Os demônios que habitam em mim

Cap VI

Estávamos aconchegados em uma das poltronas da sala, eu com meu corpo de jujubas e o anjo me contando a historinha do mundo.
_Você deve saber antes de tudo que esses príncipes do inferno, são basicamente seus tios.
_Tios? Uau!
_Todos no céu somos irmãos, e Lúcifer e os outros também eram meus irmãos, assim como são entre si.
_Quer dizer que eu tenho uma família grande?
_É, tem dois irmãos além de Nathaniel se isso conta?
_Como é que é? Isso é possível?
_Lembra da criação? As primeiras pessoas?
_Sim, Adão e Eva, depois veio a maçã...
_Não exatamente, respondeu me interrompendo
_Como assim? Perguntei curioso
_Eva não foi a primeira mulher de Adão, a primeira mulher se chama Lilith e foi feita da mesma forma que Adão foi feito.
_Caramba, por essa eu não esperava...
_Sendo feita da mesma forma que Adão, Lilith se recusava corresponder ao seu companheiro e então Deus a expulsou para o inferno onde Lúcifer se encontrava
_Perai, tá me dizendo que Lúcifer e Lilith tiveram filhos juntos? Perguntei pasmo
_Sim, dois para ser exato.
_Então ela sendo humana, eles são nefilins?
_Não, antes de Deus a expulsar condenou a ser como os outros demônios.
_Ok, e Lúcifer caiu mesmo porque queria ser como Deus?
_Não especificadamente, ele caiu porque Deus fez o homem e pediu para que nós os anjos amassem a eles mais do que a ele próprio.
_Deixa eu adivinhar, Lúcifer não concordou?
_Não só isso, ele se mostrou uma ameaça para o bem estar dos humanos, então Deus mandou seu favorito para os confins da Terra para passar a eternidade.
_E os príncipes são os seguidores de Lúcifer?
_Sim, irmãos que o seguiram até o fim. São conhecidos pelos humanos como os sete pecados capitais, incluindo o Lúcifer é claro.
_Então aquela garota é um deles?
_Exato, e pelo que pode se notar ela sabe quem vocês são e virá na sua busca.
_Mas por que?
_Seu poder, eles estão atrás disso. Acreditam que quem o tiver terá o poder para aniquilar qualquer coisa existente
_E isso é possível? Questionei tentando entender tudo aquilo que caiu de paraquedas no meu colo
_Infelizmente você tem o poder para acabar com o universo se assim quisesse
_Meu poder é maior que de Deus?
_Não sei dizer, mas se não é maior ele se equivale.
_E o que eu faço? Eu não sei usar, muito menos controlar e eu não sei para o que devo lutar. Eu fui jogado nessa Terra e esquecido por todos lá em cima e ameaçado se usasse algum poder.
_A liderança no céu, quando nasceu, estava perturbada. Deus havia sumido quando viu ainda dentro do ventre de sua mãe, e tivemos que tomar as rédeas do mundo inteiro.
_Deus tirou férias? Tipo disse estou indo para as Maldivas não me incomodem?
_Não exatamente, ele sumiu e não temos como acha-lo.
_E a guerra que se aproxima? Ele simplesmente vai assistir e não vai fazer nada? Eu não sei se quero ajudar vocês!
_Nós precisamos, os humanos precisam! Suplicou e lembrei nesse momento dos rostos de Josh e de Sofia sorrindo para mim
_Qual é o plano? Perguntei convencido
_Daqui treze dias, eu retorno e resolveremos isso!
_Ta bem, treze dias! Respirei um pouco aliviado vendo sumir misteriosamente diante de meus olhos
Esses dias foram sufocantes, não fui necessário na escola, devido ao fato de estar cuidando de meu irmão. Mas foram dias realmente sofridos. No primeiro dia, Nathaniel encarou bem ficar um tempo preso. No segundo apresentou sinais de agitação mas nada alarmante. O terceiro estava conversando sozinho, enquanto sacudia seu corpo para frente e para trás, evitei contato.
O quarto dia olhava para a porta, tentava ver pelas frestas, andava de um lado para o outro.
O quinto dia batia na porta desesperado, chutava os móveis e gritava freneticamente, eu estaria em apuros se o anjo não tivesse colocado uma barreira anti ruídos. No sexto dia ele estava jogado no chão encolhido como se tivesse sido chutado várias vezes seguidas.
No sétimo dia, seus olhos eram vazios e estava sentado na cama, não dormia, só resmungava palavras incompreendidas. No oitavo dia ele tentou rasgar sua própria pele, com as unhas e às vezes no desespero mordia seu corpo onde alcançava.
Jamais imaginei o ver assim.
No nono dia, ele estava calmo e sua respiração era tão leve que dava para ouvir o movimento lá fora. E depois de três dias naquele dia, olhou para a janela e sorriu, não era mais rude e nem grotesco. No décimo dia levantou-se e foi ao banheiro, lá demorou horas e horas, quase cogitei invadir aquele quarto, porém ele saiu de banho tomado se apresentando mais decentemente. No décimo primeiro dia arrumou tudo o que havia arremessado pelos cantos e no final sentou e meditou por quase uma hora, se eu não o conhecesse diria que era um monge.
No penúltimo dia, se aproximou da porta e tentou conversar comigo e contou como estava revigorado e pelo seu tom de voz eu sabia que era verdade. Sabia que era aquele menino que um dia me foi entregue para cuidar, tão agitado, mas tão pequeno.
No último dia, ao abrir a porta fui surpreendido com um abraço apertado do mesmo.
_Caramba, eu acho que o demônio ainda está aí!
_Não seja idiota! Resmungou
_Prontos? Perguntou Remiel se apresentando
_Que rápido! Exclamou
_Não disse, eles poderiam fazer teles, brinquei sarcasticamente e Nathaniel concordou balançando sua cabeça em afirmação
_Vamos, falou nos teleportando em menos de um piscar de olhos
_Caramba, isso parece uma central da CIA, falei olhando cada quadro de comando
_Esperava o que ?
_Sei lá, nuvens fofinhas em toda parte e umas arpas. Ah e ópera, tipo muita ópera!
_Desculpe desapontar, brincou se aconchegando em uma das cadeiras
_Isso é enorme, falou Nathaniel tentando achar o fim da sala
_É, ela dá para o gasto. Bom, essa é Muriel! Disse apontando para sua colega que virou sua cadeira para nos encarar
_Bem vindos! Respondeu cordialmente _Como foi sua reabilitação? Perguntou a mesma olhando de cima a baixo para o loiro
_Bom, não sei ele, mas eu achei que estava em um daqueles filmes de zumbis que os humanos gostam tanto.
_Tão ruim assim?
_Se considerar o fato que seu colega deu um atestado alegado que meu irmão tinha ébola, talvez.
_Oi? Perguntou surpresa e voltou para encarar seu colega não acreditando no que havia ouvido
_Eu confesso nos primeiros dias até que era engraçado, principalmente se eu abria a porta para sair. Caiam nos seus próprios pés, mas depois ficou deserto demais cogitei que talvez eu não tivesse mais vizinho algum.
_Hahahaha, caramba Remiel você não existe! Comentou sua parceira de equipe gargalhando
_Funcionou, não funcionou?
_Eu diria até demais!
_Bom, o que importa que funcionou! Muriel, faça um check-up em Nathaniel e aproveite para checar seu condicionamento físico.
_Ok, vem por aqui! Falou levando para uma outra sala
_E eu? Perguntei curioso
_Vamos ter que começar seu preparo imediatamente!
_Cara, eu pesquisei Ébola não é brincadeira não. Respondeu Nathaniel voltando, seguido por Muriel que trazia os resultados
_É, afinal só havíamos nós e gramados enormes onde os vizinhos não botavam o pé para fora para cortar...
_Eu não posso voltar para a escola, vão me chamar de Chernobyl
_Pffft, hahaha, gargalhei e Muriel também riu apesar de tentar se manter discreta
_Cala a boca! Retrucou
_O horário da escola, não condiz com o horário que estarão treinando.
_Obrigado!! Falou comemorando mais animado _Espera, o treinamento me inclui, não é?
_Claro, afinal todo anjo é bem vindo
_Então a guerra vai mesmo acontecer?
_Já está acontecendo, e precisamos desempatar essa luta. Anunciou Remiel olhando para algo além de nossos olhos, nossa alma, nossa graça