Capítulo 1 - respaldo;

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30 anos depois
Aeroporto Internacional de Tokyo

Ajeitou sua gravata mais uma vez, enquanto ouvia vozes distintas sem nunca decifrar de fato as palavras proferidas, aguardando o momento que sua mala seria despachada e pudesse, enfim, ir para casa na expectativa de poder tomar um bom banho após horas no avião. Os dias longe de Tóquio foram, no mínimo, perturbadores. Desde que foi incumbido de viajar até Sicília por ordens maiores a fim de resolver certas burocracias, imaginou que teria dores de cabeça, e que estas não seriam causadas pelo bom e velho Nero D'Avola infelizmente.

Sua pasta de couro pesava mais do que na ida naquele momento, sinal claro de que tudo deu certo, felizmente. Sendo assim, seu próximo destino não o deixaria exaurido mentalmente, seria prático, do jeito que gostava. Ao menos, era o que pensava.

Notou, pelas grandes janelas do aeroporto, ao erguer a cabeça, que o clima da cidade estava nublado, coisa que sequer se atentou estando nos céus, tamanha sua concentração nos documentos que tinha em mãos. Torcia profundamente para que chovesse somente quando estivesse debaixo de grossas cobertas, aconchegante a um corpo quente muito específico.

Quem sabe dois.

Um sorriso sincero brotou em seus lábios com o pensamento, aquele calorzinho singelo que apenas duas pessoas conseguiam fazê-lo sentir.

Demorou apenas alguns minutos até achar sua pequena mala e partir para o estacionamento do local. Sabia que um carro já o esperava, por isso não tardou em entrar no sedan preto. Mal o fez, e seu celular vibrou no bolso da calça.

A mensagem era anônima, porém sabia muito bem quem era o remetente do outro lado da tela. As poucas palavras pediam encarecidamente para que não se atrasasse. Bufou, como se não soubesse o que fazer assim que pôs os pés para fora do avião.

Recostou sua cabeça para trás, fechando os olhos e usufruindo dos poucos minutos de silêncio que teria até chegar no grande casarão localizado numa parte mais afastada da cidade, onde a polícia não ousava colocar os pés, e todas as casas pouco agradáveis aos olhos, caindo em pedaços, servindo como uma espécie de disfarce. Uma jogada muito sagaz e inteligente. Quem visse de fora, passando pela larga estrada que dava acesso à grande capital japonesa, não imaginaria que há poucos metros estava uma das principais casas da maior máfia do país.

De modo automático, repassou em sua mente toda a conversa que teve com os italianos, os pontos altos mais do que frescos, passou tudo para o papel, mesmo que seu intuito fosse gravar cada frase. Infelizmente, todos naquela sala eram espertos demais, então a revisão minuciosa impedia que pudesse fazer tal coisa.

Por outro lado, tinha uma ótima memória, o que sempre vinha a calhar em missões mais diplomáticas como aquela, por isso sempre era mandado, e em sua maioria, sozinho.

Afrouxou a gravata, sentindo-se meio sufocado. Burocracias demais deixavam-o louco, com enxaquecas. Seu lado ambicioso tendia a gostar mais da adrenalina correndo por suas veias, quando podia colocar as habilidades de luta e tiro em ação. Filtrava todas as emoções negativas que ficavam guardadas no seu íntimo para esses momentos. Talvez fosse esse o motivo de ser tão temido.

Vinte minutos depois, desce do veículo, sentindo um vento forte soprar no rosto. Com certeza iria chover. A passos contidos, começou a andar pelas ruas asfaltadas, repletas de pessoas repletas de desesperança, os olhos fundos e vagos, o lugar à primeira vista. O velho acertou em cheio.

Cheiro de mofo e naftalina inundou suas narinas, mas para si, era melhor do que o odor de drogas, definitivamente. Poderia estar no meio da sujeira, porém fazia de tudo para não respingar no próprio corpo.

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