21. DAMIEN: Nada, não é?

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Jacob avança sobre mim, mas a mão que alcança minha camisa mal tem forças para se fechar no tecido.

— Nada do que você disser vai me fazer acreditar nesses absurdos, agora me deixa dormir em paz e espera o Charlie lá embaixo.—

Nada, não é?

Jacob, Jacob, acaba de desafiar o cara errado.

Acusa outra vez, fazendo pouco das minhas boas intenções. Está praticamente dopado mas se recusa a ouvir.

O pensamento insidioso rasteja, criando raízes e então se instala.

— Deus, você está vendo, eu tentei. Ei Jacob, isso vai doer mais em você do que em mim.—

Leva menos de meio segundo, a lâmina penetra no peito de Jacob fazendo exatamente o que eu disse.

Ele se transforma.

Sem engasgos, ganidos, respirações ofegantes ou lamúrias, só se transforma.

O único indício de que meu ato o feriu foi o rosto se contraindo pelas frações de segundos que antecederam a mudança.

O lobo enorme faz o colchão da cama afundar, mas ele não rosna, está catatônico.

Será que eu ficaria assim caso os punhais que reuni fossem usados?

Curioso.

— Tá vendo, cara? Agora tenta chamar os outros.—

Os olhos de Jacob seguem abertos, mas vazios, a respiração é mais lenta do que o normal.

Não acho que ele conseguirá falar com a matilha assim, mas não custa aproveitar para fazer o experimento. Será que Jacob está vendo ou ouvindo?

— Sim, sim... tenho certeza que foi daí que veio a balela do fraqueza a prata.—

Confirmo minhas suspeitas.

O deus pagão não é venerado aqui, e faria um estrago daqueles se pegasse humanos usando seus rituais para isso, mas caçadores são bem malucos e têm uma expectativa de vida pequena.

Usam essa coisa para conseguir pele de transmorfos, funciona muito bem com transmorfos de lobos, mas varia de espécie para espécie e caçadores desse tipo gostam de se especializar em caçar criaturas específicas.

Os transmorfos de raposa, urso e tigre, por exemplo, estão praticamente extintos. 

Mais um sinal de que o apocalipse está vindo, rápido e implacável. 

Caçadores de vampiros são raros, tão raros que os próprios filhos da noite fazem pouco caso de sua existência. Os poucos que conheci são magos insanos, humanos sem poderes não tem chance.

A senhora no andar de baixo não é uma, mas com certeza é insana igual a eles, ou não escolheria um ofício tão desgraçado.

Há um grito de frustração vindo da cozinha, então imagino que ela descobriu o roubo.

Minha mão treme ao fazer um corte no meu próprio pulso, o sangue começa a fluir.

Abaixo o suficiente para nivelar o corte com o focinho de Jacob transformado, mas espero a outra agarrar o cabo do punhal para aproximar o corte da língua do lobo.

Arranco a arma ao mesmo tempo que o forço a beber.

— Você vai ficar bem mais rápido assim. Beba.—

Os sons de passos nas escadas aumentam.

Retirar o punhal o destroça.

Dessa vez há um ganido, e então um grito.

Um presente para RosalieOnde histórias criam vida. Descubra agora