Parte 1

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Will não gostou nem um pouco quando Jack Crawford surgiu do nada e interrompeu sua aula para convencê-lo a voltar a trabalhar como perfilador do FBI. Ele tinha certeza que a avaliação psicológica que recebeu antes de ser dispensado garantiria que não precisasse se submeter a situações que o fariam se sentir psicologicamente abalado, mas deveria ter presumido que se alguém importante requisitasse seus serviços, teria que voltar por bem ou por mal.

"Você ajudará a salvar vidas" Jack disse como se aquilo fosse a motivação que o fazia levantar da cama todos os dias, e Will acreditou nele, como um idiota, mas depois de passar meses tortuosos trabalhando ao seu lado não havia dúvidas de que ele era um grande hipócrita que buscava sucesso sucesso acima de qualquer outra coisa (por mais que nem sempre estivesse ciente disso). Pouco importava se os agentes estavam sem dormir a uma, duas ou três noites, a prioridade era sempre capturar os assassinos dia após dia, após dia, após dia, e uma hora a conta chegaria para cada um deles. Para Will, já havia chegado. Aquilo o deixou tão instável que foi literalmente proibido de voltar a trabalhar daquela forma, mas lá estava ele outra vez, caminhando em uma corda bamba metafórica na qual estava lutando com todas as forças para não cair, mas era difícil, oh era tão difícil, as pessoas não faziam a mínima ideia.

Em outras palavras: o trabalho era uma merda. Ele não devia ter ficado tão surpreso quando as alucinações e lapsos temporais começaram, aquele emprego finalmente estava ameaçando o mandar para o manicômio como tanto temia, mas torcia para que toda aquela situação fosse apenas produto do estresse e não de algo mais sério.

Como se tudo isso já não fosse o suficiente, ainda tinha uma outra coisa com o que se preocupar, algo que o deixaria facilmente desempregado se fosse descoberto. Ele era fã do Estripador de Chesapeake.

Talvez "fã" não fosse a melhor palavra para definir o que sentia, aquilo não era apenas admiração, era obsessão, e estava ficando mais forte.

Will nem sempre foi assim, mentalmente instável e propenso a enfiar uma faca no pescoço de alguém. Ele ainda lembrava de quando era uma pessoa comum com senso de justiça forte e íntegro e repudiava todos os assassinos como se fossem o pior mal do mundo, mas tudo mudou quando se deparou com uma das artes do Estripador de Chesapeake em uma das aulas da faculdade. Os professores geralmente usavam aqueles casos para assustar os alunos, mas ao invés de aterrorizar Will apenas o deixou encantando; usar sua empatia para analisar melhor o que estava vendo foi o pior erro que havia cometido.

Aquele foi um verdadeiro divisor de águas em sua vida.

Sua empatia permitia que entrasse na cabeça dos assassinos como se estivesse na pele deles, que pensasse como eles e sentisse o que sentiam no momento em que tiravam vidas; as razões egoístas e fúteis que geralmente os motivaram a chegar até ali. O Estripador de Chesapeake, no entanto, era diferente de qualquer outra pessoa com quem tenha se deparado, o Estripador não era apenas um assassino, e sim um artista. Um artista incompreendido e vaidoso que gostava de expor suas artes para o mundo para que pudesse ser elogiado ou repudiado pelo público que as via. Seu ego era enorme, mas Will não podia culpá-lo.

Fosse quem fosse, aquela pessoa elevava as cascas vazias dos porcos que a ocupavam a verdadeiras obras de arte, incompreensíveis e aterrorizantes para a maioria das pessoas, mas bela para os olhos de Will, que se sentia cada vez mais inspirado por seu trabalho meticuloso. Will admirava tanto seu trabalho que estudou exaustivamente cada uma das obras de arte que havia exposto e até descobriu que antes de ser famoso nos Estados Unidos já tinha feito vítimas na Itália e era conhecido como Il Mostro, o que o fez se sentir muito orgulhoso de si mesmo e muito mais perto de descobrir quem aquela pessoa que o FBI presumia ser um homem era. Ele não pensaria duas vezes antes de matar quem fosse necessário se isso significasse que poderia conversar com o Estripador pelo menos uma vez na vida, e foi aí que o problema começou.

Um Acidente (In)feliz - HannigramOnde histórias criam vida. Descubra agora