Aurim Emerald

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 O plano de Aurim Emerald começara no dia em que chegara àquele mundo.

Chamavam-no, desde então e erroneamente, de Morte. Mas ele não era uma mera personificação do fim das criaturas vivas, ele era algo, conforme gostava de dizer em sua modéstia, menos fatalista.

Diria, ademais, sobre si mesmo, que era um estudioso dedicado. E por sua grande capacidade de observação, no curso de seus experimentos através de diversos mundos, achara um que lhe pareceu bastante intrigante.

Aldoren, um mundo que não era dividido por nações ou facções políticas, como tantos outros que vira através da dispersão. Por isso, ele pensou que, em razão da peculiar condição desse mundo, talvez fosse conveniente conhecê-lo mais de perto. E ele veio.

De onde? Quem saberia dizer? Ele mesmo se atribuía o título de ladrão divino, isso, no entanto, podia ser um expediente que usava para causar a admiração dos humanos ou para seu próprio divertimento.

Era um ser alado. Um ser estranho à Aldoren. Uma aberração do ponto de vista dos homens. E se divertia de eles serem fracos e limitados intelectualmente.

Seu poder ‒ um poder que, para ele, nada era senão que um instrumento para sua ciência ‒ era o de reter a anima dos espécimes que pretendia analisar.

O termo anima não pertencia ao mundo de Aldoren e contar sua origem nesse momento seria demasiado enfadonho, além de desnecessário. Para resumir, diremos que a anima é a energia vital dos seres vivos, aquilo que os mantém em atividade.

Obviamente que a metodologia de pesquisa de Aurim, tão pouco ortodoxa, causava a morte imediata de seus espécimes. Mas como é que ele, um grande pesquisador chegaria a conclusões satisfatórias, se não analisasse com cuidado as amostras que tinha a sua disposição?

De fato, não encontrou ali o que imaginava encontrar no que respeitava à política, mas viu que o bizarro sistema que governava Aldoren em uma paz perpétua se sustentava graças a um poder misterioso que se perdera no passado daquele mundo...

Mas dizer que o poder se perdera, como os íncolas de Aldoren costumavam afirmar, não passava de uma leviandade para alguém tão rigoroso nas suas considerações como era Aurim Emerald.

Por isso, desejara se apossar do conhecimento que possibilitasse reproduzir novamente o poder do monte Ethron, como o chamavam os habitantes de Aldoren.

Foi assim que decidiu ele mesmo se aproximar do Imperador.

*

E diante "daquela coisa", mesmo o impassível Aurim Emerald não pode conter seu espanto.

O Imperador, ou seja, aquilo que governava toda Aldoren em uma grande era de paz, não passava de um livro, um antigo e volumoso tomo de aspecto peculiar.

Mas não se tratava de um mero livro. Regra sobre regra, tudo aquilo que servia de modelo ou que fundamentava todas as coisas, desde um reles machado de pedra até a complexa estrutura dos corpos humanos, tudo estava minuciosamente descrito nas páginas do livro.

E todas as inúmeras injunções ali contidas se subordinavam ao trino princípio da existência: Unicidade, Vassalagem e Perpetuidade.

Os quais não eram estranhos diante do vasto conhecimento de Aurim, mas, naquele mundo, ele pode observar o que acontece quando alguém decide aplicar este conhecimento em um nível extremo.

De fato, involuntariamente, Aurim fora levado não só a uma descoberta interessante, mas percebeu que era justamente aquilo que precisava para se tornar o mais sábio de toda dispersão.

O livro mesmo não trazia nada que o impressionasse em seu conteúdo, a não ser o fato de se tratar de um livro e este livro reter poder para se impor como princípio regulador de um mundo. Esse fato intrigante apontava naturalmente para aquilo que se dizia sua origem, justamente a força que poderia rivalizar com o próprio Imperador: o chamado poder de Ethron.

Era essa a lacuna que havia no amplo conhecimento de Aurim, por isso decidiu encontrar a última pessoa que teve acesso àquele misterioso poder: o famoso desertor do Império conhecido como Asan Gorid. E então moveu as peças para que a casa imperial de Aldoren, isto é, os Sínodo dos Leitores se convencesse de que deveria patrocinar a expedição até a longínqua vila de Tarus, no sudoeste do mundo, para trazê-lo a sua presença.  

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