4. Entrevista

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15/03/1996, 11:00

Guarulhos

BENTO

Que ressaca do caralho - Me levanto do colchão em que estava deitado, me apoiando pelos cotovelos. Sinto todos os meus músculos tensos e doloridos. O porre de ontem foi dos bons.

Levanto do colchão, dobrando o lençol que tinha usado e vou até a cozinha do Dinho buscar um copo de água. Me assusto ao ver no relógio que são 11:00 da manhã. Em menos de duas horas eu e o resto da banda temos que nos encontrar pro nosso último evento antes das férias.

Beber ontem a noite me fez bem, me senti mais leve, menos pressionado. Mas depois que o álcool sai do corpo, tudo volta. A realidade bate, e em menos de 4 meses o meu filho vai nascer. To solteiro, e apesar de que tocar guitarra seja o que eu mais gosto de fazer, pretendo nem triscar em um violão enquanto estiver de férias. Eu quero descansar, superar essa barra que eu to passando. Depois os Mamonas voltam das férias e vou ter que tocar guitarra todo dia mesmo.


-Bom dia, marmitão - Dinho falou atrás de mim - bora comer alguma coisa reforçada aí pra gente ir encontrar o pessoal

- Bom dia mané. - Respondi - Cê quer comer aqui mesmo ou fora?

-Eu to com preguiça de cozinhar - Dinho falou fechando os olhos - bora na padaria que tá mais fácil e tem bastante opção pra comer.


Na padaria optei por um pão na chapa, uma porção de frutas e um café preto. Já o Dinho quis uma salada de frutas, um pão de queijo e um suco.


-Não vejo a hora de dar essa entrevista e dormir até o fim de abril- Dinho falou devorando sua salada de frutas.

- Eu também cara... to tão cansado, tipo eu amo estar no palco com vocês e tudo mais, mas meu corpo clama por um descanso

-Sim meu, te entendo perfeitamente


Terminamos de comer, voltamos para casa para escovar os dentes, e nos arrumar para irmos encontrar com os outros garotos. Antes de sairmos peço um remédio para dor de cabeça pro Dinho, visto que a ressaca ainda estava dando sinais em meu corpo.


Quebra de tempo

Entrevista


Nossa van chegou com antecedência no hotel Pullman. Assim que fomos liberados, entramos na sala de reuniões do hotel, onde aconteceria a coletiva. Era uma sala comum, havia um pequeno palco para as pessoas da banda, e algumas cadeiras organizadas pelo restante do local para os jornalistas e outros profissionais.

De início, muitos jornalistas faziam perguntas sobre como foi nossa viagem a Portugal, como onde nos hospedamos, como os fãs portugueses nos receberam, como era o local dos shows e qual foi a nossa parte favorita da viagem. Contudo, uma jornalista em especial chamou atenção. Ela tinha aparência mais jovem que os demais e parecia estar mais deslocada que os outros. Tinha os cabelos castanhos lisos presos em um rabo de cavalo e vestia uma roupa casual, porém bem arrumada.

-Meninos, o jornal de Guarulhos gostaria de saber: quais são os planejamentos para depois das férias e se há projetos para o segundo álbum da banda. - a garota perguntou, sua voz era suave, e mantinha seus olhos sobre o caderno, através dos grandes óculos redondos.

- Nossos arquitetos estão cuidando bem do projeto do segundo álbum - Dinho respondeu com a voz forçada que costuma fazer - Brincadeira, acho que a grande cabeça por trás de todos os arranjos das músicas é o japonês italiano aqui, quais são seus planos marmitão?

- Ah, não fala assim que eu fico envergonhado - dei risada - Estamos em processo de composição das novas músicas, mas isso fica pra depois das férias, a gente quer descansar um pouco também - respondi sorrindo

- Entendi garotos. Agora uma pergunta vindo direto dos fãs: durante a turnê, houve dias que vocês executaram mais de três shows. De onde vem toda a energia e fôlego pra conseguir cantar e tocar os instrumentos pulando e girando da forma que vocês fazem.

- Tem que ter condicionamento físico - Samuel respondeu rindo - A energia dos fãs que é transmitida pra gente, já fizemos show doentes, gripados, meio mal das ideias, mas os fãs que trazem a motivação

- A parte de tocar guitarra pulando acho que vem da gente ser cinco moleques que não saíram da quinta série - respondi - mas nos momentos que precisamos fazer essas performances mais exageradas os riffs são mais simples também - a garota anotava tudo com muita rapidez e sorria enquanto olhava para nós. Não pude deixar de reparar que ela parecia ser muito simpática e ter aproximadamente a nossa idade.

- Sobre relacionamentos com familiares e amorosos - outra jornalista, mais velha, perguntou - como foi para a família saber que estariam tocando em outro país? E as namoradas, como mantiveram contato? - senti meus olhos quererem lacrimejar, a garganta formou um nó

- Ah, nós ficamos bastante tempo longe de casa sem contar essa viagem, já estávamos em turnê né,? A saudade foi grande das duas partes, família e nós mesmos - Sérgio respondeu, me dando um tempo para respirar - Mas como eles estavam mais ou menos acostumados com a distância, as ligações telefônicas davam conta de mantê-los atualizados. - ninguém da banda citou a parte das namoradas explicitamente, em respeito a mim, provavelmente. Me calei durante o resto da entrevista, até o nó na garganta passar.


Finalizando a entrevista, os representantes de cada jornal pediram uma foto nossa para que pudessem mandar para a edição dos jornais. Tiramos pelo menos umas cinco. A garota mais jovem arrancava olhares de todos nós da banda, ela chamava atenção pela idade, e parecia estar extremamente focada em fazer um bom trabalho.

Nos despedimos de todos os jornalistas e fomos em direção a nossa van. Chovia muito forte, o que impossibilitou que saíssemos do estacionamento de imediato. A visibilidade estava muito baixa.


- A jornalista bonitinha tá parada na entrada do hotel, coitada - Samuel falou olhando a garota abraçada ao seu caderno de anotações esperando a chuva passar - será que ela tem como ir pra casa? - perguntou

- Está chovendo muito forte - comentei - não sei que horas essa chuva passa

- Aê o Creuzebek, deixa a gente dar uma carona pra jornalista?- Samuel pediu

- Ta interessando nela Samuca? - Dinho perguntou rindo

- Claro que não cara, mas olha essa chuva, a pobre coitada tá ali espremidinha debaixo do toldo sozinha, os outros jornalistas todos foram de carro. - falou olhando a garota

- Ela deve ser estudante, talvez - Júlio falou - vai o Creuzebek, deixa ela vir com a gente, o que pode dar de errado?

- Ela pode conseguir informações pessoais de vocês e espalhar pra algum jornal de fofoca - Rick falou olhando especificamente para mim.

- Mas você vai deixar ela ali? Olha essa chuva! Não para tão cedo - Samuel falou - e é só a gente agir como pessoas normais que ela não tira nenhuma informação da gente.

- Vocês? Normais? Vocês são cinco macacos, isso sim - Rick falou rindo - mas vamos, a van tem bastante espaço. - se deu por vencido e pediu ao motorista que parasse em frente a entrada do hotel. 


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Notas da Autora:

Mais um capítulo, na visão de Bento. No próximo capítulo nossa Marina já vai interagir mais com os meninos, quem sabe não surgem novas amizades? Um flerte? Só amanhã pra saber galera, beijos Kk.


Meu Japa do AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora