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Às vezes, parece que cada domingo da minha vida é um capítulo de uma história, e que cada um desses capítulos começa com uma lição aleatória que esqueço antes do dia acabar. Estranho, no mínimo. Pior seria se as pessoas pudessem ler tudo o que faço. E chame de paranoia se quiser, mas se isso acontecesse, seria como ter todos tentando me prender, julgando minhas ações tal qual os próprios Juízes dos Céus.

Caso o domingo de hoje fosse um capítulo, não teria nenhuma lição de vida nem nada nesse nível para colocar no parágrafo inicial. O que tenho é um comentário clássico, transbordando drama clichê, e até um tanto ridículo, que diz: uma pessoa pode mudar sua vida mais que você imagina. Conhecer Dos-kun me provou isso.

Antes pensava que não haveria graça nenhuma em continuar pecando e cometendo crimes, e agora penso que é uma das melhores coisas da vida. Sem contar que sou milhões de vezes mais livre, sinceramente. Além do pequeno detalhe de ter encontrado um passatempo perfeito: irritar Sigma por horas a fio, porque ele veio de brinde com toda essa situação. Tudo bem que o odiava no início, mas as coisas mudam, mesmo.

Após o último domingo com Fedya, assumi que poderia vê-lo por mais que apenas uma vez na semana. Segunda-feira, quis fazer uma pequena visita e foi quando descobri que ele nunca está lá no primeiro dia útil, pois é o encarregado das compras semanais para a igreja, por preferir ministrar as missas noturnas. Isso não faz muito sentido na minha cabeça, porém muitas coisas não o fazem, seria besteira me prender a um detalhe tão fútil.

Como não tinha a companhia de quem queria, precisei lidar com Sigma por minutos intermináveis. Segurei-me para não atacá-lo ou coisa do tipo, porque seria algo que só faria Dos-kun me odiar. Não que isso importe, ele pode pensar o que quiser de mim, só seria uma pena. Enfim, com um pouco de esforço, foi fácil chegar ao ponto divertido com o seminarista: ele se irrita fácil, muito fácil, e que bela combinação nós fazemos!

Sendo o ser insuportável que sou, consegui reduzi-lo a uma bola de xingamentos fofinha, e posso garantir que ñão houve dia no qual ri tanto em minha vida inteira. Foi assim que nos tornamos melhores amigos, embora parte de mim ainda queira vê-lo queimar até não sobrar nem mesmo as cinzas, pois serei o único anjo ao lado de meu Deus, não importando o que tenha que fazer para chegar a tal. Sigma é uma criatura encantadora, isto é, quando Fedya não está por perto.

Os dois, quando juntos, vivem numa bolha inacessível para qualquer um do lado de fora. O mundo é deles, somente deles, e a pureza é tamanha que me dá vontade de matá-los, esmagá-los com meus próprios pés e cuspir em seus rostos. Foi uma longa semana, e nós três nos demos bem, todavia não posso evitar querer Dos-kun só para mim. E tentei, juro que tentei me controlar o máximo possível, mas precisava que Sigma soubesse que tomaria seu lugar logo.

"Fedya e eu estamos transando." Disse com despretensão, no crepúsculo de quarta-feira. Esperei por uma feição de choque, talvez ele surtasse com raiva e eu pudesse usar isto como o instante perfeito para agir e tirá-lo do caminho. Ao contrário do que almejava, contudo, sua expressão ficou cem por cento neutra, e ele inclusive deu de ombros, sem se importar nem um pouco tal qual aquela fosse a coisa mais comum de se ouvir.

     "Já sabia desse fato." Foram as quatro palavras que saíram de seus lábios como resposta, o tom neutro irritando-me profundamente. Encarei-no como quem pergunta se isso era possível, mas ainda viria a saber que qualquer coisa é possível para Sigma, já que ele tem nosso — lê-se: meu —  Deus ao seu lado. "Dostoyevsky me contou, ele me conta tudo." Não seria engano meu pontuar que, assim que a última sílaba foi proferida, ele sorriu vitorioso e lançou um olhar de desdém para mim.

Amen - FyolaiOnde histórias criam vida. Descubra agora