O início

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Saí da sala com uma sensação inusitada, segurando firmemente os livros para preservá-los em meu armário; minhas mãos trêmulas poderiam facilmente amassá-los. O substituto não me agradou, seu olhar era pesado e transmitia um magnetismo avassalador, algo que não consegui parar de pensar.

Tentei afastar esses pensamentos, guardando minhas coisas e colocando os fones de ouvido para ouvir minha música preferida do Three Days Grace, "Expectations", relembrando meus dezesseis anos. Em seguida, liguei meu aparelho de teclado numérico e constatei três chamadas não atendidas da minha mãe, que eu esperava para me buscar. Eu havia perdido o horário do ônibus.

A culpa recaía sobre aquela professora que claramente nutria antipatia por mim, provavelmente agindo de forma intencional. Ou talvez fosse apenas uma criação da minha mente desequilibrada. De qualquer forma, a antipatia era mútua. Observei as pessoas passarem apressadas e desrespeitosas, sem se importarem em me atropelar. No intervalo, a situação piorou. Pisaram nos meus sapatos caros sem sequer pedirem desculpas. Revirei os olhos diante de tanta desconsideração e, em um segundo seguinte, fizeram-me derrubar o aparelho no chão. Senti pena de mim mesma naquele momento, pois sabia que minha mãe não compraria outro.

Rapidamente peguei o celular e verifiquei se estava tudo em ordem. Infelizmente, havia se despedaçado no chão. Fiquei aliviada ao constatar que ainda funcionava corretamente, mas também irritada com a falta de noção das pessoas ao meu redor.

Até então, não havia prestado atenção aos arredores. Deparei-me com o professor de química observando-me de longe, com as mãos nos bolsos da calça e encostado na parede da diretoria. Sua maneira de engolir chamou minha atenção, o movimento de cima a baixo dentro de sua garganta. Não sei por que me fixei nisso, apenas virei o rosto e continuei dando atenção ao meu celular, esperando algum sinal da minha mãe. Agradeci aos céus por não ter caído na caixa postal, mas comemorei cedo demais, pois nada aconteceu.

Guardei o celular na bolsa e fiquei com expressão de perplexidade estampada no rosto, os braços cruzados. Senti um toque em meu ombro e assustei-me, virando-me bruscamente para o outro lado. Retirei o cabelo dos olhos e soprei uma mecha que estava à frente da minha boca. Ri levemente sem graça ao perceber que era ninguém menos que o substituto.

— Oi.

— Olá — respondi educadamente.

— Está esperando alguém?

— Minha mãe.

— Perdeu o ônibus? — indagou ele.

— Sim... — murmurei. Por que eu estava respondendo? Eu deveria sair dali.

Ajeitei a mochila nas costas, sentindo-me desconfortável com o olhar minucioso que ele lançava sobre mim.

— Você foi a única aluna que não proferiu uma palavra sequer em minha aula. Por quê?

— Desculpe... o quê?

— Você não me insultou — observou ele.

— Eu deveria? — levantei uma sobrancelha, não como ironia, mas como uma pergunta genuína.

Ele riu suavemente.

— Não sei como decifrar você.

Ele olhou nos meus olhos novamente e, ao tentar desviar o olhar, senti como se estivesse me auto-sabotando.

— Eu... — tentei dizer algo, mas o algo ficou preso em minha garganta. — Perdoe-me. Preciso ir.

— Está incomodada?

Mas o quê?

Quem ele pensa que é?, questionei-me.

Levei uma eternidade para perceber que ele aguardava minha resposta. Balancei negativamente a cabeça. O professor aproximou-se e fui tomada por uma súbita onda de adrenalina, sentindo-me desesperada. Não fiz nada, porém.

O substituto Onde histórias criam vida. Descubra agora