“E depois, como tudo, o medo desapareceu, e você também
foi desaparecendo junto com ele.”
- Elena, de Petra Costa
Dizem que depois da tormenta vem a calmaria, mas e depois dela? O que é que fica diante de nós perante o caos que precede a paz e supõe outra guerra? O que é que nos resta quando a calmaria se esvai por entre os dedos e se esgota como um pingo de chuva num chão árido? Talvez Simone descubra mais rápido e dolorosamente do que gostaria que o sentimento que sucede a calmaria é como um rio lento que corre silencioso, mas implacável, levando consigo pedaços de serenidade. Começa com um aperto no peito, um suspiro mais longo, um olhar perdido no vazio. E então, quando menos se espera, ele se instala...
Tebet se vestia para mais um dia de trabalho no Ministério, optou por um conjunto de calça de alfaiataria sob medida e uma blusa no mesmo tecido, ambos na cor marsala. Os cabelos estavam escovados e caiam sobre os ombros, ressaltando a pele clara e levemente maquiada. Nos pés, um mocassim preto, dos tantos que ela adorava usar. Recolheu a bolsa que estava na cama e parou próxima a porta, esperando pela mulher que finalizava os últimos retoques da própria maquiagem.
Era finalmente momento de Soraya retornar ao trabalho, a insegurança cerceava seus corações, mas ela já não conseguia mais se sentir presa, refém de pessoas que não deveriam ter poder sobre sua vida. Decidida, bateu o pé e afirmou para Simone que voltaria ao trabalho naquela segunda-feira. Sem chances de mais negociações, Tebet apenas calou-se e assentiu, ainda que a contragosto. Sabia que mantê-la em casa era uma medida um tanto quanto drástica, mas só podia pensar na segurança de sua futura esposa.
- Soraya, vamos nos atrasar, meu bem. Você está linda, assim como nas outras dez peças de roupa que vestiu.
- Mas ó Simone, você não me torra a paciência logo cedo não, viu. Tô nervosa, hein! – Disse a loira enquanto ajustava o batom aos lábios.
- Mai o que foi que eu fiz? – Disse em um tom dengoso.
- Nada, Simone. Nada. Espera lá na sala que já, já eu desço. – A morena apenas concordou com um suspiro e dirigiu-se em direção à sala. Tomou uma xícara de chá, sentou-se em sua poltrona e folheou uma revista, pegou o celular na bolsa e passeou pelas redes sociais desejando bom dia a alguns seguidores no twitter e quando o cansaço lhe venceu, ia gritar Soraya para se apressar, mas a loira foi mais rápida, apareceu logo no topo da escada, deslumbrante, em um conjunto de calça e blazer sem mangas, ambos brancos; por dentro, uma camisa cor creme contrastando com as madeixas douradas e nós pés os saltos que ela nunca abandonava. Diferente da braveza anterior, estava com um sorriso enorme nos lábios. Ao chegar próximo de Simone, deu uma meia volta e abriu os braços:
- E aí? Ficou bom?
- Uma princesa! Como sempre, meu bem. – Simone sorriu docemente e inclinou-se para um beijo breve nos lábios da mais baixa. – Agora vamos, estamos atrasadas.
- Ainda bem que Deus mandou uma mulher paciente pra mim. Equilíbrio é tudo, né?
- Eu que o diga... – Sussurrou Simone enquanto entravam no carro.
(...)
Soraya parecia tão calma ao meu lado, era a primeira vez que sairíamos de casa juntas após o trágico ocorrido. Minhas pernas tremiam, mas eu tentava firmá-las para não perder o controle conduzindo o carro e causar outra tragédia. As mãos suavam como nunca antes e o peito batia descompassado em um ritmo estranho que chegava a doer. Eu só queria dar meia volta com aquele carro e voltar pra casa com ela, saber que ali estaria tudo bem. Mas não posso fingir que fora do nosso apartamento não há vida também.
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Todos Os Dias Depois De Você
FanfictionDe todos os dias que tive ao seu lado, em nenhum fui capaz de te sublimar, apenas renunciei. Renunciei até que você me escapasse entre os dedos, até que não fosse mais possível saber o que teria sido daquilo que não fomos. E agora, todos os dias dep...