"Alina"
Acordei, pulando da minha cama com o susto de mais um dos meus pesadelos, o sol ainda não tocava o meu rosto pelas frestas da escotilha de meu quarto, e nem mesmo o balançar do navio despertava-me o enjoo que sentia nos primeiros dias. Acostumar-se ao ritmo puxado de uma tripulação não era fácil, principalmente se tratando de uma jovem mulher de 19 anos. A essa altura, se fosse uma dama qualquer já estaria casada, prometida ao primeiro membro de uma família rica ou minimamente importante numa cidade próxima, ou de vai saber o local onde nasci. Se essa era a vida que os deuses reservavam para mim, então estou disposta a pagar o preço necessário.
Me chamo Alina, filha de um pai que não lembro o rosto e de uma mãe que a única lembrança é de uma caminhada num belo jardim de dálias, mas a qual só me recordo do perfume, a aparência das flores e dos cabelos ruivos da minha mãe a qual deve ser a única coisa que acabei herdando que realmente é característico, afinal, não é comum ver uma garota ruiva na sociedade e muito menos uma mulher num navio tripulado por apenas homens.
Dou um longo suspiro após repousar uma vez mais na cama do meu quarto, este que dava o meu máximo para manter organizado e limpo, diferente do restante do navio que tinha um cheiro digamos que cruel ao nariz, afinal, mesmo vendo diariamente os tripulantes fazendo e desfazendo os nós das velas, limpando o chão com esfregões que deviam ser mais velhos do que eu, parecia que o odor daquele lugar seria sempre o mesmo.
Após alguns minutos quieta no meu canto, resolvo por fim levantar-me. Assim que me sento na minha cama, que, por sinal, era mais dura que uma pedra, mas disfarçava com o único lençol que roubei de um varal na última cidade que atracamos, olho rumo ao provável único espelho em todo o navio, quebrado e quase se dividindo em dois por tantas rachaduras, olhei-me. Puxei a fita que estava num caixote abaixo da minha cama, junto dela, minhas vestes.
Tinha de ser rápida para me trocar, afinal, o trabalho ali começava cedo e para mim mais cedo ainda, já que todo cuidado é pouco para a única dama em um navio repleto de definitivamente "não cavalheiros". Devidamente arrumada, calças vestidas, botas muito bem amarradas com mais de um nó, afinal não poderia parar para amarrar de novo tão cedo, o casaco colocado junto do couro muito bem entrelaçado do meu corselete de couro. Meus cabelos, tomei uns poucos minutos já que o sol ainda estava por nascer para penteá-los e prender, não eram muito longos, mas o bastante para um rabo de cavalo.
Arrumada e pronta, deveria não me importar muito com essas coisas de aparência, afinal, evitar os olhares no lugar onde estou talvez fosse a melhor das escolhas, mas um pouco de vaidade é inevitável, principalmente pela certeza de que nenhum deles se atreveriam a fazer nada, talvez por conta do capitão que me conseguiu um lugar aqui.
De qualquer forma, deixei a minha cabine, apenas com os pensamentos a respeito daquele sonho constante que sempre me vinha à mente, um pesadelo no qual nem eu mesma conseguia vencer ou controlar, tudo o que podia fazer era acordar, coçar os olhos, respirar fundo e seguir para mais um amanhecer.
Rapidamente caminhando no interior do navio, pronta para mais um dia e cheia de energia, enquanto muitos dos homens ainda dormiam e até mesmo os que já estavam despertos pareciam embebedados pelo abraço acolhedor de Morfeu.
— Hora de acordar! — Gritei aos meus dois únicos colegas que não me olhavam torto desde o dia que cheguei ali. Me apoiando sob os "pés" de suas redes penduradas na estrutura logo abaixo do convés, as balançando para cima e para baixo irritantemente.
— Que droga Alina! Para ou eu vou... — Dizia Markus, que não pode completar a sua fala já que seus lábios estavam ocupados beijando o chão sujo o qual caiu.
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A Coroa do Mar
FantasyToda Dinastia tem um início, mas tudo aquilo que começa em algum momento deve chegar ao fim. Num mundo onde a política entre Reinos, Impérios e Nações Livres se ameaçam constantemente, manter o equilíbrio e a paz se torna cada vez mais um desafio, p...