Anabel tinha 7 filhos, o marido dela estava sempre viajando para lutar em guerras, e nas semanas que ficava em casa, engravidava-a e ia embora novamente. Após uma dessas idas, ele não voltou mais. A família morava em uma fazenda isolada, onde eram praticamente autônomos. Mas após uma praga destruir as plantações e uma doença acometer as galinhas, começou a faltar alimento. Desesperada pelo fato de a produção da fazenda não ser mais o suficiente para alimentar a todos e o dinheiro ter acabado, ela foi até a cidade procurar emprego.
Quando ela saiu de casa, um andarilho, fugitivo da guerra, entrou na casa de Anabel, procurando alimento. Vendo que só haviam crianças e adolescentes ali, julgou que seria fácil pegar o pouco alimento que ainda restava para si. Mas os dois filhos mais velhos não deixaram, sabiam que a falta de comida poderia ser fatal em uma época dessas. Eles pegaram um facão e lutaram contra o andarilho. Mas a luta não era justa, os dois jovens sem os músculos completamente desenvolvidos foram facilmente subjugados e golpeados fatalmente.
Não poderia deixar testemunhas ou sementes de vingança, "muito perigoso", ele raciocinou, então o soldado fugitivo matou as outras 5 crianças, e levou tudo que podia carregar dali.
Chegando em casa, Anabel presenciou os corpos dos 7 filhos no chão. Abraçou firmemente cada um deles, catatônica com a tragédia inimaginável, ainda torcendo para que tudo isso fosse apenas um pesadelo, uma piada de mal gosto do destino. Ao perceber que estava sozinha, tentou a ajuda de forças divinas; orou e jejuou por uma semana. Quando não houve resposta, ela procurou o outro lado. Ela tinha um livro antigo em seu porão, herança de seus antepassados, tesouro da família. Nele, um ritual para reviver os mortos. Para ele funcionar, havia um preço: para cada vida, uma parte do corpo. A mulher escolheu o olho como a parte mais viável. Pode-se enxergar bem com apenas um olho, não? Com uma faca esterilizada, ela arrancou o próprio globo ocular e fez o ritual.
Ele funcionou.
O filho mais velho dela voltou, um adolescente de 14 anos. Personalidade idêntica à quando ele era vivo. Mas teve um porém. Sempre tem para este tipo de coisas. A alma voltou, mas o corpo manteve-se igual. Um cadáver caminhando. Ela abraçou o filho, eles conversaram e viveram como antes. Ela repetiria o ritual para os outros 6 filhos, em breve, assim que cicatrizasse um pouco a mutilação do olho. Um dia depois, ela tentou algo sugerido pelo filho: arrancar um olho dele. O globo ocular saiu fácil, nem sangrou quase com o rigor mortis e o sangue coagulado daquele corpo adolescente. Mas o ritual não funcionou. A parte do corpo precisava vir de um corpo vivo. Ela decidiu que cortaria a própria mão no dia seguinte, e dormiu abraçada com o filho ressuscitado.
Na chegada da aurora, Anabel acordou com um grito. O pai havia voltado e viu ela abraçada com o corpo fedendo e decomposto, mas falando normalmente como o filho sempre falou. Quer dizer, a voz as vezes falhava com as cordas vocais apodrecidas, mas era ele. Claramente era ele, não alguma entidade ou ser perverso.
Anabel abraçou o marido, lágrimas de felicidade escorreram pela volta de seu amor. Mas ele não demonstrava alegria. A morte dos filhos foi compreendida, mas ritual de ressurreição foi furiosamente rejeitado. Disse que tinham que matar aquela aberração que imitava o filho dele. Fúria dominou Anabel. Como ele poderia sugerir tirar o filho dela novamente? A faca nas mãos dela encontrou a barriga do marido, que cedeu ao chão com a perca da força abdominal. Ela então amarrou-o em uma cadeira, com a ajuda do filho. Antes que ele sangrasse até a morte com o ferimento, ela teve a ideia de usá-lo para o ritual. O homem que havia gerado aquelas sete vidas daria mais uma chance a eles. Seria poético, uma vida por seis.
Inicialmente Anabel testou os dedos e as orelhas, que não funcionaram. Ela já sabia que não funcionariam, o livro esclarecia que precisava ser uma parte mais importante. Então arrancou os dois olhos dele, e mais dois filhos voltaram à vida.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Lendas de outro universo
TerrorMortos que se recusam a descansar, universos paralelos, metamorfos fingindo ser crianças, e até uma pizza que trará o apocalipse. Entre nesse universo antológico e mergulhe no que existe de mais assustador, perturbador e cruel em todos os cenários p...