Com amor e com coragem

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“Mas saiba que dói quando a loucura passa. A lucidez é jaula.”

- Carla Madeira


O que é a vida senão um aglomerado de não-saberes? Quem imaginaria que os corredores do Congresso Nacional se tornariam testemunhas silenciosas de encontros casuais, olhares furtivos e sorrisos discretos? O relacionamento de Soraya e Simone desabrochou como uma flor rara em meio ao asfalto frio da política. Entre agendas tumultuadas, debates acalorados e compromissos públicos. E nesse mesmo asfalto frio estaria marcado as tentativas de pavimentar esse amor improvável após um momento único que marcaria suas vidas para sempre.

Soraya se virou na cama espalmando o lado oposto, mas encontrou somente o lençol esticado e frio pela temperatura baixa que fazia aquela manhã. Relutou em levantar, mas seu corpo sentia falta de algo. Não sabia dizer se era café ou Simone. Calçou os chinelos ainda bamba e vestiu o hobby amarrando apertado na cintura. O tecido fino lhe abraçou imediatamente o corpo arrepiado, lhe trazendo um pequeno conforto. Fez sua higiene matinal e seguiu para a sala, já agoniada com aquele excesso de silêncio. Sabia que Simone era uma mulher silenciosa, diferente dela, que falava pelos cotovelos. Ás vezes se reprimia mentalmente por ter a língua tão solta.

- Me-eu be-em? – Chamou entre um bocejo longo, ajeitando os cabelos desajeitados.

- Oi, amor? – Simone respondeu breve, denunciando que a voz vinha do escritório.

- Simone, hoje é domingo. – A mulher mais baixa resmungou encostada na porta, com um bico torto.

A ministra sorriu com a cena adorável. Soraya com os olhos ainda inchadinhos de sono, os lábios rosados pela quentura do café recém-tomado, o corpo, uma escultura, sendo moldado pelo hobby branco de seda com bordas rendadas, os pés delicados em um chinelo com pequenas pedrarias e estampa de oncinha – a cara dela, diga-se de passagem – Simone jamais se cansaria de admirá-la em toda e qualquer instância. Valeria a pena ter o mundo caindo sobre sua cabeça se fosse para ter sempre a chance de ter seus olhos pousados nela.

- Eu sei, meu bem. Mas acabei acordando muito cedo e aproveitei para revisar alguns documentos de acordo internacional. – A Ministra virou-se na cadeira enquanto falava, vendo a mulher desfazer a cara de brava aos poucos e caminhar lentamente até ela. – Vem cá dar meu beijo de bom dia, vem?

- Só se você prometer que iremos fazer qualquer outra coisa hoje que não seja trabalhar. Quero aproveitar o dia com você. – Soraya se achegou pertinho do braço de Simone, que não tardou em lhe tomar pela cintura e a puxar para seu colo em um abraço de lado.

- Tudo que você quiser. – Disse em um tom suave, deslizando o dorso da mão pela bochecha de sua mulher. – Mas primeiro, o meu beijo. – A loira sorriu doce e logo tratou de selar seus lábios em um beijo terno, carinhoso e suave. Beijo com gosto de lar. Beijo com sabor de amor. 

- Só assim pra eu tomar café mesmo. – A senadora riu perante o comentário, sempre evitava beijar a mulher após tomar a bebida amarga, mas acabou se esquecendo diante da vontade, sempre dominadora, de lhe tomar a boca em um beijo.

- Desculpa, minha branquinha. Esqueci que tinha tomado. – Fez um bico adorável, que Simone capturou em um selinho.

- Nos seus lábios o gosto é divino. – Permaneceram em silêncio algum tempo. Tempo que era sempre somente delas. Tempo que parecia sempre parar por elas.

- Simone... Você já pegou o celular hoje? – A Senadora sussurrou na curva do pescoço alvo.

- Não. E não sei se quero. Sei que devem ter milhares de notícias tendenciosas. E-mails, ligações, áudios... E eu não estou a fim de estragar a minha manhã de domingo ao lado da minha esposa. Vamos sentar juntas, tomar café da manhã, conversar sobre nós e nossa vida daqui pra frente, depois enfrentamos o que quer que tenhamos de enfrentar.

Todos Os Dias Depois De VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora