próximo de mim do que da galera, e talvez por isso ele trouxe dois amigos juntos. vale dizer que nesse grupo todo só haviam dois caras gays contando comigo, e esse amigo que chegou com os colegas com certeza jogava no outro time. eram a definição de héteros raiz.
o tempo foi se passando, e conforme os copos se esvaziavam minha bexiga reclamava. como estávamos numa mesa dessas retangulares pique santa ceia, e eu estava no meio, tinha que incomodar algumas pessoas para eu poder sair e alcançar o banheiro (que me passava a energia de bar rockeiro mijado empoeirado estadunidense).
depois de algumas visitas ao mictório, percebi que o marlon fazia caretas quando eu pedia licença para ir ao banheiro e ele tinha que sair. o marlon era um dos colegas do meu amigo, e eu já o conhecia de vista.
em algumas das minhas visitas ao banheiro, ele já incomodado por ter que levantar toda vez disse "passar por cima" e eu o fiz sem problemas. vi que ele fez careta de novo.
achei graça e na volta, antes de ir pro meu lugar, parei na cadeira de uma amiga e ri com ela sobre a situação. tirar uma com cara de hétero é esporte nacional para alguns homens gays.
comentei com ela "se liga no marlon, vou passar por cima dele ha-ha-ha" e lá fui, exagerando movimentos passei por cima do colo dele, de frente para ele. para a minha surpresa, não houve careta como antes, houve olho no olho.
eu não entendi, pois minhas habilidades de entender sutilezas sempre foram horríveis. e minha amiga me olhava exatamente com a expressão desse emoji: 🤨
e a noite seguiu, mais bebidas, mais risadas, e minha bexiga chorando. em algum momento fui no banheiro mais uma vez, e depois que já tinha lavado a mão e saído do banheiro - que era perto da mesa que estávamos - percebi meu telefone vibrando, já sabia que era minha mãe e voltei pra dentro pra evitar o barulho desse bar fedido.
no que eu voltei para dentro, estava fazendo a checagem de localização e saúde com a minha mãe, quando o marlon entrou e foi direto pro mictório. nada de estranho até aí.
em questões de segundos, ele saiu do mictório, me alcançou na frente da pia, me levou para a parede e me desafiou no beijo mais surpreendente e com certeza um dos mais gostosos e suaves que já tive.
claro que a cena foi mais rápido do que meu cérebro em desenvolvimento conseguia processar, e eu estava durante todo esse tempo na ligação com a minha mãe, que obviamente começou a estranhar eu respondendo apenas com hum-rums.
consegui me desvencilhar da ligação, e do beijo. enquanto eu tentava assimilar toda a história que eu estava entrando, o garoto lavou as mãos (dr bactéria me salve) e foi pra mesa com a maior normalidade desse planeta. eu: atônico com o celular na altura do ouvido e com as costas na parede.
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vilão
Non-Fictionessas histórias parecem falar de amor. você encontrará erros de escrita. obra de ficção.