Não demorou muito para os outros se juntarem a nós no balcão. Agnes conseguiu fazer com que Mary e Malik comessem alguns pedaços de frutas distribuídos por Miguel, e ambos agora estavam sentados e conversando entre si. Paola, Edu e Leandro estavam sentados no balcão comigo e Marcelo, todos tomando de seus copos.
- depois dessa noite eu vou passar um bom tempo sem ir pra boates. Isso se eu voltar algum dia. – Paola enfatiza, e todos nós concordamos.
Mordo um pedaço de fruta, em seguida tomo um gole do meu copo e fico observando o líquido.
- sabem, - ela fala novamente – eu estava conversando com o Miguel sobre esse lance que você falou, - apontou para Leandro com o queixo – sobre demônios serem invocados, certo?
Leandro assente, vejo quando ele troca um olhar com o marido.
- isso. Pense que fosse como se existisse um mundo além deste, outra dimensão, um Dimensão sem Vida, e todo tipo de seres malignos são servos de alguns com maior poder. – ele brinca com um cacho – há três seres supremos, e seu único desejo em comum é conquistar outras dimensões, outros mundos, para usar a vida como alimento, e seus servos tem essa função, como um exército. Mas como esses seres passam eternidades sem se alimentar o suficiente, eles não conseguem se transferir com facilidade entre dimensões. A não ser que sejam invocados para aquele mundo em específico. Alí ele se alimenta o suficiente para que consiga abrir passagem para os outros virem.
Eu senti um gelo percorrer minhas costas de imediato. Vejo Edu engasgar com a bebida e olhar incrédulo para o amigo.
- está dizendo que mais dessas coisas podem vir pra cá, para Prinadelir?
Leandro assentiu.
- não só para Prinadelir, só Deus sabe o que podem fazer no universo Inteiro.
- e como você sabe de tudo isso?
Leandro morde o lábio inferior por um instante, o gesto sexy se suas palavras não estragassem.
- meu pai é meio obcecado por essas lendas. Ou pelo menos eu achava que eram lendas. Desde criança tive contato com essas histórias e tudo o mais. Nunca pensei que presenciaria em vida algo assim.
Marcelo fica em silêncio apenas olhando o copo, noto a agitação de seu pé batendo no chão, preocupação?
Paola pisca os olhos com força, então entorna todo o conteúdo de seu copo. Edu está pensativo, mas fala:
- o que acontece se abrirem essa... Passagem? Essa fenda entre dimensões?
Leandro deixa o cabelo e se inclina no balcão.
- isso aí fora, em enorme escala.
Rapidamente minha mente viaja todos os quilômetros até em casa, até minha mãe, sorridente e preocupada, e minha irmã, para as coisas mais importantes da minha vida...
Então para o que presenciei lá fora...
- não... – o sussurro escapa de mim – não posso deixar isso acontecer com elas...
- o que? – Marcelo, ao meu lado, pergunta.
Eu ergo os olhos para ele.
- eu não posso deixar que isso aconteça com minha mãe, com minha irmã. Não posso... Eu tenho que fazer alguma coisa... – sou tomado por um impulso repentino e me levanto.
Edu se levanta comigo rapidamente.
- ei, ei, Lian, o que vai fazer? – ele coloca a mão no meu peito, a enfaixada, e noto que a mancha escura ainda suja o curativo.
Eu paro.
- eu tenho que fazer alguma coisa, Edu. Não posso deixar essas coisas saírem daqui.
Paola salta do banco e fica ao lado do irmão. Vejo Agnes vindo na minha direção também, preocupação no rosto.
- e o que você pensa que vai conseguir fazer com aquelas coisas lá fora? – ela aponta para as portas de ferro. – você mal sobreviveu! Viu do que são capazes!
Levo as mãos à minha cabeça.
- Lian, - é Agnes, ela vêm para meu lado e coloca uma mão na minha cintura. – não podemos fazer nada além de esperar virem nos resgatar.
Eu a olho de cima. Não... Aquelas coisas não podem sair daqui...
- e o que você acha que vão fazer? – pergunto – você nos garante que eles vão ser mortos também e aquelas coisas vão sair daqui para o mundo? Para nossas famílias!
Vejo quando o medo molda a expressão de todo mundo, chocados com o pensamento que até agora talvez não tinham percebido. Edu lança as mãos para o alto e se vira. Paola fita o chão com uma expressão de quase choro. Observo Agnes lentamente olhar para a irmã.
- eles não podem sair daqui. – repito – de alguma forma ainda estão aqui.
Marcelo se pronuncia.
- eles estão apenas esperando. Se abrirmos uma dessas portas vão nos matar das piores formas.
Eu olho ao redor e paro ao ver a tampa de vaso que trouxe comigo.
- mas não esperam que possamos revidar. – digo – podem ser feridas, são fortes mas podem ser feridas. O corpo humano pode ser inutilizado.
Rapidamente eu passo por eles e vou para trás da bancada, me abaixo e pego o machado. Seguro o cabo e giro a lâmina afiada.
- podemos fazer algo. Só precisamos pensar...
Minha fala é interrompida por um choro. Todos nós olhamos para o último sofá, para Dóris, chorando enquanto estende o braço na frente do corpo.
Sinto uma pontada no peito ao olhar seu braço: grossas veias negras serpenteiam de sua mão até o antebraço. A pele escura como se estivesse podre.
- eu... – ela soluça – eu não sei o que está acontecendo... – ela funga - Está ardendo!
Matthew e a mulher que ajudou com os ferimentos foram os primeiros a chegar até ela. Ele rapidamente se agachando enquanto Dóris se derramava em lágrimas.
- não pode ser. – a mulher falou enquanto se ajoelhava na frente de Dóris – eu limpei a ferida, não tem como ter infeccionado!
Dóris soltou um lamento profundo.
- está queimando! – e tornou a chorar.
A pele dela... Sinto minha tripofobia atacar e meu corpo ser tomado por náuseas.
- ah, meu Deus... – a mulher exclama quando tira o curativo. A pele ao redor da mordida está completamente negra, marcas vermelhas e gotas de sangue escorrendo imediatamente.
Várias pessoas se aproximam e eu saio de trás do balcão para ficar perto dos outros, deixo o machado em cima do balcão e passo um braço pelos ombros de Agnes. Ela rapidamente se aninha em mim, um pouco trêmula.
- o que faremos?! – Matthew pergunta, mas a mulher simplesmente passa um mão no cabelo, tensa.
- eu não sei...
Então uma voz grossa ecoa:
- corta fora!
Todos nós tomamos um susto ao se virar e ver Roger ainda deitado, os olhos bem abertos e encarando todos alí, as veias escuras agora tomavam conta de todo seu corpo, a pele também com aquele aspecto de podre, com marcas escuras salpicando todo o corpo. Ele tinha um sorriso nos lábios, grossas gotas de líquido escuro caindo de sua boca para o chão, empoçando ao redor da bochecha.
- corta fora! – ele repetiu – corta fora!
Uma risada cruel ecoou dele.
Vejo Malik se levantar do sofá e correr desesperadamente até nós, se engalfinhando nos braços de Paola. As pessoas que estavam mais afastadas fizeram o mesmo, se afastando de Roger.
Me certifiquei de que Edu estava atrás de mim no caso de querer ir até lá, eu tinha um péssimo pressentimento quando ao que Leandro havia me falado.
- ele virou uma daquelas coisas! – um homem gritou, dando voz aos meus pensamentos.
Um burburinho mesclado de choros e orações começou a ecoar pelo lugar, as pessoas empurrando umas as outras tentando colocar o máximo de distância entre Roger.
Dóris gritou, sacudindo o braço.
- queima! - ela gritou – queima!
- corta fora!
Sinto o medo começar a me invadir novamente. Meu olhar se alternando entre Dóris e o irmão.
- Dóris, precisa ficar calma. – a mulher falou, a voz calma – eu vou tentar fazer algo para aliviar isso. – ela se levantou, se afastando, e quando retornou trouxe consigo um pano úmido, que envolveu o braço de Dóris. – melhor?
Dóris soluçou, mas assentiu.
- s-sim. Um pouco.
A mulher assentiu também, um pequeno sorriso nos lábios.
- certo, tente ficar calma, vou tentar procurar algum remédio para...
- NÃO!
Roger gritou, fazendo maioria gritar com o susto. Ele agora estava com os olhos arregalados, completamente vermelhos-sangue. Ele apoiou as mãos no chão e começou a se levantar. As pessoas gritaram.
- NÃO!
Eu e os outros começamos a nos afastar, Mary surgiu ao lado da irmã, meus olhos focados nele. Com certeza era uma daquelas coisas. O sorriso deu lugar a uma careta de raiva enquanto ele girava as mãos.
- NÃO, IRMÃ. CORTA FORA! – o ódio daquelas palavras.
Edu deu um passo em frente mas eu o parei com uma mão sobre seu peito, Paola segurou os ombros dele.
- fique aqui! – ela falou, firme, encarando o irmão.
Agnes o olhou.
- não faça nada, Edu.
Edu olhou para ela por um instante, para Roger, então assentiu, mas vi seus punhos fechados, prontos para defender seus amigos. Senti algo estranho com aquela cena.
Mas então Roger começou a sacudir a cabeça violentamente enquanto falava:
- corta fora corta fora corta fora...
Ele deu um passo em frente, mas Matthew surgiu, as mãos estendidas na frente do corpo.
- Roger, cara para com isso. Olha como você está, olha o que está dizendo! – ele parou em frente à ele. Roger apenas o encarava de baixo, a boca levemente aberta, as sobrancelhas erguidas como se surpreso. – está mandando sua irmã se cortar! Você machucou ela, Roger, machucou sua irmã...
Ele deu outro passo na direção de Roger, que continuava imóvel, o observando... Como um predador. Meu corpo se retesou em antecedência com algo que poderia acontecer, como se pressentisse.
- você está mal, cara. – Matthew continuou – está machucado. Deixe eu cuidar de você.
Ele ficou em silêncio por um momento, Roger imóvel, então Matthew deu o último passo e tocou o ombro do amigo.
E no mesmo segundo Roger segurou a mão dele e girou, a quebrando. O osso estalando alto o suficiente pra ecoar pelo lugar, junto com o grito de dor de Matthew.
E o de todos nós.
Um sorriso bestial cruzou o rosto de Roger.
- você está mal, cara. – ele repetiu, a voz de zombaria. Então ele segurou o braço de Matthew, girou e o puxou com força, o arrancando fora. O grito de Matthew foi bestial. Fiquei paralisado, o ar se recusando a entrar no meu corpo mesmo quando todos começaram a gritar e me puxar para longe. Vi quando Roger balançou o braço de Matthew e disse: - está machucado. – então ele derrubou Matthew de joelhos, sangue empoçando ao redor, caindo da boca dele enquanto chorava e gritava. Roger jogou o braço dele, atingindo um espelho e o quebrando. O som de vidro se despedaçando encheu o lugar.
Senti mãos me segurarem, olhei ao redor, todos comprimidos num dos cantos do lugar. Mas quando me voltei para a cena na minha frente eu vi Roger encarando Matthew de cima. Ele segurou a cabeça do outro e se aproximou.
- deixe eu cuidar de você. – e inclinou a cabeça do outro para o lado e se aproximou, afundando os dentes no pescoço dele.
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In The Shadows - a noite dos demônios
Terrorbons DJs, pessoas sexy e tinta néon, tudo o que Lian esperou encontrar no festival da boate que frequenta. No entanto Lian não esperava que, em meio a novas amizades, iria dar de cara com demônios vindo diretamente de outra dimensão com desejo de sa...