A Demência

Epílogo II Distrito

EPÍLOGO | PARTE II

DISTRITO
District 

          Era um porão repleto de suprimentos para meses. Havia milhares de comidas enlatadas, como milho, feijão, ervilhas e frutas, que qualquer um ficaria indeciso sobre qual escolher. Ficamos tão chocados de alegria ao ponto de ficarmos parados em silêncio, como estátuas, olhando para aquele "oásis" por alguns minutos até voltarmos à reação.
          Dentro da casa, ainda existia água encanada que vinha de um poço, o que possibilitou termos um banho quente de chuveiro nos banheiros, algo que há tempos não me lembrava da sensação. Orientei a Alice a cortar um pouco o cabelo, pois isso poderia atrapalhar até mesmo em uma fuga, caso precisássemos fazer em meio a lugares com muitos galhos.
          Através dos quadros nas paredes da casa de aspecto vitoriano do século passado, descobrimos que pertencia a uma família rica, dona de um rancho em Massachusetts. Duraram apenas dois dias até a nossa paz chegar ao fim. Um grupo de homens fortemente armados chegou ao lugar, cercando os arredores da casa.
          A princípio, achei que se tratava de um grupo qualquer tentando sobreviver; porém, através de umas tatuagens estranhas em forma de um coração humano e uma cruz nos rostos deles, pude deduzir que não passavam de mais doentes psicopatas de alguma seita maluca.
          A conversa entre eles me fez quase perder a consciência. O que eles queriam dizer com "Através do coração dos nossos irmãos alcançamos vida contínua?" Eles se diziam ser "O Vínculo", que traria o equilíbrio entre os vivos e os doentes. Aquilo me deixou tão desesperado que, de maneira irracional, falei para a Alice que, caso fôssemos pegos por eles, ela devia pegar a arma com a única munição e atirar na própria cabeça para livrá-la de possíveis sofrimentos.
          Antes mesmo que dessem conta da nossa presença, pegamos a maior quantidade de enlatados e saímos dali sob alguns disparos de tiros vindos deles. Por sorte, conseguimos fugir do local a cavalo, mas fui atingido na perna. Tentei fazer um curativo para parar o sangramento, mas, por algum azar ridículo, o tiro parecia ter atingido alguma artéria.
          Estava perdendo muito sangue e de forma muito rápida. Apaguei várias vezes, caindo do cavalo; aquilo estava deixando a Alice muito assustada. Sabia que tinha pouco tempo de vida. Para amenizar a dor, tomei alguns antibióticos que encontramos na casa, mas não houve diferença conveniente.
          Para acalmar a garota, recomendei que ela continuasse sozinha, me baseando pela rota mais próxima de Washington. Ela se recusou toda vez que falava nisso, e ver as lágrimas no rosto dela só me dava forças para continuar. Foi depois daquela madrugada; o dia estava amanhecendo e expulsando a penumbra azulada dos céus. Avistamos a ponte que levava aos portões do enorme distrito.
          Depois de atravessarmos a ponte, caí mais uma vez do cavalo. Meu rosto estava ficando pálido e aproveitei as últimas forças para preparar a garota. Peguei a caneta que ela costumava usar para fazer aqueles desenhos no fichário e escrevi algo na mão direita dela.
          Refletores acesos sobre nós, vozes exaltadas nos alto-falantes. Acariciei o rosto de Alice; ela não parava de chorar. A visão começou a falhar. Sou o homem mais sortudo do mundo e quer saber? Já estou satisfeito... Ela me chamou de pai.
        
— Entregue tudo a eles na mochila. Vai lá, garota! Mostra pra eles do que você é capaz.
— Não... Não quero te perder!

"Estou chegando, Lisa... Linda... Piter."

(ruídos de passos)

— Tem uma criança aqui!
(rádio comunicador) — "Alguém mais com ela?"
— Um homem! Está morto, senhor!
— "A criança está contaminada?"
— Senhor! Ela apresenta a presença do parasita, mas ainda não se transformou! Permissão para atirar?
— "Pare, soldado! Não faça isso, traga ela pra cá."
— Ela tá mostrando uma das mãos!
— "O que isso quer dizer?"
— Tem alguma mensagem escrita. É uma frase...