Carcaça

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Paraná pensou que se irritaria com aquilo, porém, o fato do carioca falar mais do que a própria boca ajudava muito o espectro a não se perder em pensamentos negativos. Também era muitíssimo interessante ouvir aquele... aquela... seja lá que ele fosse, era interessante ouvir tudo que ele tinha para falar sobre o tempo que já tinha "vivido", sobre as mudanças da sociedade e especialmente sobre São Paulo, Rio de Janeiro não disfarçava o quanto gostava de pontuar características do paulista sempre que podia, o que acabava sendo um dialogo extremamente agradável enquanto Paraná, Rio de Janeiro e Naná desciam a margem do rio.

- Calma, mas me deixa entender – O paranaense precisou interromper – Você tem quantos anos mesmo?

- Iii rapaz, difícil de saber ein, eu nunca contei não, mas, eu sou mais velho que o paulista, e eu conheço a peça tem uns quatrocentos e poucos anos. 

- Caraca...

- Poisé, a carinha de tchutchuca engana.

- Então tu meio que já viu gente de todo tipo?

- Na verdade sim...

- Consegue ter ideia de quantos anos eu tenho? – O espectro apontou para as vestimentas.

Rio de Janeiro tentou tirar alguma informação das "roupas" do outro, mas além de ser translucido, não era nada que trouxesse alguma informação, ele conseguia ver uma calça, camiseta e jaqueta, mas nem era possível definir as cores, tudo tinha um tom espectral de verde e os pés estavam tão claros que não era possível definir nada além da silhueta.

- Na verdade... não, apesar de ser uma entidade eu não sei tanto esse tipo de coisa, só se tu usasse uma roupa muito diferente e tals...

- Uma entidade?

- Sim.

- Como assim?

- Ué, tipo, eu não to nem vivo e nem morto, não tenho necessidades básicas, mas isso não quer dizer que eu não consigo fazer as coisas, tipo você assim que não consegue – Rio de Janeiro fingiu que não viu a cara de desagrado que apareceu no rosto do paranaense – Eu meio que existo desde que as pessoas acreditem que eu existo, seja pra valer ou aquelas histórias que as avós contam pros netos ficarem com medo.

- Entendi, entendi – Ele tentou ignorar o comentário desnecessário, estava mais focado em ter mais informações – E eu sou o que?

- Um morto...

Paraná apenas fez uma cara de desgosto.

-... mas um morto diferente do Sampa, na real eu nunca tinha visto um bradador antes, já ouvi falar, várias vezes, mas você é o primeiro que eu conheço, o único talvez? Não sei, eeeeeeeEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE!!!!

O carioca não conseguiu completar o raciocínio já que a capivara saiu correndo loucamente pela margem do rio o levando nas costas.

- NANÁ!!!!! – Paraná imediatamente acelerou para acompanhar a amiga.

O roedor correu a todo vapor até determinada parte do rio, uma que parecia ter várias e várias pedras ao fundo, ela olhava para o fundo e olhava para o rosto do paranaense, tentando sinalizar alguma coisa.

- O que foi meu amor? – Ele demorou para entender.

- Sua capivara ta maluca? – Rio de Janeiro tentava permanecer nas costas de Naná enquanto essa se encontrava agitada.

Depois que o espectro focou um pouco mais a visão ele conseguiu entender o motivo de tudo aquilo, no fundo do rio, preso entre as pedras, estava a trouxa de tecido em que os cacos do espelho da amiga estavam.

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