CAPÍTULO I

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A manhã gélida daquela segunda-feira arrepiava cada pedaço de pele de Minho, nem mesmo seu cachecol vermelho de lã grossa fora capaz de aquecer a derme do acastanhado quando a senhora já de idade, corcunda e de cabelos grisalhos, abriu a porta da livraria com lentidão enquanto removia de suas roupas, as pequenas folhas e galhos secos que indicavam que a estação já estava em seu auge.

Minho, ao visualizar a mulher, sorriu gentil. Não era surpresa nenhuma para ele que ela estaria ali, afinal ela marcava sua presença todos os dias no mesmo horário.

Após fechar a porta de seu estabelecimento favorito, ajeitando seu casaco verde musgo, a senhora aproximou-se da bancada marrom e desgastada onde Minho encontrava-se logo atrás. Sorriu doce para o mais novo, tinha uma imensa afeição por aquele garoto desde que o pegou no colo anos atrás.

- Bom dia, Minho! - Cumprimentou o acastanhado com um apertar carinhoso em seu braço e sorriso que deixava as bochechas gordinhas e enrugadas, aparentes e vermelhinhas.
Minho a achava muito fofa e ria sempre que a idosa resmungava consigo que as mulheres da igreja local eram linguarudas demais e preferia ler sua Bíblia na livraria do avô de Minho.

-Bom dia, senhora Park! Como se sente hoje? - Como todas as manhãs, Minho já se esticava para alcançar uma xícara na cristaleira atrás de si, para servir um pouco de café fresco para a idosa tão simpática. Serviu o café até a metade, empurrando levemente em cima do balcão para mais próximo da mulher, essa que lhe lançou um sorriso sem mostrar os dentes em forma de agradecimento.

- Me sinto muito bem apesar das dores na minha coluna, ser velha não é nada fácil, menino, aproveite sua juventude! - Pegou com cuidado a xícara que lhe fora servida, levando até os lábios pequenos, provando do gosto amargo enquanto soltava um suspiro em deleite. - Muito obrigada pelo café, querido.

- Não há de que - Minho saiu de trás do balcão segurando de forma firme e cuidadosa os braços da senhora Kim a levando para a poltrona de coro sintético que ficava no fundo da livraria, onde todas as manhãs a idosa dedicava seu tempo para conversar com Deus.

Minho não era uma pessoa de crenças, mas admirava-se com o amor e devoção que a senhora demonstrava enquanto lia sua Bíblia.
Era curioso para ele ver como as pessoas estavam sempre se segurando em algo, sejam crenças, pessoas, bens materiais e até mesmo químicos legais ou ilegais. Mas não era como se ele também não tivesse algo para se segurar, ele tinha, o problema era que ele não sabia se era porque queria e gostava, ou se ele apenas não tinha muitas opções e oportunidades.

Mas isso não era algo no qual ele pensava com frequência, tinha coisas mais importantes em sua vida do que ficar refletindo sobre coisas que, na visão do mesmo, não o levariam a lugar nenhum.

Os dias de Minho eram assim, calmos e com cheiro de livros, cheiro esse que às vezes irritava seu nariz sensível, mas isso era mais uma das coisas que ele não se importava, assim como o ranger insistente e irritante da porta de entrada, o tic-tac do relógio velho pendurado acima da porta e aquelas micro bolinhas de madeira que caiam das estantes velhas graças aos cupins que ali habitavam.

Nada daquilo conseguia estressar o acastanhado quando ele podia simplesmente pôr seus velhos e remendados fones de ouvido, ler seu livro favorito pela vigésima oitava vez - livro esse que se tratava de crepúsculo, mas isso ele não admitiria que alguém soubesse - e beber o seu tão agraciado café amargo. Isso, sim, era paz na visão de Minho, e nada, repito, nada tirava sua tranquilidade naqueles momentos.

Mas, como nada é mil maravilhas, havia sim algo, ou melhor, alguém. Esse alguém era apenas um pouco mais baixo, tinha cabelos castanhos mais claros com a franja muito mais clara ainda, um rosto fino e tinha como atividade de lazer irritar o melhor amigo livreiro que se localizava no outro lado da rua, para a felicidade de um e a irritabilidade de outro - ou não -.

𝐂𝐚𝐟é 𝐄 𝐂𝐡𝐮𝐯𝐚 // MɪɴsᴜɴɢOnde histórias criam vida. Descubra agora