001 - brilhe

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"Ouvir dizer que tempestades fortes estão chegando, preciso que tomem cuidado e fiquem em segurança, esse clima está se armando a algum tempo."

A breve carta do meu pai fez meu corpo se arrepiar, largo o bilhete na gaveta, juntamente com as restantes, passo a mão no meu rosto em preocupação, percebendo que a "tempestade forte" que ele se referia, era sobre a tensão da capital com uma possível rebelião, começo a me afastar da bancada, indo em direção a parte de fora da casa, antes tendo certeza que peguei dinheiro suficiente para comprar pelo menos alguma comida para jantarmos nos próximos dias sem precisar nos preocupar em caçar, caminhando entre algumas poucas casas utilizadas da Vila dos vitoriosos, faço meu caminho em direção aos becos do distrito até chegar no mercado clandestino da região, comprimento com um sorriso algumas pessoas mais próximas de mim.

— Como estão as coisas com os pacifistas? — perguntei para um dos vendedores enquanto ele me entregava alguns pedaços de carne, em troca de algumas moedas.

— Estão pegando firme, ouvi dizer que o treinamento está sendo mais pesado do que nunca, não sei quanto tempo isso vai durar — Ele disse, fazendo referência ao barracão onde ficava localizado o merecido clandestino. — Já fecharam o dos distritos 12, 11, 7 e o 5. Mas não se preocupe, se a escuridão nos atingir...

— Iremos correr com os vagalumes até a luz — completei a frase, fazendo o senhor sorrir, levando o olhar até o colar no meu pescoço.

— Bom saber que está do nosso lado.

Eu sorri para o homem, pego minha pequena compra e me afasto, decido que não iria comprar mais nada, não podendo gastar mais dinheiro do que o necessário, caminhando pelas ruas nubladas do distrito 8, vendo os comboios cheio de pacifistas enchendo as ruas, faço questão de apressar meus passos, assim como grande parte do resto dos cidadãos. Assim que chego em casa, deixo a carne na geladeira, pelo relógio pude perceber que meu irmão ainda trabalhava, eu havia largado meu emprego após a minha vitória dos jogos, não por causa de um motivo mesquinho, mas sim, porque eu tinha muitas crises de pânico às quais eu não conseguia controlar em público.

Eu durmo no sofá, rapidamente, meu corpo está cansado, provavelmente foi por que havia passado noite passada acordada, com minha mente batucando com as novas coisas que estavam acontecendo ao redor de nós, principalmente pela carta de meu pai, normalmente, quando estou com a mente cheia, corro em meio a floresta que rodeia o distrito, eu escalo uma árvore e fico observando tudo de cima, esperando eu ser pega algum momento, assim como eu fiz na minha edição dos jogos, poderia soar estranho, mas o sentimento de ter motivos para estar 100% alerta, fazia eu pensar que eu estava menos louca. Mas noite passada isso não aconteceu, com o novo toque de recolher idealizado pelo governo, era praticamente impossível sair de casa, que dirá sair do distrito para passear pela floresta.

Me assusto com os passos apressados de Grahaam pela casa, eu abro meus olhos cansados e confusos enquanto ele murmura algo como: "ligue logo essa TV" ele tira amei pés do sofá, fazendo eu me sentar, ainda confusa, quando a televisão liga, consigo ver Presidente Snow, esfrego meus olhos e olho para meu irmão, ele tem um olhar assustado e ansioso, mãos no rosto e cotovelos sobre o joelho, eu me ajeito ao seu lado no sofá e assisto à declaração de Snow.

"Senhoras e senhores, esta é a 75ª edição dos Jogos Vorazes. Está escrito nas regras dos jogos que a cada 25 anos deveria haver um massacre quaternário para manter fresca para cada nova geração a memória daqueles que morreram na rebelião contra a capital. Cada massacre quaternário é diferenciado por jogos com um significado especial, e agora, neste 75º aniversário da nossa vitória sobre a rebelião, celebramos o 3º massacre quaternário, como uma lembrança de que nem mesmo os mais fortes podem superar o poder da capital. Neste 3º massacre quaternário as homenagens masculinas e femininas deverão ser recolhidas da lista de vencedores de cada distrito"

Tenho certeza que desaprendi a respirar por alguns segundos, minha mente travou e meu corpo inteiro começou a se estremecer, Graham chorava, mas tentava não deixar transparecer, falhando nesse sentido. Eu me levanto por impulso e saio pela porta, correndo, em direção a casa de Foster, abro a porta sem mesmo bater, ele estava apenas lá, parado com sua televisão quebrada em mil pedaços, ele se virou em minha direção e antes que eu pudesse dar algum passo para trás, querendo fugir de tudo novamente, o homem me abraça, e meu choro é soluçado.

— Kara tem 34 anos e tem filhos pequenos, se sortearem ela, aquelas crianças vão ficar órfãos e eu não vou me perdoar, ela já tem uma vida. — eu solucei — E se sortearem você eu não vou aguentar sozinha, Foster. Se me sortearam e você não...

— E você Ophelia, nem começou a sua ainda direito! — ele me rebateu.

— Não! Me escuta, se não te sortearem, você precisa ficar, alguém tem que me ajudar a ficar sã, tudo bem? — disse nervosa — Preciso que cuide de Graham.

Foster se afastou jogando um vaso no chão, enquanto dizia: "que merda, garota!", ele passou as mãos pelo rosto, se sentando no seu sofá, o homem apenas me olhou por alguns segundos, afirmando com a cabeça.

— Não vou me voluntariar. — ele disse, calmamente — Contando que você não faça o mesmo.

***

O caminho para colheita era tenso, de início, quando saiu a notícia, acreditei que o povo do distrito estava feliz, já que ninguém teria a chance de ser sorteado para os jogos, mas percebi que estava errada, assim que vi todas aquelas pessoas com olhares tão tristes e assustados quanto as outras colheitas. Meu estômago estava embrulhado, eu e meu irmão havíamos dormido na mesma cama na última noite, recusamos a dirigir uma palavra sobre esse assunto um com o outro, sem esclarecimentos, sem despedidas, apenas uma fuga do assunto, em silêncio concordamos que deixamos tudo aquilo após a colheita. Antes de subir ao palco para me juntar com os outros três vitoriosos, Jensen me abraçou com os olhos avermelhados, juntamente a Lana Greykov me abraçou forte, deixando um beijo em minha testa, com um sorriso meigo.

— Vá e brilhe meu vagalume.

Subi no palco, me colocando ao lado de Kara Madson, um microfone o qual era comandado por Elyra, e do outro lado Bryan Lenght, um homem de 25 que havia ganhado os jogos alguns anos antes que eu e Foster, em frente a cada dupla, havia um vaso de vidro transparente, ambos com dois papéis, dentro, Elyra me deu um olhar triste, eu apenas sorri fraco, respirei fundo e direcionei meu olhar para frente.

— Sejam muito bem vindos à terceira edição do massacre quaternário! Onde dessa vez, iremos sortear dois vendedores de cada distrito! — Elyra disse, tentando fingir algum tipo de animação — Bem, já que essa é uma edição diferente, vamos começar pelos homens dessa vez — ela deu um risinho falso, colocando a mão em meio ao pote de vidro e retirando um pequeno pedaço de papel — Bryan Lenght!

O silêncio permaneceu, senti os olhos de Forest vidrados em mim, enquanto o outro homem se encaminha para o lado de Elyra.

— Agora, as damas — a mão da mulher de cabelos vermelhos vibrantes, rodopiou pelo vaso, pegando o papel, dessa vez foi perceptível um pequeno suspiro de alívio — Kara Madson!

Dessa vez eu pude ouvi os choros de alguém da multidão, meus olhos voaram em direção as crianças, o mais velho, pelo o que eu sabia tinha uns 15 anos, ele se esforçava para acalmar os dois mais novos, um garoto de 12 anos se esforçava para sair dos braços do irmão e correr em direção a mãe com raiva em seus olhos e em seus gritos, enquanto uma garotinha de cabelos pretos que era a igualzinha, Kara só que com uma feição mais nova, se agarrava nas pernas de seu irmão mais velho, chorando. O pai das crianças, estava em prantos no chão, caído de joelhos enquanto o mais velho tentava remediar a situação.

— Eu me voluntario como tributo. — Eu disse, sem ao menos pesar, vendo os olhares espantados em minha direção.

Kara me abraçou me agradecendo e pedindo desculpas ao mesmo tempo, em prantos, eu apenas abracei levemente e segui meu caminho ao lado de Elyra, Foster está com o olhar vidrado em mim, enquanto Graham olho para mim e berrou:

— Corra com os vagalumes até a luz!— Com o primeiro grito de meu irmão, se iniciou outros, mas antes que pudéssemos continuar, os pacifistas nos agarraram pelos braços e nos levaram para o trem sem ao menos poder nos despedir.

Fireflies - Finnick OdairOnde histórias criam vida. Descubra agora