Corações

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Rosalina, 10 anos, 26 de maio de 1705

Aquele momento parecia mais um ritual do que uma rotina, sua mãe a acordava de madrugada e fazia a rezar no seu santuário, quando elas viam o sol aparecer nas janelas do lugar, ela levava sua Rosalina para o jardim, arrumava seus cabelos, como se ela fosse mais uma das flores daquele lugar.

A rainha colocava a cabeça de Rosalina em seu colo, sentadas na grama, ela fazia um carinho suave em seu rosto por alguns instantes e então parava, Rosalina virava o rosto quando isso acontecia, sua mãe pendia a cabeça para trás e fechava os olhos e passava horas falando sobre as maravilhas do paraíso, um lugar com eterna paz, dizia que estava salvando sua alma e tudo que fazia era para manter a alma de Rosalina pura , sem pecados, quando se irritava franzia a testa e aumentava seu tom de voz, sabia que ela lembrava de algo mas nunca conseguiu descobrir o que a levou a ser assim, tão sedenta pela morte.

- Aquele homem não estará lá, e está levando seu irmão para o mesmo caminho

-Aqueles dois passaram a eternidade em chamas

- Mas você não minha rosa você encontrará os portões do céu

Rosalina não entendia tudo aquilo que sua mãe descrevia, todas essas maravilhas não poderiam ser vividas aqui? Queria sentir a felicidade, queria sentir o amor enquanto estivesse viva, e sentia isso com seu irmão por que ele não poderia ir com ela?

- Não quero ir para um paraíso onde ele não exista

Não devia ter pronunciado tais palavras, sentiu os céus se fecharem por cima de sua cabeça, o olhar que se encontrou com o dela não era o de sua mãe era o da rainha insana, sentiu a mão rudemente puxar o seu cabelo, a fazer levantar, ela foi arrastada de volta para o santuário.

Não Se ajoelhou nas almofadas vermelhas caras que tinham nos bancos, ela se ajoelhou no mármore gelado e sua mãe com raiva nunca foi uma pessoa piedosa, ela se tornava outra pessoa.

-Vai rezar por sua blasfêmia, peça perdão aos anjos, a todos eles

A rainha agora parecia com medo, olhava nervosa para cima, parecia enxergar algo que as outras pessoas não conseguiam, se afastou de Rosalina, tampando os ouvidos e fechando os olhos com força, sua filha não olhou para trás, não era a primeira vez que isso acontecia,ela andava nervosa para frente e para trás, tentando acalmar algo mas já não sabia se era a si mesma ou esses anjos, quando não tinha sucesso sua mãe desaparecia nas sombras e voltava apenas na hora de dormir, com um olhar cansado, como se aquelas visões tirassem todo a sua energia.

Rosalina não sabia dizer se o que fazia era totalmente errado, se a fazia se sentir livre então não deveria ser bom?

Ela se levantava, e antes de ajustar o seu vestido, olhava para os seus joelhos vermelhos, nunca tinha visto seus joelhos com outra cor. ela já tinha aprendido a lidar com a dor, parecia que de alguma forma aquele sentimento estaria ligado com ela por toda sua vida, quase como uma amiga que poderia compartilhar o seu sofrimento.

Então ela corria, corria pelas grandes portas de madeira, os quadros de seus ancestrais, reis e rainhas mortos, passava pelas rosas, suas irmãs de alma e então ia ao encontro de seu irmão

Ele sempre estava aprendendo algo novo, ele ficava entre livros e entre soldados que o ensinavam a lutar, não conseguia esconder ela o invejava, invejava a forma na qual ele vivia, se ele também estivesse em uma prisão pelo menos não era visível aos seus olhos, ela estica as pontas do pés o máximo que conseguia para poder enxergar ele em suas aulas.

Ela olhou para o professor, o homem velho e ranzinza estava dormindo e segurava um livro grosso fortemente contra o seu peito, parecia ainda mais bravo enquanto sonhava, ela não conseguiu segurar, sua risada alta atravessou o vidro da janela e chegou nos ouvidos do príncipe que anotava em uma folha com muita concentração, sua risada o fez borrar com tinta suas anotações, ela riu mais ainda, então ele finalmente olhou para ela e seu olhar relaxou, o príncipe nunca conseguiu ficar bravo com ela e não lembrava de nenhum momento em que ficou irritado com sua presença.

Ele largou sua pena no tinteiro, tentando sair lentamente de sua cadeira sem acordar seu carrasco, ele se considerava um estudante sortudo, o destino sempre fazia questão de lhe enviar professores com o sono pesado.

Quando finalmente saiu daquela sala, suspirou aliviado

- Me perdoe, eu atrapalhei os estudos de Vossa majestade?

Seu irmão a olhou de lado, entrando na brincadeira

- Apenas conseguira ser perdoada se conseguir escapar de mim

Então eles correram, brincando como duas crianças normais, sem responsabilidades, sem um reino e sem aquelas grandes muralhas que cercavam seus corpos. Quando se jogaram na grama, cansados e com a respiração ofegante, perceberam pela primeira vez que as única coisas que tinham no mundo eram um ao outro, os dois dividiam o mesmo espírito, um não poderia existir sem o outro, se isso era uma maldição ou uma benção, não queriam descobrir.

Eles encostaram as testas com os olhos fechados, podiam sentir que as batidas de seus corações estavam em harmonia, batendo da mesma forma, no mesmo ritmo e nada nesse mundo poderia separar dois corações que batem juntos.

Valence - Jungkook StoryOnde histórias criam vida. Descubra agora