Ezz
A chuva enegrecida que encharcava sua realidade. A visão se tornara opaca, o corpo amolecido, machucado.. Não via montanhas, não via névoa. Estava com os olhos no chão, sentindo a água gélida entre os dedos, seu reflexo dançando lentamente com cada mínimo movimento... Posso ver-me, mas não posso ver o céu.. Constatou, o cenho franzido. Ergueu os olhos, ainda vermelhos, mesmo já tendo cessado seu choro. Olhava ao redor, e a escuridão parecia esconder segredos inimagináveis, ainda assim, estava assustado demais para pensar em adentrá-la.
Porém, sequer precisou de um movimento para seu destino se movimentar. As estrelas surgiam uma a uma, o céu se abriu num piscar de olhos como se..
Caísse. Rápido. Não soube bem se.. o céu caía, ou ele se aproximava das estrelas? Sua visão estilhaça-se com o embaçar ríspido da paisagem. Sabia que caia, como se caísse de um lugar tão alto que todo o horizonte se tornava estático tal qual uma imagem desenhava nas nuvens. Caísse entre nuvens, sentindo o gelado de seu toque na pele exposta.
Exposta? Ezz soltou um grito de surpresa ao notar que metade de sua roupa se incendiava com uma velocidade aterradora. Gritava, intensamente, de terror e surpresa. Como nunca antes na vida. O chão.. Eu o vejo..! Os olhos se afiaram ao notar a cor se esparramar a sua frente. Verde, cinza, marrom.. Porém, estava rápido demais...!
E tarde demais, conseguira reunir forças no corpo para se preparar para inevitável queda. Galhos e mais galhos, raspando-lhe a pele exposta, o rosto, os olhos pensando se deveriam fechar-se ou abrir-se, preparar-se para o que viria a seguir. A garganta rouca, o desespero se metamorfoseando a medida que notou seu corpo respondendo-lhe, num fiapo de energia, Sim, venha.. venha, eu preciso de você, AGORA!!, um par de asas mostrou-se levemente, transparecendo entre galhos, fechou os olhos, o pequeno circulo, tão fraco como uma chama ao vento, sem conseguir manter a forma por mais de dez segundos, Não..!
As costas se estalando sobre a grama crec..!, o baque entre um grito abafado, não muito depois notou um ferimento em sua perna, onde esquecera estar amarrada a faca que Miklos lhe dera. Felizmente um ferimento superficial demais em comparação com todos os outros. Deslizou a mão na testa, os arranhões doíam como espinhos. Manteve-se com as costas ali, qualquer mínimo movimento lhe doía profundamente em todo seu ser. Não sabia que era possível sentir tanta dor.
Apertava os olhos, os dedos inconscientemente erguendo ao ar, mantinha os olhos fechados enquanto vasculhava, procurava em seu peito, o frio no lugar do quente era uma sensação que lhe preocupava, tentava sugar, tentava reunir aquela força, de dentro pra fora, de fora pra dentro, nada, nada, nada.. nada funcionava. Soltou os braços ao lado do corpo, exausto. Puxava o ar, como se sufocasse, procurava e procurava, e mais bafado sentia-se; como um soco no estomago. Ao menos imaginava que o sentimento deveria ser o mesmo.
__ É um pesadelo.. __ Murmurou. Sentia-se vazio, esgotando como um cálice que derramara o vinho num movimento brusco.
O tempo passava, encarava aquelas nuvens, a espera de algum sinal, uma resposta, assim como suas costas responderem novamente. Ambos se fechando num silêncio mortal. Mortal.. Sim, lembrava-se de sua mãe, seu trono, e toda santificação de seus olhos, como se sempre estivessem a espreita de um segredo que ele jamais saberia. E agora Ezz sentia-se longe, frio e exposto, corporeamente e mentalmente.
Sentia-se miserável, perdido, estranho num campo desconhecido, a mente esgotada, a visão falha, sentia-se... Mortal.
Ergueu-se, as forças retornando as suas pernas, as costas ainda em frangalhos, mas era a única que tinha. Caminhou, notou que não muito longe havia um tio de plantação. Vasculhou com o olhar, era tão vazio e silencioso, que mal ouvia o cantar dos pássaros. A terra fofa e lamacenta lhe soava estranha, andava, curioso com aquela sensação, focado em seus pés, até sentir uma sensação macia tocar seu rosto, algumas roupas chacoalhavam num tipo de corda. Inclinou o rosto curioso. De repente recobrou que estava seminu. Isso vai servir.. Arrancou um manto, amarrando-o desajeitadamente em seu torço magro.
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𝐒𝐮𝐩𝐞𝐫𝐟í𝐜𝐢𝐞 - Coroa de Sangue e Névoa
FantasíaDiriam que esta seria uma história sobre heróis. Mas quem seria o verdadeiro herói? os deuses estão mortos. Ezz carrega a coroa pesada de um caído entre destroços, do outro, Myr entrega a seu povo o desespero de um trono vazio. O mundo está em cha...