— Não vão mais nos deixar jogar, Miya.
A primeira semana de setembro mal havia terminado quando o capitão do time de vôlei e um dos meus melhores amigos, Sawamura Daichi, veio conversar comigo sobre a decisão do diretor.
— Como assim?
Estávamos na cantina aguardando nossa vez de pegar as bandejas do almoço. O lugar estava cheio de estudantes barulhentos que falavam demasiadamente alto, sem se importar em incomodar aos outros. Eu e Daichi éramos dois deles.
— É isso mesmo. O diretor conversou com o treinador para diminuir nossa frequência de participação nos treinos e nos campeonatos. Parece que, como já passamos da quantidade de horas mínimas exigidas no clube, devemos nos concentrar em estudar e passar na faculdade. Palavras dele.
Nossa escola nunca foi muito forte em termos acadêmicos. Na verdade, não era forte em termo algum.
O colégio Gouru era uma construção velha. Não, não direi antiga quando, se o fizesse, faria apenas por motivos estéticamente literários. O antigo guarda uma beleza poética, quase mística, e isso jamais seria capaz de descrever nosso colégio de ensino médio. A pintura do exterior descascava, não tinha ventiladores e os materiais disponíveis para uso dos estudantes estavam, em sua maioria, quebrados. Quando não estavam quebrados, era porque simplesmente não existiam.
A localização também não ajudava, pois era próxima a uma usina de origem duvidosa, cuja produção nunca entendemos do que se tratava. Apesar disso, os alunos eram felizes lá. Alguns de nós passávamos o dia todo na escola, tínhamos uma quantidade interessante de aulas vagas por semana e as atividades dos clubes aconteciam mais do que era permitido. Gouru não existe mais. Às vezes acho que nunca existiu.
— Esse velho 'tá tentando tirar a escola da merda só agora? — perguntei, enquanto caminhava atrás dele. — Ele tinha que começar essas mudanças ano que vem. Ele 'tá acabando com os nossos esquemas. — Quando falava assim com adultos, costumava levar algumas surras.
Pegamos cada um uma bandeja e um par de hashis. A fila caminhava lentamente conforme as mesas iam se enchendo de alunos das poucas turmas de ensino médio. Eu costumava levar bentôs, mas, desde que Osamu começou a trabalhar, parou de montar para mim. E eu tinha preguiça de fazer os meus.
— Cuidado, quer que te ouçam? — O capitão me deu um tapa na cabeça. Às vezes eu esquecia que ele agia como adulto.
Sawamura características que o colocavam patamares acima de mim e dos outros. Ele sempre foi muito inteligente, generoso, simpático e extremamente dedicado em tudo o que fazia. Os olhos pareciam sempre cansados, prestes a se fecharem a qualquer momento. Eu costumava dizê-lo a ele, mas o capitão apenas ria e respondia que uma boa noite de sono ajudaria, que no dia seguinte estaria melhor.
No dia seguinte, nada mudava. Ele estava sempre igual e eu nunca pude fazer muito por ele. Não somos mais amigos hoje em dia.
— Enfim, não há o que fazer. Já tá decidido. Tô treinando aquele garoto do penúltimo ano para ser o novo capitão, o Ennoshita. Ele parece ansioso e disposto. — Daichi suspirou e estendeu sua bandeja para a tia, que deu-lhe uma porção generosa de arroz. — Obrigado. Tenha um bom dia. — ela sorriu para ele, que curvou-se antes de sair da fila.
Virei-me para ela enquanto estendia a bandeja. A senhora não sorria mais. Ela preencheu metade da concha com arroz e colocou de qualquer jeito em minha bandeja.
Aquela tia vivia carrancuda comigo.
Sentei-me com Daichi e os garotos do time em uma mesa próxima à porta de saída. O refeitório enchia-se cada vez mais em um ambiente claustrofóbico e quente, já que o outono ainda se preparava para nos agraciar com seus céus revigorantes e ar puro.
— A partir da semana que vem participaremos apenas de um dos treinos semanais. Isso, claro, para quem quiser continuar no time, já que não precisamos mais. — o capitão falava se direcionando a mim, já que os outros membros já tinham consciência da mudança.
Saber que eu não participaria dos treinos e dos campeonatos por obrigação externa me irritava. Nunca achei justo que os adultos simplesmente decidissem o que era melhor para nós. Eles nunca nos perguntavam o que pensávamos.
Eles mesmos pareciam não saber o que pensar, às vezes.
— 'Cê errou. Não é que não precisamos, não podemos. — me senti frustrado com a mudança. — Nem vale a pena ir em uma porcaria de treino por semana. — respondi. Com o canto do olho, vi Kageyama Tobio me olhando enquanto conversava com Hinata Shoyo. — Que porra, onde eles 'tão com a cabeça?!
Os garotos do time engataram em uma conversa que não é digna de ser relembrada, em respeito aos mais novos que lêem minha história.
Peço desculpas antecipadas pelos palavrões.
Naquela quinta-feira eu me perguntava como se sucederia a entrevista de emprego que eu tinha marcada para a tarde. Acontece que minha aparência não me ajudara muito nas últimas entrevistas que havia feito até o momento, já que, assim que abria a boca e começava a falar, os avaliadores torciam o nariz em desgosto.
Adultos não costumavam gostar muito de como eu falava.
Todas as vagas às quais concorri eram de empregos comuns para jovens da minha idade, como caixa de supermercado, garçom, ajudante de lojista ou qualquer um que não exigisse ensino médio completo e graduação. O trabalho da entrevista daquele dia, entretanto, não era bem algo normal. Era a entrevista do serviço ao qual meu pai me indicara.
Aparentemente, um de seus superiores, Ushijima Wakatoshi, tinha um primo que buscava uma companhia para as tardes solitárias. À princípio não me interessei muito, me senti desconfiado até, embora a proximidade relativa com o emprego do meu pai.
Mas isso mudou quando fiquei a par do salário.
Eu precisava do dinheiro, não tinha porque não arriscar. Naquela época eu poderia ter seguido minha intuição, poderia ter suspeitado um pouco mais e poupado muitas mágoas, mas não o fiz.
Eu não me arrependo de nada.
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NOTAS FINAIS: heeeyyyyy já postando hoje mesmo, eu talvez me arrependa depois por estar sendo ansioso, mas eu realmente amo essa fic. Me dediquei muito a ela.
Pretendo postar o capítulo 2 no domingo ou, no máximo, até quarta. Como a fic já está toda escrita não tem pq ficar enrolando, certo?
Espero que vocês a amem tanto quanto eu, que ela te emocione tanto quanto me emocionou.
Se cuidem, perebas.
Com carinho, Rony.
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o tempo que (não) tivemos | atsukita
Fanfictionshort fic // 1978. Miya Atsumu tem seis meses para amar Kita Shinsuke. "Lembro-me perfeitamente de como meu pai chegou em casa do serviço, ansioso e suando, em uma das noites mais quentes daquele verão, dizendo que tinha encontrado uma oportunidade...