O corpo incomodava, na verdade a ausência dele, era difícil vagar constantemente como um espectro, sem forma física exata, mas as vezes ele até conseguia sentar, deitar, descansar e afins, só que na maior parte do tempo o corpo parecia um véu fino que atravessava tudo que tocava. Ele não se lembrava muito bem como tinha chego naquele estado, ele morreu claro, mas por que ficou preso naquela forma? Se ele conseguisse se lembrar dos últimos momentos, da vida, qualquer coisa.
Paraná começou a bradar sem perceber, os pensamentos melancólicos sempre o levavam a fazer isso, então a figura espectral vagando pelos pinheiros no meio da noite enquanto o som melancólico da dúvida soava era uma cena comum na região sul do Brasil.
Ele ouviu um farfalhar de asas, esse som tirou o espectro da nuvem de pensamentos negativos, consequentemente o som da lamuria parou.
- Merda... Eu fiz de novo...
O paranaense continuou se movendo, ele precisava de companhia, se sentia afastado da realidade, solto no mundo, tinha que encontrar alguém para conversar, e ele conhecia a melhor pessoa pra isso, na verdade, será que pessoa era a palavra certa?
O espectro vagou por algumas horas, a noite já estava aparecendo quando ele entrou em uma mata densa e escura, a luz esverdeada que emanava de seu corpo banhava tudo ao redor. Paraná logo chegou a uma caverna e dentro dela um grande espelho envolto em prata esperava. Ele usou toda a força que tinha dentro de si para se tornar o mais tangível possível, caso contrário, sabia que não funcionaria.
- Loira do banheiro, loira do banheiro, loira do banheiro... – Ele deu três soquinhos no vidro, o corpo oscilou imediatamente após o esforço para tal ato – Caralho, cu, buceta...
Não demorou muito para uma figura se materializar atrás dele, ela começava assim como o espectro, translucida, fraca, quase inexistente, mas aos poucos a imagem da mulher loira ia ficando cada vez mais e mais real, até se tornar tangível.
- Paraná? O que ta fazendo aqui?
- Oi Catarina! – Ele se aproximou e tentou abraçar a mulher, mas os braços passaram direto – Merda...
- Tu ta fraco de novo?
- Sim...
- Por isso me invocou?
- Eu também tava com saudades...
- Tava com saudades de ti também – A loira se moveu até seu espelho – Fazia tempo que eu não via meu espelho principal... Nossa, ele tá acabadinho.
A mulher passou a mão pálida e ensanguentada pelo espelho empoeirado, ele era muito grande, mas estava envolto em vinhas e sujo. Santa Catarina rasgou um pedaço do longo vestido e começou a limpar o objeto, conforme a poeira saia, novas manchas de sangue eram deixadas. Enquanto isso Paraná vagou até próximo da mulher.
- Queria poder ajudar...
- Ei! Chega de melancolia, não quero que comece com aqueles gritos não.
- Ta bom, ta bom, parei já.
- Fica feliz por ter conseguido me chamar, foca nisso.
- To tentando.
- E a Naná? Consegue invocar ela?
- Consigo.
- Ela vai te ajudar a se sentir melhor – A mulher parou de limpar o objeto por um momento e sorriu para o espectro, mesmo que ela estivesse, literalmente, morta, ainda era um sorriso gentil.
Paraná foi até a entrada da caverna, a noite agora estava totalmente iluminada pela lua cheia, ele solto um grito agudo e prolongado quando chegou na parte de fora, onde quer que a amiga estivesse ela iria escutar e vir até ele. Isso inclusive era uma coisa que muito instigava o espectro, como ele, uma alma rejeitada pela morte, devolvida pela terra, conseguiu fazer amizade com um ser divino, na verdade ele tinha sido basicamente adotado por ela assim que acordou da sua "morte". O espectro foi voltado para o interior da caverna, não tinha razão para aguardar do lado de fora, Naná o acharia de qualquer forma.
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Estilhaço
Fantasy"E se os estados fossem lendas do folclore brasileiro?" Bom, eu pensei no que aconteceria :3 Tendo foco nos sulraná (me processa fofa), a história vai passar por todos os estados brasileiros. A arte da capa foi feita pela Nikkiyan (Nikkiyan_), os O...