Capítulo 1: Recomeço
E lá vou eu deixar tudo isso para trás.
Enquanto tiro minhas malas do táxi, uma onda de incerteza me invade. O que eu realmente quero? Largar tudo e recomeçar em uma cidade desconhecida ou apenas tentar continuar na familiaridade da minha antiga vida? Talvez eu esteja sendo imatura, ou quem sabe, tenha amadurecido demais para lidar com essa decisão.
A verdade é que fiquei cega por tanto tempo que já não consigo me entender. A pior parte da exaustão psicológica é essa: a sensação de não se reconhecer mais, de não conseguir decifrar os próprios sentimentos e pensamentos. Sinto como se estivesse presa em um labirinto, sem saber qual caminho seguir.
A viagem até o aeroporto passou tão depressa que não consegui nem me arrepender da minha decisão. Será que vou mesmo para outra cidade? Vou me afastar de todos sem um "até breve"? A ideia de um adeus à moda antiga me faz falta. Eu queria uma ligação, ou, quem sabe, uma daquelas cenas clichês dos filmes, onde ele corre pelo aeroporto em minha direção, a expressão de desespero estampada no rosto, demonstrando o quanto eu significo para ele.
Dou uma risada sem graça, e o som ecoa em meu peito. O voo é tranquilo, quase monótono, e eu passei a maior parte do tempo dormindo. Quando finalmente olho pela janela, a cidade já se foi, e eu perdi a chance de admirar sua beleza do alto.
Meus ouvidos estão tapados, como se um pano estivesse cobrindo minha mente. Sinto que meu corpo não descansa há meses. Quando chego à sala de desembarque, meus olhos percorrem a esteira, em busca das minhas malas. A luta para focar nisso é exaustiva. Mil pensamentos fervilham na minha mente, mas, no fundo, a ficha cai: estou realmente deixando tudo para trás agora.
Meu recomeço começa agora!
Chamo um carro de aplicativo e, enquanto espero, não posso deixar de pensar nas possibilidades que teria se tivesse permanecido onde estava. Porém, ao olhar ao redor, a cidade me surpreende. É tudo tão bonito e chamativo, com uma energia vibrante que parece prometer novas oportunidades.
O carro para, e eu olho ao meu redor, absorvendo cada detalhe. A cidade é simplesmente impecável. As casas têm muros baixos, o que permite ver um pouco da vida de cada um que ali reside. Os comércios são distantes uns dos outros, conferindo um ar de tranquilidade à cena. O motorista dirige rapidamente, e eu me sinto satisfeita com o tráfego daqui. Percorremos 20 km em 17 minutos. Na minha cidade, isso levaria uns 40, ou até mais, dependendo do dia.
À medida que o carro avança, meu coração acelera. É o que eu quero? Essa nova vida, esse novo começo? O cheiro da cidade, a agitação nas ruas, tudo parece um convite irresistível. E, mesmo com as incertezas, uma parte de mim começa a acreditar que talvez, apenas talvez, essa mudança seja exatamente o que eu precisava.
— Olá, você é a Hanna? — a voz feminina me fez parar.
Olhei pela fresta do porta-malas enquanto retirava minha bagagem. A mulher tinha um sorriso largo, era magra e usava um terninho verde, parecendo uma corretora saída de um filme.
— Olá, sou sim! — respondi, tentando esconder minha ansiedade.
— Prazer, Hanna! Eu sou a Sara, e vou apresentar o apartamento.
Enquanto subíamos, Sara falava animadamente sobre a localização. A princípio, suas palavras pareciam um ruído de fundo.
— É bem localizado, tem vários mercadinhos nas redondezas, e é uma área bem segura. Não é gigante, mas você vai gostar bastante.
Quando chegamos ao nono andar, me deparo com um corredor antigo e cheios de portas, uma porta com uma fita amarela e preta me chama atenção mas continuo seguindo Sara, ela para na próxima porta e a abre revelando uma sala grande com um estilo industrial. O espaço era arejado, com um móvel baixo que compunha o sofá e um tapete preto que contrastava com as paredes de tijolos expostos. Não era exatamente o meu estilo, mas havia algo acolhedor ali. No canto, uma prateleira vazia aguardava ser preenchida.
— Esse é o quarto! — disse Sara, gesticulando.
— Uau, ele é bem grande! — exclamei, caminhando até a janela. As cortinas de seda branca dançavam suavemente. Ao abrir a janela, fui recebida por uma vista decepcionante.
— É, a vista daqui não é das melhores. Mas você vai se surpreender! — Sara disse, como se estivesse desesperada para que aquilo não atrapalhasse seu trabalho.
Não é das melhores? Eu estava de cara com outro apartamento, sem nenhuma paisagem para admirar.
— O mais importante é que você não terá vizinhos de parede por um bom tempo, então não vai ser incomodada! — ela fala isso na tentativa de parecer um benefício delicioso, mas algo em sua voz me faz perceber que é preocupante — Deixei uma cestinha com algumas guloseimas, seja bem-vinda! E qualquer dúvida, me ligue — disse, entregando-me as chaves e saindo apressada.
O apartamento já estava mobiliado, mas claro que eu precisaria de algumas coisas. A ideia de não ter vizinhos de parede me agrada, mas ao mesmo tempo me faz pensar no porquê da preocupação entrelaçada na voz de Sara, o que me lembra da fita amarela na porta ao lado. "Oque será que houve ali? " Meus pensamentos começam a imaginar um milhão de cenários, no entanto, estava tão cansada que decidi tomar um banho e descansar. Era meu primeiro banho na nova casa, na nova vida! Demorei mais do que o normal, aproveitando a água morna que parecia derreter a tensão acumulada.
Depois, encostei no sofá, ainda com o cabelo molhado, e fechei os olhos por um momento... até que o som da campainha cortou o silêncio.
— Não acredito que eu dormi! Que horas são? — exclamei, pulando do sofá.
a insistente campainha ressoou novamente.
— Meu Deus, JÁ VOOOU! — gritei, correndo para a porta.
Quando abri, Marta literalmente pulou em cima de mim, me fazendo cair no chão.
— Sua maluca, sai de cima de mim! — brinquei, rindo e tentando me recuperar.
— Amigaaa! Você combinou de me avisar quando chegasse! Liguei um milhão de vezes, estava preocupada! — ela disse, com uma expressão de alívio.
Olhei para o celular e vi que tinha 12 ligações perdidas.
— Desculpe, eu acabei cochilando — respondi, ainda meio desnorteada.
— Então vamos lá, se arruma que vou te levar para conhecer alguns lugares — Marta insistiu, com a energia que sempre a caracterizou.
— Naaão — falei, tentando manter a calma, mas minha cara dizia o contrário.
Ela me olhou com uma mistura de determinação e preocupação, seus punhos cerrados em um gesto que sempre me fazia rir. Marta sempre foi mandona e, apesar de seus modos, sempre pensou nos outros primeiro. Sabia que eu precisava disso.
— A você vai sim! Você tem apenas três dias para aproveitar, conhecer e descansar. Quando começar a trabalhar, você não conseguirá fazer nada durante um bom tempo. Vamos, por favor! — ela fez um biquinho, juntando as mãos no queixo.
Era impossível resistir àquela expressão de "cachorro sem dono". Eu dei de ombros, rendendo-me.
— Está bem, Ma, vou me arrumar. Espera aí!
Enquanto me apressava para me preparar, não pude deixar de sentir uma mistura de ansiedade e empolgação. Essa nova cidade, essa nova vida, e agora a minha melhor amiga ao meu lado. Talvez, apenas talvez, eu estivesse realmente pronta para recomeçar.

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O Inferno de Hanna
RomanceHanna se muda para uma nova cidade em busca de paz e para esquecer os traumas do passado. No entanto, sua vida toma um rumo inesperado quando ela se vê presa em um triângulo amoroso com dois homens enigmáticos: Dante, o misterioso bartender que a fa...