É incrível como o humor de uma pessoa pode mudar de uma forma tão brusca em um tempo consideravelmente curto.
Eu até que acordei com um humor ok, um pouco enjoada por conta da quantidade exorbitante de pizza de queijo que comi na noite anterior, mas nada que um chá de camomila feito por Trixie e um tempo respirando o ar fresco de uma manhã gélida em Providence não resolvessem.
Entretanto, conforme o dia avançou no relógio e eu fui interagindo com o restante da sociedade, lidando com colegas de turma insuportáveis e a lentidão insana do setor responsável pela documentação da formatura, eu senti o que restou do pouco humor ok que havia em mim ao acordar ir embora.
No fim da tarde, eu já estava no nível de sequer me suportar.
— Eu acho que vou ter que desenhar para aquela mulher da secretaria entender que eu JÁ entreguei o maldito comprovante da minha bolsa! — resfoleguei com o azedume escorrendo do meu timbre, me jogando na mesa do refeitório tumultuado da RISD.
Por um segundo, voltei no tempo e me senti ainda no colégio, me enfiando por entre as pessoas esfomeadas e cheias de energia até encontrar a mesa que Isla conseguira e me jogar nela, pronta para ouvir a minha amiga divagar sobre sua leitura atual ou qualquer outra coisa que abarcasse o universo romântico.
Pensar em Isla me deixou triste, porque eu estava com uma saudade tremenda dela. E do meu irmão. E do meu pai. E de Olívia, que vivia quase que em dois estados ao mesmo tempo, com o namorado em um e o trabalho em outro. E de Jason.
Céus, eu estava com tanta saudade de todo mundo que doía no meu peito. Doía de verdade.
— Annelise, você está chorando?! — a voz assustada de Trixie me puxou para o presente. Eu pisquei, retomando a consciência, e a olhei, me sentindo perdida. A loira tinha as feições curvadas em um misto de confusão e preocupação. — Você acabou de chegar soltando fumaça pelos ouvidos e agora está... está chorando?
Ela expeliu a última palavra com uma incredulidade genuína.
— Eu não estou chorando — funguei, notando o quão embargada soou a voz, refutando minha própria fala. — Talvez, só um pouquinho...
— Mas, por que?
Boa pergunta. Por que?
Ao seu lado, Neelan fechou o livro que lia e se voltou para mim, imitando a feição da gêmea.
— Porque estou com saudades da minha família. — Eu esfreguei o punho no nariz, o enxugando. Em minhas bochechas, algumas lágrimas rolaram sem autorização. — E porque estou estressada com a mulher da secretaria, que fica me infernizando com o comprovante da bolsa que eu JÁ ENTREGUEI. E com Bill Stuart também, que fala "né" a cada respirada e fez o favor de aparecer de ressaca para apresentar o maldito trabalho, me obrigando a ter que explicar a parte infame dele. E com a prova da semana que vem, onde o professor Donovan teve a diabólica ideia de cobrar coisas que aprendemos no primeiro ano da faculdade! E porque eu estou com sono! E enjoada! E... e sei lá, só me deu vontade de chorar! — bradei, tornando a me irritar. — Eu sou um ser humano livre, tenho o direito inato de chorar!
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Apostando em Nós
Teen FictionQuais as chances de um relacionamento que começou com um "falso" em seu nome, teve o "sim" dito sob domínio do álcool e, por fim, universidades em polos distintos do país ocupando o espaço entre seus dois corpos logo em seus primeiros anos, perdure...