╔ MIDNIGHT ╝
[Livro 1 da saga Season of Terrors]
Escondida entre o Alasca e o Canadá, Riverwind é uma cidade amaldiçoada, fundada sobre segredos e sangue, moldada pela corrupção da poderosa família Atlas.
Persephone sempre soube o preço de carr...
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Riverwind, Mist Bay October 31, 2018
Era estranho viver em um lugar onde os deuses realmente governavam.
Mas não com a graça etérea ou a majestosidade que os antigos gregos celebravam. Aqui, os deuses reinavam por meio de mentiras, segredos e ruínas deixadas pelo tempo. E quem poderia nos culpar? Afinal, éramos apenas humanos, tudo o que herdamos deles foram seus nomes – ecos de uma glória esquecida – e o fardo que suas histórias impuseram sobre nossas linhagens.
E o lugar em que nos escondíamos, era nada menos do que o berço do diabo.
Na fronteira entre o Alaska e o Canadá, havia um lugar fora dos mapas, uma terra esquecida por deus, mas que havia se estendido em conexões por todo o mundo. Mist Bay era uma península no condado de Donov, abrigando em seu território sete cidades, Riverwind estava bem no centro, era o que chamávamos de cidade matriarca, uma pequena metrópole fundada por doze famílias influentes: os Atlas, Lorcan, Kennedy, Martin, Marks, Simons, Sinclair, O’Connell, Nikolaev, Avni, Kavish e Lange.
A cidade era comandada pelos Atlas, o que fazia dela quase um olimpo, com casas, mansões, prédios e comércios, prados verdes, montanhas escarpadas, um lugar constantemente consumido pelo frio das montanhas. Mas há também quem considerava esse lugar o próprio inferno.
Não sabíamos de onde os rumores tinham surgido, ou quando haviam começado, mas as lendas diziam que Riverwind havia sido fundada sobre o túmulo do diabo – o local em que Lúcifer havia caído após Deus expulsá-lo dos céus –, e por conta disso, havia mandado seus filhos prediletos para nos conceder uma eternidade de sofrimento, e que, Deus havia nos abandonado, pois fomos nós que procuramos por nossa própria condenação. Outros rumores diziam que os deuses gregos antigos, haviam nos amaldiçoado, porque aquele que carregava o sobrenome com o nome de um titã, havia roubado seus nomes.
Nem todos esses rumores estavam errados.
Mas havia um segredo maior que corria sob a pele de Riverwind, uma verdade que nem a mídia ou o governo ousaram expor, temerosos que as notícias se alastrassem para além da névoa que nos escondia do restante do mundo. Uma história só nossa, um pequeno segredinho sujo sobre um grupo de mascarados que fizeram da nossa cidade seu playground sádico particular. Sete figuras misteriosas que se autodenominavam os “Sete Pecados Capitais” e outros quatro que atendiam pelo título de “Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse”, sem contar os outros que chamávamos de Anjos Caídos. Juntos, criaram talvez o evento mais aterrorizante do século, um jogo macabro que só acontecia aqui, em Riverwind.
Chamávamos de Temporada dos Terrores. Um evento anual que durava nove meses inteiros, iniciando-se em fevereiro e culminando na noite de Halloween, ou, como agora era conhecida em Riverwind, a Monster Night. Durante esse período, a cidade se transformava em um tabuleiro de xadrez mordaz, onde cada morador era uma peça involuntária. Uma caça implacável, repleta de enigmas, desaparecimentos e cenas que pareciam saídas diretamente dos contos mais macabros já escritos.
Havia quem temesse a temporada, que se trancava dentro de casa e rezava para não se tornar parte da próxima história sussurrada nos becos escuros. Mas havia também aqueles que viviam pela adrenalina, que se deleitavam no suspense, na incerteza, na possibilidade de estar um passo à frente dos mascarados… ou um passo atrás.
E então, a Monster Night chegava. Uma celebração grotesca, um festival de horrores onde a linha entre o real e o pesadelo se dissipam completamente. Onde, sob as máscaras, se escondiam rostos que talvez para nós fossem familiares – mas que nunca saberíamos. E onde a própria cidade sussurrava em nossos ouvidos: aqui, os deuses nunca deixaram de reinar.
Todos os anos, sem falha, uma caravana de circo chegava a Mist Bay, trazendo consigo um espetáculo de luzes e sombras que se estabelecia no limiar de Riverwind. Era sempre em outubro, o mês onde os véus entre o real e o sobrenatural pareciam mais tênues, e quando a cidade já estava tomada pelo espírito do Halloween, esperando pela chegada do Twilight Carnival.
Diferente de circos convencionais, o Twilight Carnival era uma fusão entre espetáculo itinerante e parque de diversões, um universo próprio onde o ordinário e o macabro se entrelaçavam. Assim que cruzavam a estrada bifurcada ao sul, os primeiros caminhões da caravana surgiam como fantasmas entre a névoa matinal, seus motores roncando baixo enquanto os veículos, decorados com pinturas desbotadas de criaturas bizarras, serpenteavam até o campo designado para sua montagem.
A chegada do circo sempre causava um frisson. As primeiras estruturas eram erguidas com precisão quase coreografada – grandes tendas listradas em preto e roxo, postes de ferro retorcido que sustentavam lâmpadas em formato de lanternas antigas, guirlandas de abóboras iluminadas penduradas nas bilheterias e nas cercas que delimitavam o parque. Os portões de entrada eram moldados como um enorme sorriso sinistro, dentes pontiagudos e uma inscrição acima:
"Onde o Crepúsculo Nunca se Dissipa"
Os artistas e trabalhadores do circo eram figuras enigmáticas. Vestiam-se de maneira anacrônica, como se tivessem saído de uma fotografia do século XIX. Malabaristas, domadores, dançarinas e ilusionistas deslizavam pelo parque antes mesmo de sua inauguração oficial, preparando-se para encarnar os personagens que aterrorizariam e encantariam Riverwind. A trilha sonora do Twilight Carnival era um misto de música circense distorcida e sussurros de gramofones antigos, criando um ambiente que oscilava entre o fascínio e o desconforto.
Mas o verdadeiro segredo do Twilight Carnival estava na forma como absorvia a essência de outubro. Diferente de qualquer outro evento, o parque não apenas adotava uma temática de Halloween – ele se transformava em uma extensão do próprio medo. Os brinquedos e atrações eram projetados para induzir uma sensação de pesadelo vívido:
O Labirinto do Espelho Partido, onde cada reflexo parecia ter vontade própria, distorcendo-se para criar ilusões impossíveis.
A Roda Fantasma, uma enorme roda-gigante cujas cabines se apagavam completamente no ponto mais alto, mergulhando os passageiros em escuridão total por segundos angustiantes.
O Túnel dos Sussurros, uma montanha-russa subterrânea onde vozes espectrais murmuravam segredos nos ouvidos dos visitantes.
Ao entardecer, quando os primeiros feixes de névoa serpenteavam pelo solo, os mascarados da cidade começavam a se misturar ao público. Era impossível dizer quem fazia parte do circo e quem era apenas um visitante. Capuzes ocultavam sorrisos perversos, olhos curiosos espreitavam de trás de máscaras de caveira, e as sombras alongadas pareciam brincar entre as barracas.
O Twilight Carnival não era apenas um evento. Ele era um ritual. Um convite para atravessar a fina fronteira entre a diversão e o medo, entre o real e o que se esgueirava na escuridão. Em Riverwind, o circo não era apenas bem-vindo – ele era esperado.