No dia seguinte Adam despertou na cama sozinho outra vez, olhou de relance o relógio em cima de sua mesa de cabeceira e concluiu pelo horário que sua esposa deveria estar na academia, escutou um leve barulho de efeitos sonoros conhecidos e sorriu, Benjamin era a coisa mais importante da sua vida, poder ouvir os mínimos detalhes da existência daquele garoto já fazia seu dia, ainda que alguns dias fossem difíceis, ainda se lembrava da primeira vez que encontrou aqueles olhos quatro anos antes dali, a única coisa que o preocupava era a distância com que Emma sempre tratou de amar o garoto, por ser uma modelo internacional ficou frustrada ao perceber que aquela criança teria tirado parte dos anos de glória da juventude dela, e estragado certos planos que ela havia feito para si mesma, a mulher lutou intensamente para recuperar sua carreira e conseguiu. Ainda assim deixava o filho cercado de várias mães alternativas o tempo inteiro, a babá, a psicóloga, e até o final do ano passado Heloise. A antiga cozinheira fixa da casa quem acompanhava a casa dos Darkist desde a adolescência de Adam, e por isso acompanhou toda a história de amor do casal, e o nascimento do menino, não pode deixar de se apegar também a criança que na aparência era a mistura perfeita dos dois, mas Emma ficou furiosa ao perceber como o garoto era aficionado àquela mulher, e a dispensou em meio a uma horrível briga, alegando que a mulher estava tentando roubar seu filho.
Adam ainda se sentia mal pelo que havia acontecido quando se pegava pensando no assunto, e por isso agora rezava para que Benjamin não construísse um laço com Bella, porque se assim acontecesse não sofreria só o menino, mas também ele que já começava a nutrir estima por aquela mulher. Entrou no quarto do filho já de banho tomado e vestido, abraçou o pequeno com força por trás interrompendo a brincadeira com os robôs barulhentos, o quarto era cercado de figuras como aquelas grandes ou pequenos, coloridos, cheios de luzes e funções; a criança reclamou por alguns breves segundos e logo depois começou a sorrir com as cócegas que o pai lhe fazia, enquanto os dois se divertiam Emma estava no vestiário da academia pensando sobre a vontade tentadora que morava em seus pensamentos de contratar um cozinheiro masculino, simplesmente pela facilidade que seria se relacionar com alguém que não tinha a menor chance de criar conexões além das profissionais com sua família, mas também pensava em Adam e no quanto ele estava animado com a ideia de ter Bella por perto, atender a vontade do marido talvez devolvesse a casa e ao casamento dela a esperança de antes, precisava de sua família com ela não só pelo afeto que sentia pelos dois, todavia também porque sua família feliz e estruturada havia se tornado parte de sua marca, falar sobre seu estilo de vida era também sua profissão, era em cima dessa vivência que vivia de publicidade e continuava sendo requisitada por marcas ainda com todas as mudanças que a maternidade havia feito em seu corpo.
De jeito nenhum poderia colocar isso em risco, por isso tais dúvidas permaneceram presas em sua cabeça até que poucas horas depois chegou a sua casa, pelo barulho sabia que seu marido e filho estavam brincando na companhia de hades o rottweiler filhote da casa, então decidiu subir rapidamente as escadas e passar como um furacão para a suíte de onde começaria a trabalhar, e não contava com ouvir um..
— Mama!— Fechou os olhos, vestiu um sorriso treinado e foi ao encontro do filho.Zanri preparava o almoço em seu apartamento sem pressa enquanto ouvia música em seus fones de ouvido sem fio, e sua irmã seguia trabalhando com artesanato em cerâmica no cômodo ao lado, as duas levavam uma vida boa e modesta na região central do Rio de janeiro, saíam juntas para visitar a mãe que morava no Méier todos os domingos, e sempre passavam as noites de sábados se divertindo cada uma ao seu modo, mas agora que a mais nova estava prestes a ser contratada para um emprego que exigiria muito mais horas longe de casa do que as duas estavam acostumadas, Aisha estava preocupada em perder seu braço direito na vida e no samba.
— E como vamos fazer com os ensaios? Não me diga que você vai largar de vez o carnaval agora?
— Não sei irmã minha, eu não sei nem se vou ser contratada, mas se eu for provavelmente terei que deixar de desfilar por um tempo, pelo menos até que eu consiga organizar meus horários de lazer com o trabalho pesado que vou fazer naquela casa,— Já consultou os mais velhos sobre isso?
— Sim. A avó me disse que devo seguir em frente, pois será turbulento, porém no final me trará a graça! Eu senti medo pelo olhar que ela me deu mas, ela sabe o que diz.
— Cabe a nós confiar, mas ainda não gosto de você indo trabalhar para aquela sebosa.
— Aisha, você não deve concluir a personalidade das pessoas só pelo que eu disse e pelo que você vê na internet!
— Sejamos sinceras irmã, qualquer um que acompanha o mínimo do que ela vive e vende sabe e acha ela um poço de futilidade e soberba, e depois do que você me disse ontem você só confirmou ainda mais a minha tese de que aquela porra toda é uma farsa. Você deu sorte que o marido é alguém de verdade, porque ela não é.Zanri tirou os fones de ouvido, e parou de mexer nas panelas enquanto tentava ouvir a própria cabeça, sua irmã poderia estar certa, embora os Darkist parecessem uma família normal para os padrões deles, poderia ser que todo o império fosse erguido com areia, e tudo pudesse se destruir ao sabor de uma ventania, e ela não queria se ver sendo levada juntamente a ruína com eles se a maldita hora chegasse.
— Temos que confiar nos mais velhos, eles não nos desamparam, nunca nos deixam cair em furada. Se for para ser o fim deles, que seja o meu começo!
— Obá...
Disse a outra evocando a mãe ancestral da irmã, não poderia esperar outra resposta de quem tinha veneno na língua e a força de um boi consigo, Zanri era imparável quando queria algo, Aisha sabia disso, e não estava disposta a tentar dissuadi-la.
— Não começa...— Só tome cuidado por favor.— A mais velha pediu já se aproximando dela com cautela, a outra observou o brilho no cristal de sua pulseira reluzir pelos raios de sol, e assentiu entendendo o papel da outra em sua vida e a abraçou rapidamente. Por mais dor que fosse haver, a mais nova preferia confiar no futuro adiantado que havia recebido, por isso passou o resto do dia em paz sem que a ansiedade pelo resultado a perturbasse.
Às seis da noite, quando não tinha mais esperanças de ouvir daquela família naquele mesmo dia, surgiu uma ligação de número desconhecido em seu celular e Zanri atendeu apreensiva.
— Alô?
— Não salvou o meu número? Que descuido Bella.
Aquela voz de novo, aquela voz que parecia acariciar o seu íntimo todas as vezes em que falava com ela, Adam.
— Perdão Adam, mas eu esperava ouvir de sua esposa, está tudo bem?
— Prefere tanto assim falar com ela? Pois posso chamá-la.
— Não a incomode, por favor continue.
— Foi o que eu pensei, é sobre a sua contratação para trabalhar em nossa casa, você poderia começar na próxima segunda-feira?
— Claro que sim.
— Pois espero por você aqui pontualmente às oito e meia da manhã, tudo bem? Venha diretamente para o meu escritório, prefiro que você mesma confira os termos do seu contrato e leve uma cópia consigo.
— Certamente, nos vemos na segunda.
— Mas já se despedindo?—
Disse ele querendo prolongar a conversa, a porta do quarto dos livros estava fechada, nada poderia interrompê-los, além da consciência de ambos envolvidos.
— Há algo mais em que eu possa servi-lo?
— Espero que logo aprenda que não há mal algum em se tornar amiga de seu futuro contratante, Bella.
A voz atingiu uma rouquidão sensual e poderosa como a do dia anterior quando ele havia comentado sobre sua beleza, e isso fez os pelos na pele da jovem se arrepiarem rapidamente, ela precisava mais do que nunca o colocar no lugar dele o quanto antes.
— Não me interessa ser tão próxima de um homem casado, senhor, mas muito obrigada pela cordialidade, nos vemos na segunda-feira.
Ela disse já desligando sem dar chance para que ele tentasse novamente, Adam sorriu se dando por vencido na brincadeira, não sentia nada além de admiração por ela, e duvidava que ela estivesse mesmo disponível, aquele tom de voz só confirmou o que sentia.Não era possível em condições normais que uma mulher como ela não tivesse uma fila de espera, mas se as circunstâncias fossem outras, ele sabia que sua adorada Emma não se importaria, como não havia se importado das outras vezes. Encarou o grande quadro com a foto de sua família no recinto, sua mãe sentada em uma espécie de trono com seu irmão agora falecido no colo, seu pai de pé a sua direita, e ele a sua esquerda; Aquela foto fora tirada muitos anos antes da doença de seu pai aparecer, e tudo desmoronar, seu pai descendia de uma família muito antiga na ilha de Creta, uma família com uma riqueza em pedras preciosas e investimentos de grande sucesso que atravessaram gerações, não fosse a doença geracional presente em quase todos os homens daquele sobrenome, seriam a família perfeita com em um conto de fadas, que se iniciou em uma paixão de férias na praia, mas a doença sempre os assombrou e agora assombra Adam enquanto a idade em que seu pai começou a ter os primeiros sintomas se aproxima.
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Tempero Sombrio (+18)
RomanceInspirado em Bela e a fera, e O médico e o montro. Bella é uma cozinheira de vinte e seis anos que acaba de ser contrata para trabalhar na mansão do neuropsicólogo Dr Adam C. Darkist de trinta e cinco anos, os dois ao se encontrarem pela primeira s...