ᴄᴀᴘÍᴛᴜʟᴏ Qᴜᴀᴛʀᴏ

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— Comprei pra você.

Roberto murmurou, entregando um livro a Kita. "Antes Que O Mundo Acabe". Ele segurou com firmeza, olhando sem interesse para tal coisa. Kita agradeceu com um aceno sem graça, colocando debaixo do braço enquanto andou em direção a porta, acabando por ser barrado.

Na caminhonete, Roberto disse que iria dirigir. Chovia forte, fazendo a estrada quase invisível. Não havia rádio, apenas o silêncio enquanto a chuva fazia estouros por cima do teto de alumínio.

O platinado olhava de relance para o mais velho, vendo o olhar do mesmo baixo, desviando a todo momento enquanto disfarçava.

Ah, ele conhecia tal olhar.

Vai chover três dias seguidos, vi no jornal. E a plantação? Preciso cuidar dos animais.

Geralmente ele pensava na fazenda. 10% de sua mente era plantação e os animais. Mais 10% era sobre sua avó. Os outros 70% eram sobre Roberto. Tudo girava em torno dele. Apenas.

Ele havia observado cada passo de Roberto durante os 7 anos. Sabia que havia pegado hábitos do mesmo: também colocava o braço apoiado na porta e outro no volante. O jeito de sentar, o jeito de pensar em questão de assuntos inteligentes, o modo de agir e o jeito que também ficava de braços cruzados e uma carranca no rosto em qualquer lugar.

Exatamente igual ao homem a sua esquerda.

Ele sabia manias, sabia que Roberto na verdade era um homem calado e muito admirado na fazenda, por outros funcionários e pela própria família - era um homem trabalhador, pai de família e respeitado.

Sabia que ele ria escandalosamente, sabia que ele odiava a cor marrom, que ele tinha uma mãe doente e um pai preso, e uma filha distante.

— Sua filha?

O platinado perguntou casualmente, olhando para a revista ali do lado. O Brasil derrotou a Alemanha no estádio de Yokohama, no Japão, e se tornou o único país a ter vencido cinco vezes o campeonato mundial de futebol.

Você também estupra sua filha? Pensou silenciosamente, vigiando o homem. Os cabelos brancos começaram a aparecer, juntamente com a barriga.

Eu sou estuprado por isso?

— Ah, ela tá no exterior fazendo faculdade.

— Então é mais velha que eu.

— sim, ela tem 23.

— Nova.

Por que Kita não conseguia acabar com ele? Olhou pra frente, a chuva forte ainda.

— Você também é novo, Shin. Tem que estudar.

— Sim.

Eles conversavam normalmente. Admirava que Roberto facilmente se importava no dia a dia com Kita. Como se estupra-lo durante o caminho da escola quase todos os dias, fosse um sexo casual.

Algo normal, tratado normalmente pelos dois. Como se importassem um com o outro, amigos, colegas.

Kita desenvolveu a habilidade de fingir que nada aconteceu. De se importar com o outro, de perguntar se ele queria água quando ele bebia ou se estava com fome. De perguntar de maneira sem graça se o outro viu tal notícia, de mexer no celular, achar algo engraçado e virar a tela para o homem rir também.

Ele se achava doente por isso.

Em um impulso, pulou em Roberto, com as mãos no pescoço enquanto gritava, atravessando a marcha de mão e fazendo Roberto desviar o volante enquanto gritava.

𝐂𝐎𝐋𝐋𝐀𝐏𝐒𝐄, Kita ShinsukeOnde histórias criam vida. Descubra agora