As desculpas

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Rodolffo regressou à fazenda e nos dias seguintes tentaram reparar alguns estragos que o temporal havia causado.

Ao mesmo tempo destacou uma equipa para reconstruir a estufa da fazenda dos pais da Ju.  Ia aproveitar  enquanto ele ainda estivesse no hospital pois de outro jeito o sr. António não aceitaria.

A Juliette já  frequentava a casa de Helena há algum tempo e conversava muito com dona Isabel e o sr. Francisco que por estar com Alzeimer já não tinha discernimento para algumas coisas. 
Por vezes confundia a Ju com a Helena e até com a esposa Isabel.

- Lembras quando casámos, Isabel? Disse ele para Juliette.

- Quando foi isso? Perguntou Juliette que nunca o contrariava.

- Desculpa Juliette.   Ele está confuso.
E o teu pai como está?

- Bem melhor dona Isabel.  O médico vai dar-lhe alta para a semana mas eles vão ficar comigo aqui um tempo.

- Fazes bem.  Na fazenda já não é lugar para eles sózinhos.

Juliette ia telefonando a Rodolffo a contar-lhe das melhoras do pai.

- Oi.  Como vai tudo por aí?
Como estás?

- Bem.  Vai tudo bem, Juliette.

- Quando vens cá?

- Só se os meus pais precisarem.  Não quero sair daqui.

- Tenho saudades do meu amigo.

- Pois.  Saudade é palavra triste.
Preciso ir.  Tchau.

Juliette terminou a chamada com lágrimas nos olhos.  A frieza de Rodolffo magoava-a mas foi ela quem se afastou primeiro.  Com ou sem razão foi ela quem não respondeu às mensagens e chamadas.  Foi ela que quis ser apenas amiga e nada além disso.
Ele sentiu necessidade de se divertir e foi.

Juliette estava confusa.   Ela não queria compromisso mas gostava dele. 

Passaram três meses e estava na hora dos pais da Ju regressarem.  Queriam ir para o seu cantinho.

Juliette disse que ia levá-los no sábado.   Iria de manhã e voltava à tarde.

Entretanto a velha tapera dava lugar a um bonito atelier.
Prateleiras de materiais, várias telas já acabadas e outros apetrechos enchiam a sala logo à entrada.
Na traseira, virada para o riacho uma sala pequena e um banheiro.

A sala tinha pouca coisa.  Um sofá confortável,  uma mesa, um aparador onde se via uma chaleira eléctrica para fazer café e várias chícaras.  Um pote com alguns biscoitos e um cesto com fruta.

Rodolffo passava ali todos os bocadinhos livres, nomeadamente aos domingos.

Ele sabia que Juliette vinha trazer os pais mas não queria encontrar-se com ela.

Ela por educação ia agradecer os cuidados prestados ao pai, a reconstrução da estufa e isso para ele não era importante.   O importante para ele, ela não queria.

Por isso no sábado programou visitar uns amigos de uma fazenda não muito distante da sua.

Juliette chegou com os pais e todos ficaram a saber das novidades.

O pai de Ju já tinha conversado com ela sobre o dia em que Rodolffo o socorreu.  Ao ver a estufa nova não conseguiu conter as lágrimas.

Podia ter se revoltado e não querer a ajuda mas não.  A partir do momento em que o médico lhe deu alta ele jurou a si mesmo mudar.  Ia começar por resgatar o amor da filha nem que para isso tivesse que se humilhar.

- Que foi pai?  Não podes ter emoções fortes, disse o médico.

- A estufa.  Quem a recuperou?

- O vizinho, teu inimigo.  Pediu autorização e eu dei.

Juliette acompanhou o pai numa visita pela fazenda.  Alguns estragos ainda eram visíveis.

- Pai, precisas de arranjar alguém mais novo para administrar isto. Já não tens idade.

- E tu filha, não vais voltar?  Eu já pedi desculpa mil vezes, já fiquei lá na tua casa.  Fica connosco, filha!

- Pai.  Já conversámos várias vezes sobre isso.  Vais pedir desculpas ao Rodolffo?

- Vou.  Diz para ele vir aqui.

- Não.   Foste lá insultá-lo na casa dele.  É lá que deves ir.

- Faço o que for preciso para que tu voltes para cá.

- És um casmurro.  O que ganharam as famílias com tanto ódio?

- Eram outros tempos.  Nós obedecíamos aos pais.
E vocês não estavam juntos?

- Não pai.  Somos apenas amigos.
(ainda somos amigos, penso eu)

Juliette regressou com o pai a casa e foi montar o Alasão.

Cavalgou até à casa de Rodolffo mas só encontrou a Maria.

- Juliette,  há quanto tempo!

- Há muito, Maria.   Onde está Rodolffo?

- Foi visitar um amigo numa fazenda próxima.  Só volta à noite.

- Mas ele sabia que eu vinha.  Eu já não sou importante.

- Juliette,  o Rodolffo tem andado estranho.  Muito triste,  isolado, passa o dia no campo ou na tapera.  Tem dias que dorme lá.

- Já  está habitável?

- Sim.  Como nova.

Juliette regressou a casa e almoçou com os seus pais.

- Ju, fica para amanhã.   Eu prometo que amanhã,  a primeira coisa que eu faço é ir lá.  Por favor.

- Está bem, eu fico.

Esperou uma chamada ou uma mensagem dele mas não veio nada.

Domingo todos acordaram cedo na fazenda  Esteves.

- Vamos tomar café todos juntos.
O que vais fazer,  Ju?

- Vou passear com o Alasão.
E tu vê lá o que prometeste.

- Vou lá já de seguida.

Saíram juntos mas cada um tomou o seu rumo.

- Bom dia senhora.  Eu gostaria de falar com o sr. Rodolffo  por favor.

- Eu vou  chamar.   Diz-me o seu nome?

- Deixa estar, Maria.   Eu já estou aqui.   Bom dia.

- Bom dia.   Podemos conversar?

- Qual é o assunto?  Se for o mesmo da última vez, esqueça.  Eu e a sua filha não temos nada um com o outro.

- Eu venho pedir o seu perdão pelas ameaças que fiz.  Eu já tomei consciência de que toda a vida vivi enganado.  Nem você nem a minha Ju têm culpa dos erros do passado, então eu espero do fundo do coração que me perdoe.

E também quero agradecer ter aparecido e ter-me socorrido.   Eu sei que se não fosse você eu estaria morto.

Ainda há  o problema da estufa.   Eu agradeço a ajuda mas eu quero pagar o que for.

- Sr. António,  já que veio até aqui e está disposto a começar de novo, venha para dentro e tome um café comigo.

António ainda exitou mas resolveu entrar.  Conversaram por bastante tempo até que se despediram.

- Dê cumprimentos à Ju e à dona Isabel.

- A Ju já anda por aí a cavalo.

Rodolffo resistiu mas não conseguiu.
Selou um cavalo e foi ter com a Ju.  Ele sabia que o passeio a cavalo dela só tem um destino.

Tapera caídaOnde histórias criam vida. Descubra agora