Sessões de Ramiro

Sessão 1

Marta percebeu que Ramiro entrou na sala com um sorriso diferente, que permaneceu mesmo depois de sentar no sofá.

- Parece que aconteceu algo muito bom com você. Quer me contar? - ela questionou com cuidado.

O peão sorriu ainda mais largo:

- Doutora pececológica, eu consegui! Eu disse pro Kevinho que amo ele, e inté dei um beijo na boca. Um beijo de amor! - a voz dele foi ficando mais doce a cada palavra.

A terapeuta também sorriu:

- Que lindo! E como você se sentiu depois disso?

- Mais leve... Mais feliz...- o moreno balbuciou com um tom de paz, depois tocou os indicadores um no outro enquanto falava quase suspirante - Ramiro ama Kevinho, Kevinho ama Ramiro.

- Isso é ótimo! Você está se permitindo amar, é um passo muito importante - afirmou a psicóloga, comovida - Então o relacionamento com esse rapaz não é mais só amizade, certo?

Ramiro ficou sério:

- Amigo não beija na boca, né? Nem dá apertão assim bem junto, como eu dô no Kevinho... Mas eu aprendi que homem com homem não pode, que é errado... .

- E você se sente errado quando está com esse rapaz?

O sorriso voltou ao rosto do peão:

- É a mió hora do meu dia. Quando o Kevinho entra no meu quarto, inté parece que alumeia tudo, sabe? Como se tivesse um sol ali drentro, mesmo sendo noite.

Marta encarou o homem à sua frente:

- Então, você vai deixar de viver algo que é tão bom, por causa de ideias que colocaram na sua cabeça, mas não são suas?

Ele sentiu os olhos marejarem, e a voz saiu até meio embargada:

- Eu não consigo mais vivê sem o Kevinho... Mas o patrão já andô reclamando que tô diferente, mais froxo, só causa de quê tenho amizade com o Kevinho. Quando ele soubê que nóis é mais que amigo, aí é que me manda embora.

- Ramiro, na vida a gente tem que fazer escolhas. E você está num desses momentos de encruzilhada, sabe? Ou você continua numa vida onde já sente que não cabe mais, ou busca um novo caminho junto com o rapaz que você ama - a psicóloga explicou com muita calma.

- Ocê fala bonito, dotora... - ele murmurou, ainda processando o que tinha ouvido.

- Esse rapaz também ama você, não ama? - ela acrescentou.

Ramiro chegou a soltar um suspiro antes de responder:

- Ele inté chorô falando do quanto me ama e que não pode me perdê. Kevinho tem medo de aconteça algo ruim comigo por causa dos serviços que faço pro patrão.

- Pelo que você já me contou, são serviços perigosos mesmo. Não acha que o Kelvin tem razão? - Marta parecia apreensiva.

O moreno franziu a testa:

- Ele tem... mas o patrão é como um pai pra eu, como que eu não vô cumpri as orde dele? Não sei fazê otra coisa na vida.

A terapeuta concluiu em um tom delicado:

- Entendo que como você está nesse trabalho desde muito jovem, acha que não sabe fazer outras atividades. Mas você ainda é jovem, pode aprender outros ofícios. Pensa nisso até nossa próxima sessão?

- Vô pensá. Prometo - garantiu o rapaz, estendendo a mão para a psicóloga - Obrigado, dotora. É muito bom conversá com a senhora, ajuda a clareá os pensamento.