Capítulo 02

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Dulce abriu os olhos devagar, uma sensação de dor percorreu seu corpo, a claridade do ambiente a fez franzir a testa. Notando a figura do marido que estava sentado em uma cadeira ao lado da cama, a cabeça baixa indicava que havia algo errado.

― Christopher? ― chamou-o, em um tom de voz rouco.

Os olhos do investigador encontraram com os dela, houve um misto de alívio e preocupação.

― Você acordou, meu amor... Precisa de alguma coisa? ― A moça tentou erguer-se, mas parecia que suas forças desapareceram.

― O doutor Almeida disse para repousar. ― O rapaz segurou em seu ombro.

Confusa, uma sensação de vazio a atingiu, faltava algo, ela pensou de imediato e logo depois um aperto se formou no peito enquanto buscava na memória o que poderia ter acontecido.

― Eu perdi o bebê, não foi? ― Mordeu o lábio, para evitar as lágrimas.


O homem apenas conseguiu acenar, abaixou o olhar por um instante, ele então esperou a mulher desabar em prantos para confortá-la. Entretanto, a esposa não reagiu assim, afundou no colchão, fitando o horizonte sem demonstrar uma emoção. Virando para o canto, Dulce lamentou em silêncio, Christopher deitou na cama ao seu lado, passou os braços ao redor do corpo dela, inconformado pelo ocorrido ser justo agora quando a moça começava a superar seus fantasmas. Vencida pelo cansaço, ela adormeceu após alguns minutos.

***

Christopher observou a esposa deitada no leito, não fazia muito tempo que chegara da delegacia, suspirou cansado, tinha três dias que ela não saía da cama. Sua preocupação com a mulher era evidente, o rapaz percebeu as olheiras roxas em seu rosto, a palidez e até parecia mais magra do que antes, também como seria diferente? Se a moça mal se alimentava, estava muito difícil ajudá-la.

― Já voltei, meu amor. ― Ele esperou por alguma reação. Nada. ― O que você acha de milho cozido para o jantar? ― Nenhuma resposta.

Coçando a testa, o investigador caminhou até o fogão, colocou uma panela de água para ferver, pensando em uma forma de melhorar seu estado. Não demorou muito para uma ideia surgir.

― Sabe, senhorita, acabo de lembrar que a Rosalinda ficou de nos visitar. Por que não a chamamos?

A moça balançou a cabeça em uma negativa.

― Eu poderia mandar uma carta para Santa Fé, convidando-a para passar alguns dias aqui.

― Faz o que você sentir melhor ― ela disse ao se virar para o outro lado da cama.

O homem retornou sua atenção para a panela de milho, tentando concentrar na tarefa, porém não conseguiu direito, estava totalmente frustrado. Assim que terminou de preparar a comida, ele encheu um prato e o levou para Dulce, depositando com cuidado na mesinha ao lado dela. A moça permaneceu imóvel, perdida em suas divagações, o rapaz optou pelo silêncio, então foi para a mesa jantar. Embora não possuísse muita vontade, obrigou-se a comer, pois nesse momento a esposa precisava mais dele do que ele próprio.


Alguns dias depois.

A mulher levantou da cama desanimada, seus pés tocaram a tábua de madeira, percorreu o cômodo parando em frente ao espelho. Constatando sua aparência horrível, as bochechas afinaram, embaixo dos seus olhos havia uma mancha escura, profunda e o cabelo... Céus! Parecia uma palha de feno. Seus pulmões respiraram com dificuldade, uma angústia em seu peito que não passava, fitando sua mão esquerda viu brilhar o anel dourado. Outra vez, a dor a atingiu, decidida a acabar com isso, ela abriu o armário procurando um vestido, escolheu um modelo na cor preta. Antes de sair, resolveu beliscar alguma coisa não por sentir fome, mas porque seu corpo estava fraco.

Dulce não aguentava mais encarar as paredes do quarto, necessitava espairecer, respirar um pouco de ar puro. Caminhando sem rumo pela cidade, abatida, encontrou o lugar perfeito, além de ser afastado era mais calmo do movimento de pessoas. Sentou no gramado curtinho da vegetação verde, encarando o céu azul, amanheceu um dia espetacular, havia apenas algumas nuvens, enquanto o sol brilhava majestosamente. Ao fechar os olhos, a brisa leve acariciou seu rosto, ela buscou entender seus sentimentos, um nó se formou em sua garganta, entretanto não derramou nenhuma lágrima.

Logo que avistou o horizonte de novo, levou um pequeno susto, um cachorro de porte médio a fitava, deduziu ser ainda um filhotinho, visto que andava desengonçado como se estivesse aprendendo ainda. Seus olhos escuros a miravam curiosos, seu pelo era todo marrom, possuía as orelhas compridas e o focinho achatadinho.

― Oi, amiguinho. ― Ele inclinou a cabeça para o lado, respondendo com um latido fino. ― Cadê seu dono? ― A moça observou ao seu redor, procurando um indício de uma pessoa à procura dele, porém não tinha ninguém por perto. ― Você está perdido? ― O animal manteve seu olhar fixo nela, em seguida bocejou.

O cachorrinho então chegou mais perto da mulher, aninhando-se no meio de suas pernas.

― Pelo jeito, o rapazinho não quer me dar bola.

O animal fechou os olhos, aconchegando-se ainda mais nela, Dulce continuou a admirar a paisagem, usando a ocasião para organizar seus pensamentos. De onde estava, podia ver a cidade quase inteira, incluindo o cemitério ao lado da igreja, uma onda de tristeza a invadiu, lembranças surgiram em sua mente, recapitulando todos os acontecimentos até aqui. 

A ideia de que, de alguma forma, o senhor Nogueira havia contribuído para esse momento parecia estranha. Se não fosse pela morte do seu antigo chefe, talvez permaneceria nas sombras, de maneira irônica, o assassinato dele colaborou para que ela descobrisse o amor.

― Eu só não sei se serei capaz de me permitir sentir isso outra vez ― Suas palavras saíram trêmulas. ― É tão difícil poder confiar que depois de tudo o que aconteceu as coisas ficarão bem... ― a moça sussurrou receosa, definitivamente se entregar ao amor era um ato de coragem e no momento não tinha certeza de nada.

***

Christopher abriu a porta de casa, reparando o cômodo escuro, um silêncio e um vazio absoluto.

― Dulce? ― chamando pela esposa, pendurou seu chapéu no cabide.

Segundos depois, comprovou que a mulher não se encontrava, passou uma mão pelos cabelos, caminhando até o armário. Preocupado, ele refletiu quando tinha saído para o trabalho, ela não demonstrou sinais de que estaria disposta hoje, então um pensamento terrível cruzou a mente do rapaz, será que ela havia fugido novamente? Entrou em pânico e resolveu ir embora? Assustado, ele resolveu conferir.

― Seu burro! ― O rapaz bateu com uma mão na testa. ― Por que você não tirou alguns dias de folga? ― Repreendeu-se.

Entretanto, mesmo se quisesse, não poderia tirar uma folga, precisava resolver um caso importante, o Sargento Acácio não daria conta sozinho, além de que ficaria louco sem o serviço. Mesmo vindo para casa de hora em hora, deveria ter enviado uma carta para a Rosalinda antes, condenou-se, mais uma vez, e balançando a cabeça em negação, ele proferiu:

― Ela não faria isso, faria? ― Seus dedos abriram a porta de madeira. ― Não é possível que preferiu desistir da nossa vida aqui ― murmurou. ― Ufa! ― Respirou aliviado assim que percebeu que as roupas da esposa continuavam no armário.

Mas então, onde Dulce estava? Questionou-se preocupado, será que ela foi pedir ajuda para alguém? E se acabou se ferindo no meio do caminho? Agoniado, Christopher andou de um lado para o outro. Enquanto pensava em uma solução, a ansiedade aumentava a cada minuto, sozinho não conseguiria, por isso refletiu que voltaria para a delegacia, mandaria Acácio procurá-la.

― É isso, já está decidido. Vamos buscar em cada canto da cidade ― ele disse determinado se encaminhando para a porta. ― Fica mais fácil com duas pessoas ajudando. 

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Será que a Dul vai reagir gente? Tá bem difícil para ela... O póbi do Ucker todo preocupado 😕ao mesmo tempo que entendo o sofrimento dela, fico com pena do coitado que tá tentando amenizar a situação... Dulce, mulher, às vezes você é fogo!! 

Beeijos amores, vejo vocês no próximo capítulo ;* 

A Dama de Vermelho - Parte 3Onde histórias criam vida. Descubra agora