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[Simone Tebet Pov on]

Antes de chamar o elevador, vejo o mesmo se abrindo e Janja saindo de dentro dele com um sorriso de orelha a orelha.

- Olá senhora, quanto tempo. Fico feliz em ver você. Vamos subir?

- Pode me chamar pelo nome Janja. Vamos subir sim. - sorrio para ela e entro na caixa de metal.

- Como foi a sua vinda pra cá? - ela pergunta apertando o 12º andar.

- Foi tranquila, tirando a parte que dei de cara com uma louca no estacionamento. Precisamos aumentar a segurança da empresa, não podemos deixar que qualquer um entre.

- Como assim dona Simone? Era uma loira? - ela me olha confusa.

- Loira, baixinha, abusada e muito da cafona. É ela mesma. - reviro meus olhos só de lembrar da mulher me afrontando.

- Ela veio aqui a semana toda, deixando seu currículo conosco. Se quiser, peço para triturarem os papéis que ela vem deixando na recepção.

- Não, eu quero que você me providencie um currículo dela. Quero saber o nome dessa afrontosa. E não conte isso para ninguém.

- Pode deixar. - ela sorri de lado.

(...)

Sai da empresa, deixei tudo do jeito que papai gostava e ajustei algumas coisas que estavam fora de ordem. Fiz uma breve reunião com os funcionários avisando que agora estou de frente nos negócios, Carlos César um dos acionistas de papai veio me dar as boas vindas na empresa. Não vou muito com a cara dele, mas como esse cara tem uma porcentagem mínima da empresa trato ele de forma totalmente profissional.

Peguei novamente o elevador e desci até o estacionamento, olhei a hora no meu celular e já marcava 18:00 da noite. Observei que a queda de mais cedo trincou a tela dele, e deixou algumas marcas na lateral. Segui pro meu carro e entrei no mesmo, joguei minha bolsa no banco de trás e coloquei meu sinto.
Sai pela guarita e vi que os seguranças estavam de prontidão dessa vez e dei uma leve buzinada para eles.

Dobrei a rua da empresa e segui reto, sabia que ali tinha uma rua que dava para Avenida Paulista. E eu precisava pegar essa avenida para ir pra casa, o sinal fechou e meu carro era o primeiro na fileira. Vejo uma mulher colocando balas nos retrovisores dos carros que estavam atrás de mim, mas como a rua não tinha muita iluminação não prestei muita atenção. Assim que ela se aproximou do meu carro, observei ela por dentro, era a mesma moça de hoje cedo. Com um semblante agora de exausta, agora de cabelos presos carregando uma caixinha de papelão com suas balas dentro. Ela não conseguia ver quem estava dirigindo, por conta do vidro que era escuro, assim que ela colocou o pacote de balas no meu retrovisor, abaixei o vidro dando um susto nela.

- Você? - ela me olha.

- Quanto é o pacote dessas balas? - pego o pacote que estava no meu retrovisor 

- Não é nada, fica como um pedido de desculpas de mais cedo - ela força um sorriso cansado.

- Não, esse é seu trabalho. Nada mais justo do que pagar.

- Eles são quatro e cinquenta. Vem quinze balas no saquinho.

Concordo com a cabeça e pego minha bolsa no banco de trás, pegando duas notas de duzentos e entregando para ela.

- Tome, vai comer alguma coisa. Já está tarde e aqui é perigoso nesse horário.

- Não preciso disso tudo senhora, quero apenas os quatro e cinquenta. - ela disse sendo interrompida pelas buzinas, o sinal tinha aberto e eu nem me liguei. A loira corre recolhendo os pacotes de balas dos carros que estavam atrás de mim, e eu aproveito para jogar meu carro na calçada esperando por ela. Levanto meus vidros enquanto espero. Logo escuto duas batidas no mesmo e vejo que era ela novamente e desço os vidros.

- Então senhora, conseguiu meu dinheiro?

- Já falei para aceitar esse dinheiro, você se alimentou hoje? - falo observando o quão magra ela era, e observo seus braços finos.

- Não. Quero deixar claro que só vou aceitar o dinheiro, por que realmente estou precisando muito.

- Onde você mora? Vou te levar em casa. Entra no carro. - seria loucura oque estou fazendo agora? Óbvio! Ela poderia muito bem ser uma louca, mulher de bandido. Ou uma criminosa. Papai com certeza me mataria se visse essa cena.

- Não tenho casa, digo. Eu tenho, mas é melhor eu ir sozinha. - ela gagueja e vejo que realmente ela não tem casa. Arqueio minha sobrancelha e pego o papel que Janja me entregou antes de ir embora. Leio ele rapidamente e vejo o nome dela.

- Anda Soraya, entre. Levarei você até sua casa, tenho o endereço aqui no seu currículo. - balanço o papel e vejo ela se dando por vencida. Dando a volta no veículo, destravo a porta e ela entra de forma acanhada observando o carro por dentro.

- Nossa. Ele é muito bonito por dentro. - ela diz vidrada nos detalhes do painel

- Obrigada. Esse carro é o meu xodó. - dou a partida. - coloque o sinto por favor.  - peço e logo ela faz. -

- Então, está a quanto tempo procurando um emprego? - pergunto sem tirar o olhar da direção.

- Acho que minha vida inteira, trabalhei uma vez como auxiliar de limpeza de um hospital. Mas como minha mãe ficou doente, tive de sair para cuidar dela.

- Mora sozinha? - olho de relance para ela.

- Atualmente sim, minha mãe morreu faz alguns meses. Nesse meio tempo eu já vendia balas na rua, mas o dinheiro era todo para as medicações dela e o pouco que sobrava era para comida.

- Imagino que seja difícil essa situação, perdi meu pai faz três meses. Ainda não sei lidar com a vida sem ele, mas tenho uma rede de apoio boa ao meu lado. E você, lhe conheci hoje e me comovi com sua história, amanhã às oito pode ir lá na empresa e procurar por mim.

- Não quero que tenha pena ou me contrate por causa da minha história, me desculpa. Mas qual é o seu nome mesmo?

- Simone. - paro no sinal e encaro ela.

- Então Simone, não vou aceitar sua ajuda. Você já está fazendo demais por mim, sempre me virei para conseguir pagar o aluguel e comprar minha comida. Hoje cedo você me humilhou, pode deixar que não levei pro coração, mas não irei aceitar. Obrigada.

- Bom. Desculpa por hoje cedo, mas se você mudar de ideia, deixarei seu nome com a minha assistente. - acelero o carro quando vejo que o sinal abriu e viro em uma esquina.

- Pode me deixar aqui, chegamos. - ela fala tirando o cinto.

- Qual é sua casa?

Observo as casas bem humildes e ela aponta para uma kitnet, bem pequena. Acho que se tiver três cômodos é muito. E paro o carro bem próximo.

- Obrigada mais uma vez, e tenha uma boa noite. - ela sorri e sai do carro rapidamente, espero ela entrar dentro de casa e saio dali. Pensando em como eu sempre cresci tendo tudo, enquanto outras pessoas tinham que lutar parar sobreviver todos os dias.

Se essa moça for mais nova do que eu um ano é muito, e mesmo assim quem olhar bem achará que será mais velha por conta das suas marcas de expressões fortes em seu rosto.

Império Nassar - SimorayaOnde histórias criam vida. Descubra agora