Os ouvidos do velho ainda zumbiam e o cheiro de fumaça pairava no ar. Podia sentir a poeira grudada em seu rosto suado, ainda sem entender o que diabos havia acontecido. A visão turva gradualmente se ajustou à penumbra, revelando destroços e fragmentos de objetos pelo chão, iluminados apenas pelo débil feixe de luz solar que adentrava o ambiente sabe-se lá por onde.
Ele estava sentado no assoalho de madeira com as costas apoiadas no que um dia fora a parede do escritório. Correu os olhos ao redor e constatou que nenhum móvel havia sobrevivido ao que quer que tivesse acontecido. A exceção foi um grande cofre caído à sua frente. E atrás dele, o corpo do senhor Waltz jogado no chão. Estava vivo.
Vozes vinham de fora e um sem-fim de "cracs" e "crecs" saiam das paredes e do teto. O homem tentou puxar da memória o que acontecera, mas a cabeça não ajudava. Finalmente pousou os olhos na perna esquerda e de repente a costela fraturada no dia anterior já não doía tanto assim. "Droga," pensou.
Algum tempo se passou até que o senhor Waltz abrisse os olhos e mais uns minutos até que recuperasse as capacidades. "Os idiotas instalaram os tanques de combustível ao lado dos escritórios!" Foi o que disse, mas logo se arrependeu do tom e se retratou com pesar: "Iríamos começar a mudança hoje..."
"Neste caso," murmurou o velho, "acho que os homens vão ter o dia de folga." Pedro olhou para ele surpreso. Talvez fosse o desespero da situação ou talvez o fato de nenhum deles esperar aquela dose de humor, mas os dois começam a rir. Contidos, no início, mas gradualmente as risadas se tornaram gargalhadas. Riram tanto que precisaram secar as lágrimas em seus olhos e, da mesma forma como começou, a risada cessou subitamente.
Foi o silêncio que se seguiu que os trouxe de volta à realidade: estavam presos nos destroços de uma explosão e suas vidas estavam em risco. "Você está bem?" Pedro perguntou. O velho fez que sim com a cabeça, mas ambos sabiam que não estava. "Os homens já devem ter acionado os bombeiros," o engenheiro disse, "devem estar retirando os escombros à procura de sobreviventes. Fique tranquilo, vão nos achar."
Pedro se levantou com calma, ainda não sabia se o corpo sofrera alguma fratura. Começou a avaliar cuidadosamente seu entorno. Os destroços e fragmentos testemunhavam a intensidade da explosão que o havia enclausurado ali. A fraca luminosidade o obrigou a usar as mãos para analisar as paredes rachadas. Sentiu seu peito apertar ao constatar que as rotas de fuga estavam bloqueadas por uma montanha frágil de escombros. CREC. O som fez a espinha gelar.
"O que o fez mudar de ideia?" O velho perguntou, tomando a atenção Pedro. "Sobre Chico, por que desistiu do acordo?" complementou a pergunta. O engenheiro fez uma longa pausa para escolher as palavras certas. A verdade é que ele mesmo não sabia descrever o real motivo. Tomara a decisão de cancelar o acordo apenas quando o velho entrara em seu escritório naquela manhã. "É uma longa história," disse por fim. E o velho respondeu apontando para a perna: "Não vou a lugar algum".
Pedro olhou para perna do homem e sentiu náuseas. Um lasco grande de madeira se desprendeu de um dos móveis na explosão e encontrou seu lugar enfincado na carne do velho. Havia muito sangue e era difícil de olhar. O engenheiro voltou sua atenção para os escombros e decidiu contar sua história. Falou de Charlie, do pai e de como fora "convencido" a virar engenheiro. Falou de como se sentiu — e ainda sentia — e também da dor que viu nos olhos do velho no dia anterior. Falou que não era homem de voltar atrás na palavra, mas não achava certo comprar Chico. E o velho ouviu com atenção e ponderou cada detalhe.
Por um tempo o espaço foi preenchido apenas pelos sons abafados que escapavam das paredes destruídas. A história contada ainda ecoava na mente do velho e no coração do engenheiro. A quietude pesava sobre eles, carregando reflexões e incerteza. "Acho que seu pai é um bom homem," o velho quebrou o silêncio. Pedro ofegou com ironia: "Um encanto."