𝕯𝖊𝖘𝖙𝖎𝖓𝖔

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"Ainda bem que deu certo", penso comigo mesmo, após Rebecca chegar em casa. "Tenho que me desfazer de toda a minha vida. Tenho que recomeçar do zero e ir para um lugar que não seja tão movimentado. Não vou poder me despedir da Kate... só espero que ela entenda que foi necessário. Mas que droga! Se pelo menos eu conseguisse controlar a droga dessa maldição!"
Fico quieto por um bom tempo, apenas sentindo a água cair sobre minha cabeça enquanto aproveito aquele momento de paz, que parecia ser o último.
"Eu acho que deveria agradecer à Rebecca por esse favor. Acho que se não fosse por ela, eu estaria ferrado." Desligo o chuveiro e pego a toalha que ela havia deixado para mim. Enquanto me secava, acabo me lembrando das palavras do Oráculo: para eu sempre me lembrar que eu deveria controlar o meu "dom", e não o contrário. Olho fixamente para minhas mãos e sinto algo estranho; pego a toalha e sinto como se elas estivessem vibrando. Mas não na parte externa, e sim nos meus tendões, ossos e músculos.
"Caralho! Que dor é essa?", penso, quase alto, enquanto sinto uma dor dentro da minha mão, como se ela fosse explodir. Aperto a toalha com toda minha força; minha visão esta escurecendo. "Merda!", falo comigo mesmo. "Preciso chamar a Rebecca." Tento chegar até a porta, mas acabo caindo dentro do banheiro.
"-Hunter? Hunter!", ouço a voz da Rebecca, que abre a porta, e vejo seu rosto completamente assustado.
"Ah... Que dor de cabeça é essa? Onde eu estou?" Abro os olhos lentamente e vejo um lugar completamente destruído, coberto por fogo e muita fumaça, no qual eu não conseguia ver mais que 5 metros na minha frente. "Que merda é essa?"
"-Olá, Hunter. Já fazia tempo que eu queria conversar com você e ver a pessoa que você se tornou."
"-Quem é você? Só não vem dizer que é meu pai", digo, em um tom sarcástico, mas com medo.
"-Seu pai?" A pessoa desconhecida solta um sorriso de canto. "Não sou seu pai, apesar de conhecer ele muito bem também", diz ele, andando em passos curtos em minha direção.
"-E quem é você? Por acaso seria algum tipo de visão?"
"-Acho que você está indo longe demais." Diz a pessoa desconhecida. Mesmo se aproximando de mim, eu não conseguia ver como ele era ou quem ele era.
"-Eu sou sua individualidade, Hunter. Eu conheço você 'como a palma da minha mão'. Espero que goste do trocadilho, passei muito tempo pensando nisso", disse a voz.
"-Até que foi legal", digo, tentando sorrir, mas meu nervosismo não permitia isso. "Minha individualidade? Como assim? Então você é uma pessoa?"
"-Não. Essa só foi a melhor forma de me materializar para falar com você, sacou? Busquei aparecer de uma forma amigável, para que você não tivesse medo de mim ou ficasse muito assustado. Se bem que, pelo que eu estou sentindo, não está adiantando muito, não é?"
"-Confesso que estou um pouco assustado, mas já está passando. Se você podia se materializar da forma que queria, porque você não escolheu um lugar melhor? E o que é você? Porque me escolheu para ter essa maldição?" Eu não conseguia me acalmar. Eram tantas perguntas que estavam tomando conta de mim e eu não conseguia simplesmente ficar quieto ou calado perante tudo aquilo.
"-Bom... sobre o lugar, eu não tenho como mudá-lo", disse a voz. "Esse lugar não é algo que eu controlo; esse lugar é como se fosse um museu. Aqui está gravada toda a destruição que eu causei. Aqui é a junção do que todos os meus portadores causaram em cada um dos seus respectivos mundos ou universos. Eu viajo muito longe, e muito rápido, para encontrar o próximo, já que se dividiram em dezenas de grupos, e todos eles possuem o seu sangue. Não é uma maldição, Hunter. É um dom. Um dom extremamente poderoso que e caçado pelos gananciosos a milênios."
"-Meu sangue? Como assim?", pergunto, confuso.
"-Sim. Nenhum outro ser humano além daqueles que possuem seu sangue - no caso, sua família e antepassados - tem poder ou são fortes o suficiente para aguentar me receber. Se eu for forçadamente colocado em um corpo que não pertença à sua linhagem, essa pessoa irá sucumbir em poucos dias. Entende? Você é especial, Hunter. Você não se lembra, mas enquanto seu pai era vivo, você não possuía esse poder. Mas assim que seu pai percebeu que iria sucumbir perante os gananciosos, ele falou comigo e me pediu para te proteger a qualquer custo. E então, entregou a vida dele para mim, em troca de proteger a sua."
"-Meu pai morreu assim? Achei que eu tivesse sido abandonado por ele ou algo do tipo", digo, sentindo um aperto em seu coração. "E por que você só falou comigo agora?"
"-Porque, a partir de agora, sua vida vai estar constantemente em perigo: você irá, todos os dias a partir de hoje, lutar, e matar, para não morrer. E eu quero acompanhar de perto. Quero ver se o mais poderoso usuário de individualidade irá sucumbir à destruição ou irá mudar o destino desse mundo."
"-Então agora irei controlar você? O que é você? Como você funciona?" Eu tinha tantas perguntas que não sabia nem por onde começar. Eu queria saber do meu pai, do poder, dos antepassados, de tudo!
"-A partir do momento em que você abrir os olhos, irei dar controle total a você. A sua mão esquerda consegue restaurar tudo aquilo que você destruir com sua mão direita. Se você matar uma pessoa, você tem no máximo 3 horas para reviver aquela pessoa, por nunca ter treinado ou algo do tipo; mas, com treinamento, você pode aumentar esse tempo para dias, ou até anos. Isso, claro, se você matá-la usando sua habilidade. Se matar de qualquer outra forma, será impossível trazê-la de volta. Mas atenção: como recriar é mais difícil que destruir, você gastará quase o triplo de esforço e energia para restaurar algo que destruiu. Por isso, use seu poder com sabedoria e cuidado.
Eu tentava absorver toda aquela informação, e ele continuou: "Sua mão direita será responsável pela destruição; tudo aquilo que você tocar e quiser "destruir", virá diretamente para este local. Após o tempo máximo, essa pessoa ou objeto ficará perdido onde estamos, sem vida e com a alma presa a você."
"Hunter, são muitas as pessoas que sabem sobre mim. Escolha com cautela em quem irá confiar. E torne-se forte. Eu não protejo os fracos, eu os mato, e se você for um deles, irei te matar."
"-E como eu saberei em quem confiar? Você irá me matar? Isso é possível? Me responde!", digo, em um estado de choque, após receber todas aquelas informações.
"-Desculpa, não temos mais tempo. Até a próxima", disse a voz da imagem borrada por trás das sombras, sumindo.
"-ESPERA! ME RESPONDE!"
"-Hunter? Hunter! Acorda! Como assim "responde"? Responde o quê?", ouço de uma voz feminina, em um tom de preocupação.
"-Rebecca? O que está fazendo no banheiro? Quanto tempo passou?", pergunto, retornando à minha consciência e tentando raciocinar sobre o que foi tudo aquilo.
"-"Quanto tempo?" Como assim? Que você desmaiou? Não devem ter passado 2 minutos", disse Rebecca, me olhando com uma cara de confusa. Ainda conseguia ver seus olhos arregalados e sua mão tremendo. Naquele momento, lembro das palavras do ser: 'A partir do momento em que você abrir os olhos, irei dar controle total a você'.
"-Rebecca, você confia em mim?", pergunto, levantando e colocando a toalha na cintura.
"-Confiar eu confio, mas agora estou com medo", ela responde, recuando um pouco.
"-Eu... é... Posso tocar no seu rosto com minha mão?", pergunto, com receio, mas buscando confiar totalmente em meus instintos. Eu sabia que, se fosse mentira da voz e desse errado, poderia matá-la, e eu nunca me perdoaria. Mas eu precisava confiar.
"-Você não tinha dito que não podia?", ela pergunta, confusa, enquanto eu estendo a minha mão direita na direção em seu rosto. Ela pega minha mão com seus dedos e conduz até seu rosto com um olhar assustado.
Pela primeira vez desde que me lembro, eu senti como era tocar uma pessoa completamente com as mãos, sem causar danos e destruição. Abro um sorriso enorme.
"-Obrigado por isso", digo.
E antes que ela pudesse retribuir em palavras, a abraço com um pouco de força e sinto ela me abraçar ainda mais forte.
"-Eu quem agradeço pelo abraço", ela responde. Após alguns segundos, a solto e digo:
"-Bom, agora vou colocar uma roupa. Eu tenho que ir." Ela estava um pouco tímida, e disse:
"-Tudo bem. Isso é um adeus, não é?" Ela não olhou para mim, mas diretamente para o chão. Eu coloco meus dedos em seu rosto e a faço olhar para mim.
"-Claro que não. Eu vou voltar. Só vai demorar um pouquinho. Agora vai para o sofá... Preciso vestir a roupa."
Ela sai do banheiro me deixando sozinho e fecha a porta. Coloco a roupa, olho fixamente para minhas mãos e digo para mim mesmo:
"Preciso ser forte e fazer diferente."
Eu ainda tinha muitas perguntas. Queria saber o que era aquele lugar, essa tal de "individualidade", por que logo a minha família... Outros universos? Mas eu sabia que, uma hora ou outra, eu descobriria e entenderia tudo isso.
Pego minha mala e vou andando em direção à porta da casa da Rebecca. Abro as portas com apenas dois dedos e a Rebecca olha para mim. Dou um sorriso que vira risada completa (uma risada de alívio e euforia), e falo: "É o costume". Coloco todos os dedos na maçaneta, suspiro, olho para ela e digo: "-Bom, até daqui um tempo."
"-Até, Hunter, e se cuide", ela responde, tentando não chorar na minha frente, por mais que eu soubesse que ela queria muito.
"-Sempre me cuido." Me viro e saio em direção à rua.
"-Eu sei que sim." Ela me acompanha com os olhos e fecha a porta, dizendo:
"Adeus, Hunter."
Continua no próximo capitulo.

O sucumbir das mãos Onde histórias criam vida. Descubra agora