Capítulo 39- A Visita

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Impressionante, mas quando temos algo importante é que as coisas acontecem...Justo hoje, dia da visita, Luke estava enjoado, febril, início de um resfriado. Tínhamos acabado de almoçar. Minha mãe e meus sogros estavam todos a mesa. Eles também seriam entrevistados. Eu ia colocar Luke na cama para um cochilo...
Era uma tarde ensolarada, quando o agente do serviço social, Sr.Baxter, chegou à nossa casa para realizar a minha avaliação, como ele mesmo colocou, de "madrasta" e possível adotante de Luke e Eve.
Eu estava bem agitada, nervosa e incomodada com a denominação, mas determinada a responder todas as dúvidas sobre a moradia, meu relacionamento com Jessica e o convívio com as crianças. Eu queria dar o meu melhor durante a visita.
O agente nos cumprimentou e perguntou se poderia começar conhecendo a casa, desde o jardim até o sótão. Autorizamos e o conduzimos na inspeção em cada canto. Ele comentou que a casa era bem bonita, espaçosa. Falou sobre a piscina estar devidamente cercada e a área de lazer ter brinquedos apropriados e seguros.
-Verdade...Foi uma prioridade escolher minuciosamente os melhores brinquedos do playground. Eles foram produzidos na melhor empresa e com o maior selo de aprovação. É a primeira em segurança de produtos infantis.
Enquanto ele olhava o jardim, comentei com Jessica...
-Pelo menos da casa, ele está gostando, né amor?
-Sara, ele vai amar você, meu amor! Fica tranquila! Relaxa um pouco!
-Não me pede para relaxar, Jessica! Você sabe que eu estou tensa e não adianta ficar repetindo isso todo tempo! Eu só vou relaxar mesmo, quando esse homem for embora daqui!
-Eu sei amor, mas é força do hábito! Eu só quero que você tenha segurança e confiança em você mesma, mas eu entendo. Vamos lá!
-Bem, a escada está protegida com portão, todas as tomadas com proteção... Mais algum cômodo para ser verificado?
-Não senhor. Vimos tudo.
-Bem, então terminei a inspeção da casa. Teriam um lugar, uma mesa especificamente, que eu pudesse fazer umas anotações?
-Claro! Por favor me acompanhe. Pode usar nosso escritório... Deseja uma água, um suco de pêssego natural, Sr. Baxter?
-Um suco, está ótimo!
Fui até a cozinha.
-Yola, por favor, serve um suco de pêssego pro senhor no escritório?
-Claro!
-Bem, Sra. Ramirez, gostaria de comecar a entrevista conversando com os avós das crianças. Pode ser aqui mesmo, no escritório?
-Pode sim.
-Gostaria que as avós viessem, depois o avô. Quem virá primeiro?
-Eu, posso ir.
Minha mãe se prontificou. Ficou por 10 minutos e saiu. Kate foi a seguir.
-E aí, mamãe?
-Ele me perguntou sobre meus netos, minha relação com você, com Jessica. Como você e Jessica eram. Se haviam conflitos.
-E você, respondeu o que?
-A verdade, Sara. Nada mais que isso.
-Só isso, mãe?
-O que mais eu poderia dizer, filha?
-Num sei, mamãe, me fala o que ele perguntou...
-Perguntas normais...Tudo que eu respondi, você já sabe...Se acalma, Sara...
-Jessica, que irritação! Todo mundo mandando eu ter calma!
Steven e Kate saíram do escritório.
-Sra. Jessica Ramirez, agora é sua vez. Vamos?
Repeti as palavras dele...
-Jessica Ramirez...Humm...
Era a primeira vez que escutava, Jessica sendo chamada pelo novo nome de casada...
Depois de um tempo, Jessica saiu do escritório com um sorriso nos lábios e só fez um sinal pra mim, cruzando os dedos de sorte! Nem tive tempo de pensar...
-Sra. Sara Ramirez...
Sentei-me. Meu corpo todo estava tenso. Sentia meus músculos tremendo por dentro.
-Obrigado pelo suco, muito gostoso. É natural?
-É sim. Aqui utilizamos só coisas naturais. Evitamos produtos industrializados. As frutas vem sempre do pomar da minha sogra Kate Capshaw. Ela nos envia diariamente, ainda mais agora que Jessica está amamentando a nossa filha de dois meses.
-São somente, duas crianças, um de três anos e uma de dois meses, não é?
-Isso mesmo.
-A senhora tem convívio com as crianças há quanto tempo?
-O mais velho tinha um ano e dois meses, quando eu e Jessica começamos a nos relacionar, portanto, dois anos. E minha filha desde que estava na barriga da mãe.
-E como foi o início desse convívio?
-Eu apareci na casa da minha esposa, na época minha amiga, para entregar um livro e Luke não estava conseguindo respirar. Foi um momento delicado. Ela estava desesperada e eu os levei imediatamente pro hospital. Ela teve uma crise por estresse e eu tomei a rédea da situação. Precisei acompanhá-lo durante todos os exames e imediatamente ele criou uma conexão gigante comigo, porque se sentiu muito seguro. Até hoje, nós temos algo que vai além de um mero convívio. Ele é meu companheiro. Desde então, são dois anos que eu e Jessica estamos juntas. Nossa relação é muito intensa como mãe e filho e a minha filha, Eve, eu acompanhei a gravidez toda de Jessica, durante o nascimento e, assim como meu filho, fica muito tempo comigo, porque minha mulher amamenta a cada 5 horas e normalmente, eu acordo sempre junto com ela. Eu ponho pra arrotar, troco a fralda, ponho pra dormir, depois da amamentação. Eu tenho acompanhado tudo. Eu cuido deles sempre, assim como minha mulher faz. É uma tarefa bem dividida, tanto com Eve quanto com Luke...
Eu podia perceber que o Sr. Baxter estava me entupindo com uma série de perguntas para verificar o meu relacionamento com as crianças e minha aptidão para ser uma "madrasta" responsável.
O que me incomodava era o fato de ele se referir as crianças como se não fossem minhas, simplesmente, por eu não ser a mãe biológica. Ele insistia e me colocar como uma "madrasta" que estava prestes a dar uma maçã envenenada pras crianças! Eu não era assim, graças à Deus, nem Jessica me fazia sentir desta forma. O Sr. Baxter parecia mais um grande testador da minha paciência...
-Como você descreveria seu relacionamento com os "filhos da sua esposa", Luke e Eve?
Engoli em seco, antes de responder sobre "os filhos de Jessica"...
-Eu os amo e eles são meus filhos também, mesmo não sendo meus filhos biológicos. Cuido deles diariamente, crio um ambiente seguro e estimulante para que possam crescer bem e me coloco à disposição para suprir suas necessidades. Participo intensamente das tarefas e ajudo Jessica com eles.
As perguntas pareciam iguais, mas eram quase que uma pegadinha...
-Qual é o seu papel na vida das crianças enquanto madrasta?
Respondi com cuidado, mas estava incomodada com a insistência dele! Que raio de pergunta era essa? Não me sinto como madrasta e nem sou!
-Desculpe-me, mas não sou madrasta! Meu papel é ser uma figura de apoio e amor para Luke e Eve. Estou aqui para cuidar, educar e orientá-los, sempre respeitando e entrando em acordo com minha mulher, que é a mãe biológica deles.
-Então a senhora não respeita os limites impostos pela mãe deles?
Esse cara está querendo me confundir ou me irritar?
-Existe um respeito mútuo, entre nós duas. Na realidade, nós conversamos muito sobre a educação das crianças. Jessica não determina limites pra mim. Educamos juntas e ela sempre me inclui nas decisões a serem tomadas. Outra coisa, nós não interpretamos a situação, como eu sendo uma madrasta e Jessica sendo a mãe. Cuidamos deles de forma igual...Amamos nossos filhos de forma igual, sem rótulos.
Enquanto o agente me fazia a próxima pergunta, escutei um choro. Era Luke. Isso me incomodou... O que estaria acontecendo? Ele não estava bem. O choro foi se intensificando, mas eu devia continuar.
-Como você lidará com as diferenças entre Luke e Eve?
-Luke e Eve são indivíduos únicos, com suas próprias personalidades. Nós valorizamos essas diferenças e tentamos encontrar formas de incentivá-los a serem eles mesmos. Sempre me esforço para tratar Luke de acordo com suas necessidades e interesses.
Luke chorou mais e apesar do som estar mais distante, escutei ele me chamando.
-Você já teve algum conflito com Luke? Como você lida com isso?
-Lógico que sim. Meu filho está em processo de aprendizagem, precisa aprender limites, valores e, como em qualquer relacionamento, surgem conflitos às vezes. Eu e Jessica acreditamos na importância da comunicação aberta e do diálogo. Sempre busco a solução pacífica e ensino a Luke como lidar com seus sentimentos de maneira saudável. Faremos o mesmo com Eve.
Choro incessante de Luke me preocupou...
-Qual é a sua abordagem em relação à disciplina?
-Busco educar as crianças através do diálogo, estabelecendo limites claros e consistentes. Sempre me esforço para ser justa e transmitir valores de respeito e responsabilidade, pra Luke o mais velho e...
O choro de Luke se intensificou e escutei ele me chamando.
-Sr Baxter, me desculpe, mas meu filho está chorando muito, ele não amanheceu bem. Está resfriado e...
Enquanto Sr. Baxter insistiu em continuar a entrevista, Luke interrompeu a conversa, chamando por mim, aos prantos, batendo na porta do escritório, enquanto eu escutava alguém tentando impedi-lo...
O agente ficou visivelmente irritado com a interrupção, dando a impressão de que não estava satisfeito com a situação. No entanto, eu estava preocupada com Luke e me lixando para o que ele achava ou deixava de achar! Eu permaneci aparentemente calma, mas segura das minhas responsabilidades maternas. Levantei-me e abri a porta do escritório...
-MOMMY! MOMMY!
Luke agarrou minhas pernas. Estava chorando e sem conseguir quase falar, esticou os bracinhos na minha direção... As avós vieram atrás...
-Perdão, Sr. Baxter. O que foi filho? Você caiu?
Ele não conseguia falar. chorar. Eu o segurei, deitei sua cabeça no meu ombro e pedi que parasse.
-Calma, meu amor. Pronto... Você está no colinho da mommy. Não precisa chorar mais. Agora fala pra mommy, o que aconteceu?
-Tá doendo aqui mommy...
-Sra. Sara, por favor...
-Um minuto senhor... Cadê a mamãe, filho?
-Tá dando leitinho pra Eve...MOMMY tá doendo...
Mais choro...
-Calma meu amor! Vamos ver...
-Senhor, nos desculpe! Sara, tentamos de tudo, mas ele não quis ficar conosco, nem com Anne e Jessica está amamentando Eve...
-O que houve?
-Ele acordou e parece estar febril. Está com dor de garganta.
-Kate, por favor, mede a temperatura dele e pega o antitérmico e dê a ele, se passar de 38°C.
-Sra. Sara precisamos continuar...
-Eu entendo, mas preciso cuidar do meu filho...
-Vem com a vovó, meu amor...
-Não... Tá dodói mommy!
-Eu sei meu filho. Fica quietinho! Qual a temperatura, Kate?
-Está em 38.5°C.
-Pode dar o antitérmico. Vai com a vovó agora, filho...
-Não mommy!
-Por favor, filho, a mommy está acabando e já vai pegar você...
-Vem com a vovó...
-Não MOMMY! Nãoooo!
-Ok, ok... Kate deixe Luke comigo. Ele está com dor e não vai querer o colo de ninguém, neste momento. Filho, sem chorar e sem grito...Você vai ficar quietinho?
Luke balançou a cabeça afirmativamente.
-Sra. Sara, assim vai ficar difícil...
-O senhor pode aguardar um instante?
-Sra Sara...
-Um minutinho por favor... Só vou dar um remédio a meu filho.
-Sra. Sara, precisamos finalizar a entrevista! Ainda tenho algumas perguntas...
-Como você se adequaria à rotina e às necessidades das crianças em longo prazo?
-Eu amo Luke e Eve. São meus filhos e estou disposta a me dedicar a eles pelo resto da minha vida. Sei que a rotina e as necessidades mudam ao longo do tempo e estou comprometida em adaptar-me e crescer junto com eles.
-Mommy tá doendo...
-Desculpe-me, Sr. Baxter, mas não posso continuar. Se puder volte uma outra hora. Meus filhos são minha prioridade e, principalmente num momento como esse, de doença. Ele está com dor, precisando da minha atenção. Minha mulher está com nossa filha e no momento não pode me substituir. Se puder esperar...
-Infelizmente não posso. Ainda faltaram perguntas importantes...
-Eu lamento, se não conseguir continuar e isso me impeça de adotar meus filhos, mas esse momento é muito mais importante que qualquer adoção. Meu filho precisa de acolhimento agora, não na hora que eu estiver disponível. Não posso deixar pra depois. Desculpe-me, mas nenhuma entrevista pode ficar antes dele. O bem-estar da minha família estará sempre em primeiro lugar.
Jessica deixou Eve com minha mãe, para que arrotasse e tentou segurar Luke. Ele insistiu em ficar no meu colo.
-Lamento muito senhoras, mas não posso continuar. Vou terminar minhas anotações e deixar uma cópia do meu parecer para ser entregue a sua advogada.
-Sr. Baxter, sinto muito...
Enquanto ele escrevia, Jessica tentou me confortar, porque eu estava visivelmente emocionada pelo fracasso da entrevista...
-Jess...
Apertei meus lábios pra não chorar...
-Jess, decepcionei você mais uma vez... Fui um fracasso...
-Não amor! Não fala isso! Você não me decepciona nunca! Nada mudou! É só um papel! Eles são seus filhos! Olha, pra Luke! Ele busca você, sempre! Sara, você é minha base, meu suporte.
-Filha, você é uma mãe fabulosa. Tudo tem uma razão de ser! Acredite, por favor! Não é Kate?
-Claro! Você é fantástica como mãe, Sara, é especial como companheira, nora, filha. Eu fico tranquila em saber que você é mãe dos meus netos também. Tudo vai se ajeitar...
No final da visita, o agente do serviço social se despediu.
-Sras.Ramirez deixarei a cópia dos papéis com minhas anotações finais sobre o console, na entrada da residência. Espero que o menino Luke melhore.
-Obrigada e desculpe-nos mais uma vez, Sr. Baxter.
-Ok. Até a próxima.
Quando ele saiu não consegui me segurar e comecei a chorar...
Jessica se aproximou, me abraçou e eu respirei fundo, dizendo...
-Prestou atenção no que ele falou, amor?
-Prestei... É... teremos que passar por outra entrevista...
Respirei fundo...
-Jess, não me importo! Agora, o que eu quero é cuidar deste molequinho aqui! Amor, pega o Vicky pra passar no peito dele e o remédio da garganta, por favor...
-Vai doer, mommy?
-Não vai doer... Você pode confiar na mommy! Abre a boquinha...
-Vai doer!
-Não vai! Só vai doer se não colocar o remédio. Então abre a boquinha... Isso! Duas gotinhas que a mamãe vai colocar, tá bom? PRONTO! Doeu?
-Não!
-Agora vai melhorar a dorzinha que você está na sua garganta, está bem?
Minha irmã apareceu pra nos dar um apoio e trouxe um festival de esfihas, de todos os sabores, entre salgadas e doces, para nos deliciarmos no fim da tarde. Eu não estava muito no clima, mas Carla sabia me animar. Conversamos bastante e contamos sobre o fracasso do encontro e na mesma hora nosso telefone tocou... Era Ashley, tentando saber como tinha sido a entrevista com o agente.
-Um fracasso! Não fomos até o final. Ou melhor, a minha entrevista não foi! Luke passou mal, tive que socorre-lo. O cara não podia esperar, enfim... Vamos ver! Devem marcar a outra, ano que vem. Acho que a adoção, vai ficar só pra quando Deus quiser, Ashley...
...
Enquanto isso...
-Pessoal, porque a entrevista deu errado?
-Ah Carla, você sabe como Sara é... Largou tudo pra acudir Luke e o agente não gostou muito, não quis esperar e a entrevista ficou pela metade...
-Mas e aí?
-Aí, nada, Carla!
-Mas ele disse que foi ruim?
-Não, mas pelo andar da carruagem...Ele deixou umas anotações e foi embora. Sara está super chateada e sei que vai desabar quando estiver sozinha com Jessica.
-Onde estão essas anotações, mãe?
-No console de entrada, filha...
...
Ainda conversando com Ashley...
-Bem, vou lhe passar para Jessica. Estou com Luke no colo. Um abraço e obrigada por tudo.
-Oi Jessica! Preciso que pegue os papéis, digitalize e me envie por email.
-Sara, Ashley pediu pra digitalizar os papéis. Como faço? Me mostra?
-Jessica, me dá o celular...
Carla disse, já o pegando da mão de Jessica...
-Eu faço pra vocês, mas primeiro quero ler, o que está escrito nesses papéis, mana ... Oi Ashley, é Carla! Espera um pouco! Antes de desligar, escuta isso...Vou colocar no viva voz...
-Ok Carla!
-Prontas? Vamos lá ...

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