A Luz do Inferno

† Prólogo

A luz do sol atravessa o vitral com gentileza, iluminando o chão de pedras da catedral de forma melancólica e sagrada. As paredes de pedra fria mantinham a acústica perfeita, fazendo o som do órgão reverberar pelas paredes, repetindo-se de forma profunda e poética, mas sem atrapalhar as novas notas que gentilmente são tocadas pelos finos dedos do bispo Charles.

De frente para o crucifixo, Angelina continua sua prece sussurrada, ajoelhada, com olhos fechados e mãos unidas, rodeada por trinta e três velas acesas, com suas chamas balançando suavemente.

Little Fugue In G Minor era tocada com esmero, e o som preenche a alma de Angelina de forma pacífica, auxiliando sua concentração em sua prece. Tão focada no sagrado que não escutou o som das portas da catedral abrindo e fechando.

Em silêncio, Claudia se ajoelhou ao lado da amiga e irmã em fé. O véu branco por cima dos fios negros como a noite contrastava de forma bonita e poética.

— Pai nosso que estais nos céus, santificado seja o teu nome...— as duas sussurram, rezando silenciosamente.

Quando chegaram ao fim, Angelina finalmente abriu seus olhos, observando a cruz que parecia brilhar por tamanha santidade. Ela exprimiu um discreto sorriso de canto e ajeitou a postura, erguendo o queixo e ajeitando o véu sobre os fios loiros como a luz do sol.

— Estava conversando com o bispo Charles sobre o tempo celestial — Claudia comentou repentinamente, surpreendendo Angelina que não havia notado a presença da amiga.

— Não te vi chegar — Angelina riu baixinho, quase num sussurro. Sentou-se sobre os próprios pés e apoiou as mãos nas coxas, alisando o tecido macio do vestido com os polegares. Estava frio.

— Vim em silêncio. Me atrasei muito para a prece de purificação? — Claudia questionou, os grandes olhos escuros parecem vazios e agitados, mergulhados numa ansiedade curiosa.

— Não, chegou bem a tempo — Angelina a acalmou, estendendo o braço e tocando-a no ombro. — Mas... por que falou sobre o tempo celestial?

Angelina pode ver a pele do rosto de Claudia avermelhar-se nas bochechas. A moça era uma amiga de longa data, mas era nova nos assuntos celestiais.

— Só queria compartilhar — envergonhou-se, mas recebeu uma risadinha de Angelina em resposta. Uma risada doce e gentil.

— Não precisa ter vergonha do que diz, Claudia. Quando começamos, as novidades são deliciosas e sentimos vontade de compartilhar. Me diga, o que pensa sobre o tempo celestial?

Claudia aperta os lábios e os solta em seguida, respirando pela boca por um instante. Angelina nota uma fumaça branca muito fina saindo de seu hálito. Estranho, pois o frio não deveria estar tão intenso.

— É curioso pensar que passado, presente e futuro tanto nos céus quanto na terra são completamente diferentes. Se pudéssemos entrar em contato com o mundo espiritual, poderíamos ver tanto a criação do nosso planeta quanto o fim dele — ela confessou, apertando as mãos e desviando o olhar. — Acho que isso me assusta.