Calen

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Calen Zopastros nunca havia pensado em ser dançarino.

Sendo honesta, isso não é nem perto da realidade.

Calen nunca tinha sequer pensado mais que dois minutos sobre dança de forma geral.

Mas então ele viu Jez.

E naquela razão de segundo tudo mudou. Ele foi consumido pelo desejo de dançar. De entender o porquê aquele menino parecia tão imerso naquele momento. O que aquele homem via que ele nunca tinha conseguido enxergar?

E por incrível que pareça Calen era bom!

Ele era rápido em pegar as novas coreografias e tinha um ótimo domínio sobre seu corpo. E isso encantou Jez, que o olhava em admiração.

E ele gostava quando chamava sua atenção.

Gostava como seus olhos brilhavam e ele sorria sedento.

Gostava mesmo que soubesse que não era Calen que o Jez via.

Mas isso não importava, ele se sentia um Deus sob seu olhar de adoração.

Quando a dança encheu seus dias pensou que fosse entender. Mais dúvidas surgiram.

Por que ele parecia disposto a dar tudo de si, perder totalmente sua essência por aquilo? O que era tão importante assim alcançar?

Até que ele entendeu.

Quando Jez passava a boca por seu pescoço e suspirava palavras de aprovação por seu desempenho no dia, ele entendia.

Quando Jez olhava para ele, e só para ele, quando eles estavam ensaiando, ele entendia.

Quando Andrei errava um passo que Calen acertou e ele quase podia ver uma sombra de sorriso nos lábios de Jez, ele entendia.

E começou a passar todas as horas que não estivesse naquele estúdio escuro aprendendo através de vídeos técnicas, dormindo duas horas por noite e mancando quando torcia o pé e mesmo assim aparecendo no dia seguinte. E valia a pena quando via o olhar de apreciação em Jez ao vê-lo sentado, as costas apoiadas na porta de vidro gelado, esperando-o chegar para abrir.

E Calen sempre era compensado com mãos quentes por baixo da sua blusa o apertando e beijando e quando Vivaldi começava a tocar novamente, Jez estava do outro lado da sala fazendo os aquecimentos e Calen não fazia nada além de o seguir.

Já não se lembrava de uma vida antes de conhecer Jaz. E sua vida depois tinha se tornado orbitar ao redor dele. Mesmo depois, muito no futuro, Calen ainda não conseguiu muito bem se lembrar o que ele fazia antes. Quem ele era antes de Jez dançar na sua frente e se ver enfeitiçado, fadado a segui-lo para todo canto.

Sob o olhar astuto de Jez ele se sentia queimar, doía tanto, e ele não conseguia pensar em lugar melhor para se estar.

O diabo não vem até você com seu rosto deformado por chifres vermelhos, ele vem disfarçado de tudo que é impossível resistir.

E Jez era o tudo.

Calen pensava nisso enquanto ia para casa, um pequeno quarto sem janela, e com espaço para sua cama de solteiro, e duas prateleiras que onde antes estavam os livros de estudo agora eram cobertas por meias rasgadas e sapatilhas de apresentação.

Ele lembrava da careta de Jez quando foi ao seu quarto pela primeira vez. Retirando todos os livros com um só empurram com a mão e então colocando a mochila. No próximo momento ele estava deitado na cama, pressionado contra o colchão e os livros embaixo dos dois doíam as costas mas não o suficiente para valer se separarem. Eles tiraram os casacos. Os moletons e as blusas. Eles nunca tinham feito nada daquilo usando as roupas de ensaio. As sapatilhas eram sagradas. Os livros não.

1999Onde histórias criam vida. Descubra agora